Dia das Mães e a noite em que o rapaz do interior vai embora

A minha história no seu dia, mãe, é sempre a mesma, repetida como a cantiga dos grilos da infância — eles cantam no juízo a vida toda. É a mesma história de milhares de rapazes e moças do interior que partiram logo cedo para ganhar a vida nas capitais, uma história universal que está nas ilusões perdidas de um donzelo de Balzac ou na esperança retirante e provisória de Belchior ou Torquato Neto.

“Mamãe, mamãe, não chore, a vida é isso mesmo, eu vou embora”. A voz de Gal Costa reverberou na rodoviária de Juazeiro do Norte e logo se fundiu com a gemedeira do motor ônibus Princesa do Agreste — linha noturna Crato/Recife.

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E quem disse que mãe derramou uma só lágrima! Aquela secura me deixou mais perdido que um menino chamado Édipo lá na Grécia das antigas. Somente depois de velho, dona Maria do Socorro me deu alta da terapia e abaixou o volume dos grilos na cabeça. “Se eu choro, você poderia esmorecer e não seguir viagem”, disse. “Bem sei como são frouxos os machos dessa família. Mas só Deus sabe o Orós que segurei para não deixar sangrar naquela hora”.

Gal cantava o piauiense Torquato no serviço de alto-falante da partida. “Mamãe, mamãe, não chore/Pegue uns panos pra lavar/Leia um romance/ Veja as contas do mercado...”. E este cearense do Cariri segue no exílio frio de São Paulo reciclando as mesmas dores de rodoviária.

Com a mesmíssima história das moças e dos rapazes que foram embora. Nós que tanto choramos por carta ou naquela Discagem Direta à Distância, o DDD barato depois das oito da noite de um domingo. Até os orelhões de aço derretiam sob o impacto dos amores nada líquidos.

Um mantra materno, em especial, encerrava as correspondências e os telefonemas: “Saudade não bota panela no fogo”. P.S.: “Saudade não cozinha feijão, coragem, filho, coragem”.

É sempre a mesma história comum, faço questão de repetir, com novos fiapos de memória. Vale a velha crônica sobre o dia em que esses rapazes e moças seguiram viagem. Você lembra da sua partida? Conte-nos, com ou sem lágrimas.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.



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