Quebra contratual no Crato abre precedente perigoso para economia do Ceará

PPP de saneamento básico, assinada após leilão na B3, corre risco de ser desfeita unilateralmente pela Prefeitura do Município

Escrito por
Victor Ximenes producaodiario@svm.com.br
Foto: Divulgação

A decisão da Prefeitura do Crato, no interior do Ceará, de alterar unilateralmente o escopo do contrato de concessão do saneamento básico da cidade pode representar um sério risco à segurança jurídica e à atração de investimentos futuros no Estado.

A medida, que retira da concessionária privada Ambiental Crato a gestão comercial do serviço e a transfere para a estatal municipal SAAEC, configura rompimento contratual e abre um precedente preocupante para futuras parcerias público-privadas no setor e na economia cearense em linhas gerais.

O contrato original, assinado em 2022 após leilão realizado na B3, foi estruturado dentro do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) do Governo Federal, com o apoio técnico e financeiro da Caixa Econômica Federal, no âmbito do Marco do Saneamento.

Desde então, a concessionária, pertencente ao grupo Aegea, já investiu mais de R$ 40 milhões, ampliando a cobertura da rede de esgoto de 3% para 25%, em apenas dois anos.

Segundo a Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon/Sindcon), um eventual rompimento pode comprometer as metas de saneamento traçadas para a cidade.

Outra preocupação é a credibilidade do Estado junto ao setor privado. A segurança jurídica e o respeito a contratos representam premissas basilares para investidores, seja em leilões, PPPs ou outros formatos.

A previsibilidade regulatória é um dos pilares fundamentais para garantir investimentos de longo prazo.

Reclamações

A alegação da Prefeitura baseia-se em reclamações de consumidores sobre supostas taxas abusivas sendo cobradas. Quanto a isso, é crucial que os órgãos de defesa do consumidor estejam vigilantes.

No entanto, convém, nesse caso, o seguinte comparativo. Nem mesmo no auge da crise energética com a Enel Ceará, durante a qual a sociedade cearense se viu sistematicamente prejudicada, o Estado decidiu por romper o contrato de concessão. Apostou no diálogo, na cobrança por melhorias e na construção de soluções práticas com a concessionária de energia, que agora sinaliza investimentos bilionários para melhorar a qualidade de seus serviços.

No caso do Crato, o caminho da interlocução também deveria ser perseguido.

O que é o Marco do Saneamento

Aprovado em 2020, o Novo Marco Legal do Saneamento busca universalizar o acesso à água potável e tratamento de esgoto no Brasil até 2033. Entre as principais diretrizes, está a exigência de metas concretas de cobertura, a ampliação da participação da iniciativa privada e o fortalecimento da regulação do setor. O modelo prevê a concessão de serviços por meio de licitação, garantindo que investimentos sejam realizados para melhorar a infraestrutura e atender à população de forma eficiente.

O caso do Crato é um alerta sobre os desafios da implementação do Novo Marco do Saneamento. Se medidas como essa se repetirem, os avanços conquistados nos últimos anos podem ser colocados em risco, prejudicando tanto a população quanto a atratividade do setor para novos investimentos.

 

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