Bolsonaro entre Zé das Medalhas e o Príncipe Ribamar da Beira-Fresca

Legenda: Bolsonaro em evento militar pelo Dia do Aviador e da Força Aérea Brasileira
Foto: PR

Os militares costumam apreciar uma comenda, mas dessa vez o capitão reformado do Exército, cuja vida nos quartéis foi manchada por indisciplinas, exagerou na condecoração para enfeitar o paletó presidencial. Apesar de negar a ciência e ser indiciado pela CPI da Covid por crime contra a humanidade, Bolsonaro concedeu a si próprio o título de grão-mestre da Ordem Nacional do Mérito Científico. O decreto é irrevogável, está no Diário Oficial e tudo. Quem achar ruim que reclame com o bispo.

A bizarrice me lembrou inicialmente o Zé das Medalhas, personagem do ator Armando Bógus na novela “Roque Santeiro”, clássico do baiano Dias Gomes nos anos 1980. Esquece. Besteira minha. O comerciante de amuletos e apetrechos religiosos usava os badulaques para exaltar o “mito” da cidade de Asa Branca. Jamais caiu na tentação de uma homenagem a si mesmo, justiça seja feita.

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Nem mesmo o Príncipe Ribamar da Beira Fresca, figura folclórica do Cariri, com os seus capotes em trapos repletos de condecorações imaginárias, ousou com alguma autopromoção do quilate desta bizarrice bolsonarista. Com a sua “cavalaria marítima”, o príncipe que reinou no centro de Juazeiro até a morte, em 1987, era incapaz de prejudicar um só vivente na terra do padre Cícero. Só animava a cidade com as suas histórias de batalhas épicas e reinos encantados. Tem mais: gostava de trabalhar e foi um marceneiro de primeira.

“Jamais largava a sua pasta, onde guardava os seus projetos mais urgentes, sempre em benefício do bem comum. Nas grandes secas, imaginou navios trazendo mantimentos, vindos pelo leito alargado do rio Jaguaribe”, lembrou Rosemberg Cariry, cineasta e escritor, em uma crônica em homenagem ao príncipe. “Sonhou com escolas reais para as crianças pobres e com abrigos para todos os velhos do Reino, que, além de gordas pensões, teriam a distribuição farta de pão e de cajuína. Sonhou com moinhos de ventos e combateu dragões imaginários”.

Como percebemos neste relato, é até uma heresia comparar sabença da figura real de Juazeiro com certos patriotas do comando da nação. Até a próxima.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.