Síndrome de final de ano – o que podemos fazer?

Por se tratar de um mês mais curto, no qual muitas atividades cessam no dia 24, a sobrecarga de trabalho pode ser um fator estressor

Foto: Pressfoto/Freepik

O início do mês de dezembro anuncia as festividades de Natal e Reveillon. Entretanto, o clima de celebração não é unanimidade. Para muitos, o final de ano, com todas as suas confraternizações, é sinônimo de mal-estar. Cada vez mais, portanto, os meios de comunicação abordam a “Síndrome de final de ano”.

Esta nomenclatura, que tem se popularizado, não constitui um diagnóstico em saúde mental. Ao falarmos de “síndrome”, nos remetemos a um conglomerado de características, sinais ou sintomas (não necessariamente patológicos) que se apresentam conjuntamente. Não é o caso, portanto, do que popularmente vem sendo nomeado de “Síndrome de Final de Ano”.

Contudo, é inegável que, com a proximidade do fim de ano, constatam-se sintomas vinculados ao aumento dos níveis de estresse, o que foi identificado em uma pesquisa realizada pela ISMA-Brasil (International Stress Management Association – Brasil), na qual, das 678 pessoas entrevistadas, 75% relataram um aumento do nível de estresse durante as festividades, com maior irritabilidade, ansiedade, tensão, sensação de sobrecarga e até mesmo dificuldades para dormir.

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A melancolia, a tristeza, o saudosismo, assim como um forte sentimento de frustração, também podem estar presentes para muitas pessoas no período do final do ano. Esses sintomas podem, de fato, agravar quadros prévios de ansiedade e depressão. Entretanto, vale ressaltar novamente: isoladamente, se presentes somente neste período, estes sintomas não necessariamente configuram em si uma patologia.

Infelizmente, é comum vermos até mesmo profissionais de saúde mental falarem em entrevistas sobre a “síndrome de final de ano” como um sinônimo de Transtorno Afetivo Sazonal, ao qual nos referimos para designar um padrão no surgimento de certos quadros, como episódios depressivos, que, costumeiramente, se apresentam em determinadas estações do ano, comumente no inverno. No hemisfério norte, onde as datas festivas coincidem com o período de inverno, é comum um aumento dos quadros depressivos.

Contudo, esta é uma realidade bastante diferente para nós do hemisfério sul, que estamos em pleno verão durante as festividades de final de ano. No entanto, muitos não passam imunes a este período, que carrega consigo diversos fatores contextuais e ambientais que podem contribuir para o aumento do estresse e mal-estar, por exemplo: para muitas pessoas, é possível que o trabalho seja intensificado antes do início do recesso.

Por se tratar de um mês mais curto, no qual muitas atividades cessam no dia 24, a sobrecarga de trabalho pode ser um fator estressor. Já os pais de crianças, costumeiramente, passam por uma dose de estresse a mais: suas rotinas no trabalho continuam a mesma, mas os filhos estão de férias, demandam muito. Outras pessoas, que já possuem costumeiramente uma rotina bastante atarefada, precisam abrir espaço, sabe-se lá como, para participar das mais diversas confraternizações.

O brasileiro, de um modo geral, vive com as contas apertadas, o dinheiro não costuma sobrar no final do mês, mas os gastos extras no final do ano falam alto: a coação de dar presentes, de comprar roupas novas para as festividades, a preparação de uma ceia caprichada, enfim, os gastos podem se tornar muito maiores do que o previsto.

O reencontro com parentes nem sempre agradáveis também pode contribuir para o aumento de mal-estar e tensão no seio familiar. E um denominador comum a quase todos nós é uma certa pressão para estarmos felizes e gratos pelo ano que passou, quando, muitos de nós, na verdade, estamos frustrados ao olhar em retrospectiva para o ano.

Apesar do fôlego e esperança de muitos para traçarem metas para o ano que chega, a maioria de nós constata que a maior parte de nossas metas para o ano, que terminou, não foram cumpridas. Infelizmente, as pessoas parecem não saber que não há nada de vergonhoso em não cumprir todas as nossas promessas para o ano novo.

Até já conversamos nesta coluna sobre o hiato entre o que planejamos fazer e o que, efetivamente, damos conta de realizar, falamos sobre a “acrasia”, estudada desde os filósofos na Grécia Antiga, uma palavra que aponta para quando, mesmo sabendo o que é melhor para nós, ainda assim, fazemos escolhas não tão benéficas.

Mesmo querendo emagrecer, escolhemos comer aqueles docinhos; mesmo querendo ser mais saudáveis, muitos persistem no cigarrinho; mesmo sabendo que iremos nos arrepender, procrastinamos com frequência.

É válido lembrar que somos constantes em nossas personalidades, mas não em nossos desejos, não em nossas ações. A racionalidade não nos habita tanto como gostaríamos.

Agimos, por vezes, sem pensar, de modo inconsciente, reagimos às circunstâncias, aos contextos. No papel cabe tudo; na vida real, não. As contingências nos mobilizam muito mais do que podemos imaginar e saber disso pode diminuir o gosto amargo que o final de ano tem para alguns.

Tentar dar conta de tudo, talvez, seja o maior fator estressor no final de ano. Honestamente? Realizar o trabalho de forma perfeita, suprir todas as necessidades dos filhos de férias, dar presentes maravilhosos a todos, cozinhar algo extraordinário, estar arrumado, com roupa nova e sorrindo para parentes inconvenientes, fingindo estamos totalmente satisfeitos com o ano que passou, esperançosos com o ano que virá, me parece

muito para meros seres humanos. Uma boa dose de realismo - desistindo de alguns propósitos - talvez, seja o melhor ato de autocuidado neste fim de ano.

*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora

 
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