Tchau, São Paulo? Tchau, Fortaleza?

Uma pesquisa com os habitantes de São Paulo apontou que mais de 60% sairia da cidade se assim pudesse

Legenda: Pensemos o caso de Fortaleza e abordemos hipotéticos habitantes a responder a, também hipotética, pesquisa nos mesmos moldes da feita em São Paulo.
Foto: Arquivo Diário do Nordeste

As aglomerações citadinas provocam reações das mais diversas nos indivíduos. Para alguns, as cidades representam o lugar das oportunidades, de ascensão social, centro das modernidades, das atividades culturais e das práticas de lazer. Na sensação de outros, o vai e vem na urbe é caótico, confuso e estressante; um verdadeiro inferno na superfície terrestre.

Captando esse turbilhão de sentimentos, uma pesquisa com os habitantes de São Paulo apontou que mais de 60% sairia da cidade se assim pudesse. Os insatisfeitos, segundo a Rede Nossa São Paulo, reclamam da violência, da criminalidade, do trânsito e da desigualdade social.

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No outro extremo, os satisfeitos, algo próximo a 36% dos entrevistados, listaram as oportunidades, o mercado de trabalho e o lazer como principais razões para suas percepções positivas.

Não tive acesso ao perfil dos entrevistados, isso poderia explicar melhor o resultado divulgado. Mas aqui podemos desenvolver um exercício de suposição. Para tanto, pensemos o caso de Fortaleza e abordemos hipotéticos habitantes a responder a, também hipotética, pesquisa nos mesmos moldes da feita em São Paulo.

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Foto: Arquivo Diário do Nordeste/José Leomar

Nosso primeiro entrevistado gostaria de se mudar de Fortaleza. Ele justifica sua resposta: está muito insatisfeito com a cidade; teme pelos furtos e roubos, frequentemente, noticiados nos telejornais. Da mesma forma, não está contente com a poluição urbana, o lixo nas ruas, e prefere morar numa residência com jardim, pois se sente sufocado no apartamento de 100 metros quadrados. Com a pandemia, decidiu-se: em 2022 comprará uma casa num destes condomínios de alto padrão nas bordas da região metropolitana, em Eusébio, provavelmente.

Nossa segunda entrevistada tem opinião diferente. Mesmo morando em bairro popular repleto de problemas, entre eles a irregularidade no abastecimento d’água e a ação de facções criminosas, se orgulha de ter construído sua casa na cidade. Ela afirma ter muita satisfação das conquistas alcançadas desde que chegou à capital. Se pudesse, até mudaria de bairro, mas jamais se mudaria de Fortaleza.

Legenda: A história de vida e as condições socioeconômicas dos entrevistados influenciam diretamente na avaliação que fazem da cidade.
Foto: Arquivo Diário do Nordeste

O terceiro respondente afirma ter orgulho de morar em Fortaleza. Apesar de sua residência localizar-se a 12 quilômetros da praia de Iracema, o jovem lembra com alegria do entretenimento no Centro Cultural Dragão do Mar e na Praia dos Crush. Ao final ele não deixa de reclamar: “até que o transporte público poderia melhorar ou poderiam construir lugares de lazer para a juventude perto de onde moro”.

A história de vida e as condições socioeconômicas dos entrevistados influenciam diretamente na avaliação que fazem da cidade. Simultaneamente, a experiência cotidiana molda nossas sensações de apego ou repulsa aos lugares, às cidades ou às situações urbanas. É por isso que nos deparamos com respostas tão contrastantes.

O que é sonho inalcançável para uns, é já realidade paradisíaca para outros – especialmente se você mora em condomínios próximos à praia.

No caso de Fortaleza, a cidade permanece mais atrativa do que repulsiva. Se tomarmos como indicadores os preços dos aluguéis e dos imóveis nos bairros bem servidos de infraestrutura da cidade de Fortaleza, percebemos constante acréscimo nos valores, o que significa mais e mais interessados em morar nestas zonas urbanas. Apesar de todos os problemas, nos bairros habitados pelas classes trabalhadoras, década após década, se constata maiores índices de densidade demográfica e não esvaziamento populacional. Essas áreas da cidade, por seus problemas urbanos históricos, acabam mais acessíveis à moradia popular.

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Foto: Gustavo Pellizzon

Lógico que há movimentos centrífugos, como os condomínios residenciais de baixa densidade nas franjas da região metropolitana. No entanto, longe de representar a fuga da cidade, possibilita a dilatação da mancha urbana e a exportação do padrão de vida citadino. Talvez esse seja o processo revelado pela pesquisa paulistana: a busca por espaços metropolitanos menos densos, mas manutenção da atratividade da cidade polo, semelhante ao registrado em Fortaleza e na região metropolitana.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.