O rebolado de Anitta entre aplausos e vaias

A cantora que chegou ao topo das paradas de sucesso, conquista agora carreira internacional mesmo sendo criticada por parte do público brasileiro

Legenda: Anitta conquistou o "Top 1 Global" com o reggaeton “Envolver”
Foto: Divulgação

Desde o último mês, os olhares do mundo fonográfico se voltaram novamente para a cantora Anitta. Antes mesmo de desafiar o Tribunal Superior Eleitoral no Festival Lollapalooza, a artista pop chegou no pico de sua carreira com o reggaeton “Envolver”, conquistando o “Top 1 Global” em uma famosa plataforma de streaming. Na sexta-feira (25) seu hit alcançou a marca histórica de 6,39 milhões de reproduções. 

Como a fluminense de Honório Gurgel nunca se livra de polêmicas, a coreografia da música também disponibilizada em vídeo clipe está dando o que falar. Mesmo viralizando nas redes sociais, a dança aguçou também um conservadorismo ilógico que parece ter tomado o Brasil nos últimos tempos. 

Fã de Bossa-Nova, eu preferiria vir neste texto relembrar que a “Garota de Ipanema” segue sendo uma das canções mais tocadas e regravadas no mundo, antes mesmo de Anitta nascer. Mas diante de tanto preconceito com a cantora, aproveito este espaço para, de certa forma, defendê-la.

Quem viveu a década de 1990 pode lembrar de uma cena nada atípica: um grupo de crianças enfileiradas dançando o sucesso do “É o Tchan”. Os pais assistiam vaidosos à meninada requebrando ao som cuja letra falava que tudo que é perfeito “Mete em cima, mete em baixo” e “depois de nove meses você ver o resultado”. E não para por aí…

A banda baiana estourou no Brasil e atravessou gerações. Tinha também um tal do “Pega no Bumbum” ou o “Pau que nasce torto nunca se endireita”, além de outras coreografias nada puritanas ou convencionais. Ainda havia uma das mais famosas, a ousada “Boquinha da Garrafa”. 

Essas atrações eram transmitidas ao vivo na televisão, no início das tardes de domingo e apreciadas pela tradicional família brasileira. Falando em programação, não podemos esquecer dos entretenimentos televisivos que eram recordistas de audiência. Quem não se lembra da "Banheira do Gugu" ou das "Chacretes" que acompanhavam o Velho Guerreiro? Rita Cadillac, a mais conhecida, virou uma das "Donas do Rebolado".

Por falar de dança, jamais esqueceremos de um dos maiores sucessos da década de 1980, a inesquecível Gretchen. Ex- melindrosa, foi para o topo das paradas com “Conga, Conga, Conga” e se tornou a “Rainha do Bumbum”. Seu jeito espontâneo e sensual balançado conquistou o Brasil.

Nada de (auto)censura

Nosso país sempre foi contraditório. No auge da Ditadura Militar (1964-1985) a bilheteria do cinema nacional deu espaço para as famosas “pornochancadas” que, mesmo sendo censuradas por várias vezes, passaram com certa aprovação diante do público. Nos folhetins, cenas de sexo e as mulheres nuas eram costumeiras e grande atrativo.

Existem sim pontos que podem ser criticados quanto o lançamento de Anitta, dentre eles acreditar que a nudez e a sexualização das artistas mulheres são sinônimos de empoderamento. Muito pelo contrário, eles falham no momento que induzem isso ao público e os promovem como “feminismo”, deturpando os ideias que já são tão massacrados por ignorantes neste país (mesmo em pleno século XXI).

É preocupante pensar até que ponto essa confusão entre poder e o erotismo pode causar no público. Isso sim, deveria ser questionado sem segregação ou escolha, inclusive trazendo a verdadeira discussão à tona que é a sexualização da mulher como um produto e consumo, agora a argumentar que algo é imoral não justifica crítica.

Assim caminhamos nesse limiar, onde o impróprio é escolhido a dedo. Nunca pensei em escrever um dia sobre a Anitta, tão pouco ir em sua defesa, mas indigna assistir tantos lhe jogando críticas sem olhar para o próprio nariz e renegando quem vibrou no passado.

Várias ressalvas eu poderia fazer sobre os caminhos que a ex-funkeira percorreu, mas é impossível não admitir que ela possui uma boa voz, um jogo de marketing sensacional e sabe se colocar como produto fonográfico a ser consumido por inúmeros fãs que só aumentam. Em poucos anos, saiu dos bailes do morro para as paradas de sucesso no mundo.

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É necessário frisar que a artista se joga em uma carreira internacional dentro do estereótipo de cantora “latina” e não propriamente “brasileira”, algo que foi uma fórmula de vários astros nossos que tentaram fazer fama em outros países, inclusive o Rei Roberto Carlos, o que também pode ser motivo de desaprovação.

Independente de gostar ou não, reconheço que a Anitta é sucesso e sabe construir muito bem um futuro, mesmo sendo incoerente com certas ideias e atos. Ela é daquelas aptas a frase “bem ou mal, mas falem” e isso é corajoso. Enquanto moralistas lhe oferecem vaias, ela rebola, enriquece e conquista inúmeros admiradores por este planeta.

 
 


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