Veja dicas para vencer a insegurança e a solidão na liderança

Legenda: Segundo a Harvard Business Review, 50% dos CEOs entrevistados se sentem isolados em seus cargos, ocasionando efeitos negativos no desempenho de aproximadamente 61% deles
Foto: Shutterstock

Você se sente solitário (a) no exercício da liderança? Você não está sozinho (a). Vários(as) profissionais têm o mesmo sentimento e, por vezes, duvidam de si mesmos (as)! As perguntas mais frequentes são: vou conseguir dar conta dos desafios? Tenho competência para tomar as decisões necessárias? Embora pareça ser um ônus muito pesado para carregar, quando bem administrado, pode trazer aprendizados importantes para o amadurecimento profissional. Vamos refletir?

Gostaria de iniciar este post falando de solidão. Por que líderes denominam o seu sentimento desta forma? Quando nos sentimos sozinhos (as), temos a sensação de que não temos com quem contar, de que estamos vivendo uma espécie de isolamento. Mas será que o mesmo sentimento se aplica a cargos de gestão?

Veja também

Pensamentos, tais como: “Não posso compartilhar algumas decisões estratégicas com ninguém!”, “Não tenho com quem desabafar quando estou desmotivado(a) ou inseguro(a)!”, “Evito falar sobre a empresa quando estou em casa!”, “Sinto-me pressionado(a) quando preciso tomar decisões com as quais não estava habituado(a).”

“Sinto-me desconfortável quando preciso demitir alguém, principalmente quando tenho um relacionamento mais próximo.”, rondam a mente do(a) líder quase que diariamente. E então, como lidar com os diversos momentos de solidão que envolvem esta posição?

Poucos(as) gestores(as) estão preparados(as) para lidar com seus erros, insucessos e vulnerabilidades. Costumo brincar nos programas executivos de liderança, perguntando quem gosta de ser líder. Quando muitos afirmam que sim, retruco dizendo que eles(as) são malucos(as)! Pois esta posição traz consigo muitas coisas boas, mas, também, muitas responsabilidades. Quanto mais alto o cargo, maior a sensação de isolamento. Será que é este o único caminho?

Isolar-se não é o caminho e tampouco a resposta para que a liderança seja exercida com mais leveza. Claro que, para alcançar o equilíbrio, o(a) líder deve estar convicto(a) de que algumas situações serão inevitáveis. Tomar uma decisão impopular; lidar com a imaturidade ou insegurança dos liderados; demitir alguém que é querido pela equipe; negar alguma concessão, enfim, atitudes que tiram o(a) líder da zona de conforto.

Os bônus de chegarmos ao topo é maravilhoso! Poder, influência, status, reuniões estratégicas, privilégios! Mas o que acontece quando chegamos, poucos sabem e discutem abertamente. Por esse motivo, criei o quadro Bastidores da Liderança no DN, projeto o qual patenteei para publicar um livro em 2024. Muitos desafios e dilemas ficam nos bastidores, por trás do palco onde tudo acontece.

O que as pesquisam apontam?

Harvard Business Review publicou uma pesquisa que mostra que 50% dos CEOs entrevistados se sentem isolados em seus cargos, ocasionando efeitos negativos no desempenho de aproximadamente 61% deles. Entre os que alcançaram a liderança pela primeira vez, a solidão corporativa chega próximo a 70%.

A pesquisa "Panorama de Sentimento das Lideranças”, realizada nos meses de setembro e outubro de 2022 pela escola corporativa Sputnik, com 285 gestores, mostra o impacto das várias incertezas que vivemos, impulsionadas pela pandemia, no comportamento dos(as) gestores(as). O resultado mostra que 34,4% dos(as) líderes estão inseguros(as) para conduzir, desenvolver e engajar os times.

Quando questionados(as) sobre o que mais gera insegurança na hora de tomar uma decisão, 48,1% apontaram a falta de clareza estratégica; 22,5% o cenário econômico complexo; e 11,6% o despreparo do time. Apenas 4,9% dos(as) entrevistados(as) não se sentem inseguros. Mais de 34% ainda acham nebuloso pensar sobre formas para desenvolver e engajar os times.

Como lidar com a insegurança e a solidão?

O(a) líder tem novas demandas, e estas, mais do que nunca, impactam na vida pessoal, no clima organizacional e no alcance de resultados. Distanciar-se da equipe definitivamente não é a solução, mas é estratégico definir com racionalidade os momentos em que a solidão e a insegurança, na medida certa, se fazem necessárias.

Para que isso seja possível, a Inteligência Emocional entra em cena. É importante que o(a) líder saiba gerenciar e lidar com os próprios sentimentos de forma mais empática e compassiva. Erros podem acontecer; decidir sozinho(a) será necessário em casos específicos; ficar inseguro(a) pode trazer cautela; e sentir-se vulnerável é totalmente humano.

Veja dicas para lidar com a insegurança e a solidão:

1. Reconheça com racionalidade o cenário no qual você está inserido

Quando o(a) líder se conecta com a realidade organizacional, consegue compreender porque deve fazer o que precisa fazer. Entender os porquês faz toda a diferença. Com esse entendimento, fica mais fácil analisar o cenário da equipe e avaliar quais serão os impactos de qualquer mudança, solicitação ou tomada de decisão. Por fim, pense sobre o que você fez e faz no exercício da liderança, como é reconhecido(a) pelos liderados(as), qual o clima e o nível de engajamento.

Estabeleça critérios para as suas tomadas de decisão diárias e deixe claro para a equipe o seu modelo de gestão.

2. Atue com equilíbrio entre o papel de líder e o papel de gestor

Não existe liderança sem gestão, muito menos, gestão sem liderança. É importante desenvolver o equilíbrio e entender as dimensões dos dois papéis. O papel de líder toma decisões considerando as pessoas, cria convergência de propósitos, gera conflitos, engaja o time, ensina e desenvolve. O papel de gestor toma decisões considerando o negócio; planeja, organiza metas e recursos; acompanha indicadores; e fornece feedbacks corretivos. Ambos formam um líder-gestor de sucesso.

3. Eleja os momentos e as informações que não devem ser compartilhadas e que, portanto, demandam um momento de solidão

O dia a dia corporativo é muito dinâmico, portanto, é importante ter clareza sobre quais informações podem ser compartilhadas e quais devem ser mantidas em sigilo e os porquês. Alguns líderes erram quando compartilham informações estratégicas com aquele(a) liderado(a) de que é mais próximo. Lembre-se: esse liderado(a) tem algum colega muito próximo!

4. Fortaleça a sua inteligência emocional

Gosto da teoria de Daniel Golleman, atualizada em 2015, que apresenta quatro eixos da inteligência emocional: autoconsciência, autocontrole, empatia e habilidade social. Trazer este conceito para o exercício da liderança faz todo o sentido. O(a) líder que possui inteligência emocional é capaz de lidar com situações mais estressantes e conflituosas, além de avaliar fatos e dados com imparcialidade.

Para fortalecer a IE, conheça os seus limites; expresse sua vulnerabilidade sem medo; tenha humildade e empatia; e invista em atividades tais como yoga, meditação etc.

5. Saiba comunicar

Crie um ambiente seguro, mantenha uma comunicação transparente e estimule troca de experiências e proposição de ideias. Comunique o que está acontecendo na empresa e mostre-se disponível para esclarecer qualquer dúvida dos(as) liderados(as), mas tenha cuidado com o que e como você vai comunicar. Ao fornecer um feedback, esteja aberto(a) a receber um; encoraje a sua equipe ao reconhecer os pequenos triunfos; explique os porquês das demandas e adote, quando possível, um discurso otimista e motivador.

O Dilema de Bernadeta

Bernadeta, 49 anos, Gerente de Operações de um Grupo Atacadista, trabalha na empresa há 30 anos. Entrou como estagiária, depois analista, coordenadora e, por fim,

assumiu a gestão, cargo que ocupa há 19 anos. Amada por todos, é reconhecida por ser empática ao lidar com as situações e por seu senso de justiça.

A empresa passou por muitas mudanças durante o cenário pandêmico e isso demandou algumas tomadas de decisão impopulares. Demissões, reestruturação de áreas, implantação de novos processos, enfim, Bernadeta viu-se obrigada a sair completamente da sua zona de conforto. Como mecanismo de defesa, distanciou-se da equipe para que tivesse forças para implantar as mudanças almejadas pela organização, sem se deixar levar pela emoção e pelos relacionamentos que construiu ao longo de todo esse tempo. Seu comportamento em casa mudou. Ficou irritada, inquieta, com insônia e evitava falar sobre o assunto com o marido.

Conheci Bernadeta em 2021. Ela me procurou por indicação de uma amiga que tinha concluído um processo de coaching executivo. Ao entrar na sala, trouxe toda a sua tensão e ansiedade na fala de abertura:

- Delania, sei que você sabe que o exercício da liderança é solitário e, para completar, sou mulher. Lido com uma equipe predominantemente masculina e estou passando por um momento muito desafiador. Não sei se dou conta! Na verdade, estou perdida.

Ouvi atentamente as lamentações de Bernadeta e depois do seu desabafo perguntei:

D - O que realmente preocupa você? Você tem 19 anos de experiência no cargo que ocupa, é respeitada e tem a confiança do seu Diretor. Tem algo que não captei ainda?

Ela parou, refletiu e ficou em silêncio por alguns minutos...

B - Tenho medo de falhar! De não dar conta e principalmente de decepcionar os meus liderados.

D – Fale um pouco mais sobre isso...

B - Delania, sempre fui muito próxima da minha equipe. Conheço a vida de cada um deles. Tenho que demitir algumas pessoas que não estão alinhadas com o momento atual. Sempre atendi às demandas da equipe ou pelo menos via uma maneira de equalizar as coisas. Agora não tem jeito! Tenho que agir e me sinto muito mal. Inclusive, eu me isolei um pouco, não compartilhei o meu sentimento com ninguém! Não quero demonstrar insegurança...

D – Você tem consciência de que sua decisão é justa? De que as mudanças precisam ser implementadas?

B – Tenho. Concordo plenamente. Sei que é necessário, entendo que as pessoas foram escolhidas com base em critérios coerentes. Mas não consigo ficar melhor!

D – Bem Bernadeta, sei que você já tem consciência do que está acontecendo. Você se isolou porque não quis expor a sua vulnerabilidade e está sofrendo, porque não sabe “dizer não”. Além disso, mantém uma relação muito próxima com os liderados e tem medo de perder a admiração deles. Você precisa mudar a estratégia. Deve confiar em tudo o que foi construído ao longo dos anos e se comunicar com transparência e preocupação empática. Deixar claro para a equipe que a empresa está passando por um momento de transição e que todos precisam dar o melhor que puderem nesse momento. Se eles perguntarem sobre demissões, você deve esclarecer que isso pode acontecer, inclusive com você mesma. E que o momento não é adequado para suposições, e sim para que todos se unam e continuem dando o seu melhor. Esclareça, ainda, que qualquer tomada de decisão será conduzida por você.

Se ainda se sentir insegura, converse com outros líderes que você conhece fora da empresa e que passaram pelos desafios que você está enfrentando. Você se surpreenderá. Muitos já sentiram o que você está sentindo. Além disso, reflita sobre tudo o que você já fez pela equipe e sobre todos os desafios já vencidos. Isso a fortalecerá!

Bernadeta fez o processo de mentoria e, juntas, definimos estratégias para esse momento de transição. Ao longo da jornada, ela se fortaleceu e entendeu que, mesmo nas decisões impopulares, podemos descobrir caminhos que amenizem os traumas nas partes envolvidas.

Lembre-se: a insegurança na medida certa tem um papel importante na tomada de decisões estratégicas; a solidão pode ser necessária pontualmente, no tocante ao sigilo de informações privilegiadas. O exagero da insegurança paralisa e o isolamento radical prejudica o engajamento da equipe.

Nesta coluna, trarei para você assuntos relacionados a carreira, liderança, coaching e tendências sobre os assuntos. Contribua deixando sua pergunta ou sugerindo um tema de sua preferência, comentando este post ou enviando mensagem para o meu Instagram: @delaniasantoscoach.

Será maravilhoso ter você comigo nesta jornada. Até a próxima!

*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora.



Assuntos Relacionados