O voo cego e os segredos do clássico

Legenda: Ceará e Fortaleza farão o 1º Clássico-Rei do ano no sábado pela Copa do Nordeste
Foto: KID JUNIOR

Quando eu estava aprendendo a pilotar aviões, o meu instrutor, Guilardo Nunes, pouco antes da decolagem, disse: “Tenho um presente para você”. Pensei que ele me daria o presente no final do voo. Quando coloquei o avião pouco antes do ponto de espera, ele desenrolou um papel bem grande e o colocou na frente do painel da aeronave. Aí ordenou que eu decolasse e pousasse sem ver os instrumentos. Eu estava bem treinado. Fiz o procedimento assim mesmo, tudo no sentimento. Ao terminar, o Guilardo explicou: “Isso aqui é para, se um dia houver pane elétrica, você ter confiança e sem problemas realizar o voo”. Anos depois, aconteceu uma pane elétrica. Não me assustei. Fiz o que era para fazer. Deu certo. Agora o Ceará mandou fechar tudo. Não permite imagens dos treinos nem entrevistas, nada. Os cronistas ficaram sem material para ver. Um papel no painel de Porangabuçu. Aí me lembrei do meu instrutor Guilardo. Ora, amigos, dá para fazer a cobertura com base na experiência e nos sentimentos. Tudo o que foi visto antes fica gravado na mente dos setoristas. Então, mãos à obra. 

 

Escondido 

 

Na Copa de 1990, na Itália, fui para o treino da Seleção Brasileira em Asti, antes do jogo decisivo com a Argentina. O técnico Sebastião Lazaroni mandou fechar tudo. Fez um treino secreto. Ninguém teve acesso. Segredo total. Absoluto. À noite, quando eu estava no hotel já em Turim, um cinegrafista italiano, do alto de um edifício próximo, tinha filmado tudo. E mostrou detalhes na televisão.   

 

Posição 

 

Sempre fui contra os exageros. Admito certos cuidados para não passar ao time adversário alternativas que possam dificultar a execução de um modelo tático. Tudo bem. Mas a ideia do hermeticamente fechado não vinga, máxime nos tempos de hoje onde há um celular filmando em cada canto. Às vezes há celulares escondidos, amarrados atrás dos gols. 

 

A linha férrea 

 

No Ceará mesmo, em 1993, o treinador Mário Juliatto também proibiu a cobertura de um treino do Ceará. Vetou todo tipo. Mas esqueceu que, na época, havia uma passarela sobre os trilhos do trem que ali passava, exatamente onde hoje passa o metrô. Um cinegrafista, do alto dessa passarela, usando uma haste bem grande na qual anexara a câmera, documentou tudo. 

 

Resultado 

 

Não acredito muito nestas proibições. Respeito os treinadores que adotam a rigidez do fechamento, mas considero isso uma bobagem. Cada um tem seu ponto de vista. Penso assim: se todos que adotassem tal tipo de mistério ou segredo ganhassem o jogo, bastaria contratar meu instrutor de voo, Guilardo Nunes, para treinar a equipe...