Esses dias parei para ler um livro que há muito me interessava. Ele se chama Cidade Caminhável, publicado originalmente em 2012 como Walkable City, de autoria do urbanista Jeff Speck. Nele o autor faz grande esforço, a partir dos exemplos das cidades do Norte Global, para propor ações a fim de difundir o princípio da caminhabilidade.
Speck é especialista em projetos de reestruturação de áreas centrais, espaço onde aplica seus conceitos. Quanto mais proveitosa, segura, confortável e interessante for a caminhada, melhor será a vida urbana em pequenas, médias e grandes cidades, assegura Jeff Speck.
O autor deixa claro que a tarefa é difícil, pois há muitos empecilhos, dentre eles o reinado do automóvel e a expansão suburbana. São marcas das cidades modernas construídas ou ampliadas no transcorrer da segunda metade do século XX, sempre baseadas em muitos interesses corporativos (o consumo de massas) e do mercado imobiliário.
Ao invés de lugares aprazíveis, calçadas largas e frentes convidativas, tem-se, ao longo das vias e ao redor dos edifícios, mais e mais estacionamentos para veículos. Produzir mudança de mentalidade social capaz de reduzir a utilização do automóvel, pelo menos no Brasil, me parece uma tarefa hercúlea. O próprio Jeff enfatiza: não há caminhabilidade sem rede e modais de transporte coletivo eficientes.
Por uma dessas ironias do destino, a expansão suburbana é problemática, mesmo, em muitos casos, aplicando parcialmente os princípios da caminhabilidade. Refiro-me especialmente aos projetos de condomínios que atraem as famílias ao prometer uma vida totalmente diferente daquela em cidades sujas, inseguras e engarrafadas.
Onde está a contradição? A caminhabilidade se realiza de fato, conforme Speck, quando permite a ligação de espaços públicos (a calçada, por exemplo) e a abertura da cidade à heterogeneidade de usos e usuários, e não, trancafiá-los entre muros apartados da “cidade real”.
Diante da imensidão das metrópoles brasileiras, percebo a viabilidade da caminhabilidade se constituída a partir de núcleos conectados em rede. Nesse caso, cada bairro apresentaria um subcentro organizado e orientado à caminhabilidade convergindo para um espaço público principal (um parque, uma praça, um calçadão, inclusive com árvores) rodeadas por edifícios multiusos, fachadas vivas e calçadas estruturadas.
Os subnúcleos, em hipótese alguma, seriam isolados, pois haveria uma mobilidade com utilização de modais de transporte público. Tal configuração garantiria o acesso de todos os cidadãos aos diferentes subnúcleos e ampliaria o reconhecimento da cidade enquanto totalidade, ao contrário das comunidades fechadas e segregadas.
Em Fortaleza, as ciclofaixas, os corredores de ônibus, os miniterminais descentralizados, as areninhas, as zonas de trânsito seguro e a reforma de calçadas-vias em ruas comerciais são práticas elogiáveis e vão na direção certa. Lógico que mudanças na cidade devem ser debatidas, com decisões tomadas escutando a sociedade em sua diversidade.
No entanto, para alcançarmos a condição de cidade caminhável, é interessante, que essas boas intervenções sejam incluídas num projeto geral de cidade, baseado no princípio da conexão espacial e desta forma permitir a integração entre as áreas reestruturadas, estabelecendo uma constelação de lugares caminháveis. Como última opinião, sugiro priorizar para as intervenções, os bairros onde os indicadores sociais são os mais baixos.