Papo bom é papo besta
Não tem coisa melhor do que sair com amigas e começar um papo bem besta, daqueles que salta o imaginário, traz leveza e faz dar altas gargalhadas da besteira besta
Éramos um grupo de cinco mulheres quando, uma delas, solta o tema para ser desenvolvido:
- Amigo, já está tudo combinado contigo, né? A partir de agora, qualquer foto que você tirar minha, vá ajeitando aí: colocando um filtro bacana, ajustando o ângulo para ficar mais magra, essas coisas que mulher gosta. Quero que, quando eu morrer, você chegue junto à minha família com as melhores fotos para o meu livreto da minha missa de 7º dia. Avisou a Amiga 1 ao fotógrafo que, concentrado, guardava o material, após um evento onde estávamos.
Impressionado, ele grita de lá:
- Como é a história? Não! Você me pediu para ter o cuidado de fazer boas fotos suas. Ver como estava o cenário atrás, te deixar magra, tirar a papada, olhar os braços, isso aí. Mas esse negócio de serem fotos da missa de 7º dia, não! Arre égua!
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Pronto! Ou melhor, ponto parágrafo, porque o tópico do desenvolvimento começou, junto com o barulho das risadas do grupo.
A Amiga 1 continuou:
- Gente, quando eu morrer, já deixei avisado para minha família: quero que façam um penteado alto no meu cabelo, porque não tenho pescoço. Fazendo o coque que eu gosto, quando me deitarem no caixão, ficarei alongada. Outra coisa: flores nos meus ouvidos nem pensar! Para que tampar os ouvidos com flores? Os meus não! A minha cabeça tem que ficar soltinha! Sem flores ao redor. É podre decorar o defunto contornando a cabeça!
O tom das risadas aumentou, acompanhados com o ritmo das palmas.
Nessa hora, eu fiquei imaginando a cena toda. Já tinha reparado, mas nunca tinha parado para comentar os detalhes de um falecido no caixão.
Aí, sabe como é, né? Uma besteira puxa outra...
A Amiga 2 se empolgou e disse:
- Eu não vou passar por isso. Já disse lá em casa que quero ser cremada!
Imediatamente, olhei para ela e pensei como podia já ter pensado aquilo, se é bem mais nova que eu. Valha-me, Deus! Povo para organizar as coisas com antecedência. Eu só penso em organizar a vida, mas a morte...
- E tem mais - continuou a Amiga 2 – quero que minhas cinzas sejam jogadas na cidade que eu mais amo: Miami.
Nesse momento, interveio a Amiga 3:
- Não sei se vai dar certo, não, viu? Outro dia, uma tia, que mora em outro Estado, morreu, foi cremada lá e quiseram trazer as cinzas pra cá. Foi uma burocracia tão grande para deslocar só de um Estado para o outro que desistiram de realizar o último desejo dela.
Na hora, a Amiga 2 olhou para mim e perguntou:
- Como é isso no Direito?
Respondi “na lata”:
- Minha filha, eu não tenho conhecimento e nem estudei Direito Funerário. Porém, podemos ver, de agora em diante, como faremos para tratar desse assunto com um profissional competente para te atender, porque, se queres a minha sugestão, deixaria desse “bucho” para os vivos.
Continuou a Amiga 2:
- Eu gosto de ti, porque tu tens resposta pra tudo. Pois, tá resolvido. Quero ser cremada. Vou deixar o povo lá de casa resolver isso mesmo e manterei meu desejo: quero que joguem minhas cinzas em Miami.
A outra amiga, agora chamada de 3, que ouvia a história, disse:
- Menina, mas não vai dar certo isso, não! Se já é difícil transportar as cinzas de um Estado para o outro, quando mais, de uma América para a outra!
Já viram aí que o avanço da conversa só aumentava o nível da besteira.
Foi quando a Amiga 4 entra na conversa para incrementar mais a condição absurda das ideias, a fim de encontrar a solução para a família da Amiga 2:
- Que é que tem? Ouvi falar – nessa hora, levantei minha sobrancelha, porque esse negócio de "ouvi falar" é de quando a pessoa não tem certeza – que teve uma pessoa que quando morreu teve essa “merminha” burocracia. Depois de cremada, cada filho queria um pouquinho da mãe, só que um filho morava longe e, para ficar com a parte da mãe, resolveram colocar as cinzas dentro de um depósito de maquiagem. A mãe viajou para o outro lado do mundo como um pó compacto e o problema foi resolvido!
Fiquei horrorizada de como a história ficou “cabeluda”. Eu ria que chorava.
- Como é? A mãe virou pó compacto? Tudo bem que “somos pó e ao pó voltaremos”, mas virar pó compacto, eu nunca tinha imaginado - falei e disse!
A Amiga 2, que não perde a piada, mandou ver:
- Imagine um pó compacto feito da minha composição. Só pode ser dos bons! - falou a menos humilde das criaturas que Deus colocou na terra.
É claro que, nessa hora, todas estavam eufóricas, morrendo de rir, cada uma com as sugestões mais inacreditáveis do que a outra, sob muitas vaias nordestinas. E eu, só rindo e captando essa conversa inacreditável para contar aqui para vocês lerem nesse domingo.
O fato é que não tem nada melhor que tirar um tempinho da nossa vida corrida para conversar com amigas coisas divertidas, mesmo que sejam bestas, que nos façam rir com alma.
É claro que, hoje, não poderia deixar de dizer que, mesmo que um dia vire pó compacto, quero que, antes de tudo, deixar aqui declarado neste jornal com grande acesso de leitores, que aos vivos designados para a difícil tarefa de cuidarem das burocracias imediatas do meu pós-morte, vejam se é possível doar, de coração, todos os meus órgãos que forem úteis para quem estiver precisando para sobreviver e resgatar a vida de quem precisa cumprir mais a sua missão!
E, que, também, quem estiver vivo, aproveite para separar seu tempo com seus amigos e amigas para ter um papo desses bem besta e rir bem muito, porque dividir sorrisos é sorrir dobrado e isso, faz um bem danado!
Experimenta!
Dominguemos, amém!