Editorial: Pandemia e energia

Grave consequência da pandemia do novo coronavírus sobre o setor energético tem preocupado o Governo Federal: a queda do consumo de energia elétrica, que atinge diretamente as empresas distribuidoras, cujo caixa entrou no vermelho. Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), sobra energia, e a redução do consumo, que já chegou aos 18%, poderá ser ampliada caso se alonguem ainda mais as interdições ao funcionamento de empresas de todos os tipos. Os prejuízos das companhias distribuidoras são tão elevados, que o Ministério de Minas e Energia e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) calculam em R$ 17 bilhões o tamanho do pacote de socorro que lhes será concedido.

Quando eclodiu a pandemia, a Aneel adotou - por instrução do Ministério da Economia - uma providência emergencial e razoável: proibiu por 90 dias o corte de energia das residências para evitar uma consequência social ainda maior para as famílias já mantidas em isolamento. Mas notou-se um efeito colateral: a inadimplência aumentou - e esta já estava pelo recente acréscimo de dificuldades financeiras da população.

A reabertura da atividade da indústria, do comércio e do serviço será gradual - os economistas preveem que isso se dará em até dois anos, não menos. Cerca de 60% da energia gerada no Brasil são de fonte hidráulica. Neste momento, para sorte do setor, as barragens que movimentam as usinas hidrelétricas estão cheias, o que descarta a possibilidade de um aumento das tarifas de energia. Mas isto não afasta a certeza de que a injeção de R$ 17 bilhões - que sairão do Tesouro Nacional - no caixa das distribuidoras será cobrada, a partir ainda deste ano, dos consumidores pessoas físicas e jurídicas. A conta de luz ficará mais cara por conta da pandemia.

Teme-se que, diante das dificuldades acima relatadas, sejam reduzidos os investimentos que se fazem hoje na geração de energia de fontes renováveis - como a solar e a eólica, concentrada nos estados da região Nordeste, onde são robustos e estáveis os bancos de vento e a insolação. Como demorará a retomada da economia, o consumo de energia também levará pelo menos um ano - nos cálculos dos consultores - para alcançar os níveis do fim de 2019. Desenha-se agora um cenário complicado para todo o setor elétrico nacional. O governo imagina que, passada esta crise, por volta do terceiro trimestre deste ano, poderá atrair o interesse dos investidores para o projeto de privatização da Eletrobras e de algumas de suas empresas, como a Chesf. Mas isto também parece difícil, diante dos desencontros políticos do Governo e com o Congresso Nacional, onde as ideias privatistas enfrentam forte resistência.

Neste instante, além das crises sanitária, econômica, financeira e política, o Brasil convive com mais uma - a do excesso de oferta de energia elétrica. Isto gera um déficit que cresce como bola de neve e que, mais cedo ou mais tarde, cairá em forma de cobrança no colo de cada um dos brasileiros. Em 2001, por causa diferente - a falta de energia - conta semelhante foi cobrada do Governo e de cada cidadão.


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