O que está em jogo em 2022 para a disputa pela Prefeitura de Fortaleza em 2024

O cenário vai se desenhando naturalmente para a próxima pauta da política municipal

Foto: Natinho Rodrigues

A eleição de 2022 ainda nem esfriou, mas já tem pano pra manga da disputa em 2024. A eleição de Lula (PT) como presidente da República, a vitória de Elmano (PT) como governador do Ceará, o desempenho dos eleitos para o Poder Legislativo e, claro, os derrotados neste ano compõem o cenário básico onde devem se movimentar as figuras-chave da política cearense para os próximos dois anos.

Nesse tempo, por óbvio, muita coisa pode acontecer, mas até março de 2024, que é geralmente o período da janela partidária, por exemplo, estaremos de olho nas figuras que se destacaram em 2022 e que se preparam para ser testadas no meio político de 2023. As definições que teremos a partir de então dependerão de como elas chegarão até as mesas de negociação pré-eleitorais.

E não é só de resultado das eleições recentes que essa conta é feita. Nas próximas semanas, outros movimentos já em curso serão importantes para o terreno que teremos em 2024, como a eleição da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa e, mais ainda, da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Fortaleza. 

Se você ficou curioso em saber porque destaco esses pontos, convido, então, para um olhar um pouco mais aprofundado. 

1) A vitória de Camilo e Elmano 

Independentemente de qual fosse o resultado das eleições de 2022 nas urnas, o cenário que se desenhava para os quatro anos seguintes representaria uma mudança nos pilares da política até então.  

Pela primeira vez, tivemos três candidaturas competitivas, de nomes fortes: Elmano (PT), Capitão Wagner (União) e Roberto Cláudio (PDT).  

O racha de PT e PDT para definição da chapa abalou as expectativas de continuidade do Governo. Por quase toda campanha, Capitão Wagner liderou as intenções de voto. Mas, no decorrer da disputa pela possível segunda vaga no 2º turno, viu-se o crescimento de Elmano, com a força dos padrinhos políticos Lula e Camilo, e a queda de Roberto Cláudio, ao lado do então candidato à Presidência Ciro Gomes, desacreditado e abandonado por boa parte de históricos aliados, inclusive do próprio PDT. 

Nem segunda vaga, nem segundo turno. A eleição foi resolvida no dia 2 de outubro, com a vitória de Elmano. O PT soma mais quatro anos à frente do Governo do Ceará e, dessa vez, sem o carimbo dos irmãos Cid e Ciro Gomes como fiadores, caso de Camilo Santana em 2014. 

Foto: Thiago Gadelha

Desde que foi derrotado na sucessão de Luizianne Lins pela Prefeitura de Fortaleza, o PT ainda não tinha conseguido se reafirmar como cabeça de um grupo político, mesmo na gestão de Camilo. O papel do partido na disputa da Capital nos últimos anos foi marcado por rachas internos e por desempenhos pouco relevantes.

Agora, o PT tem Camilo como liderança consolidada no Estado e com fôlego para novos voos nacionais, um governador com militância histórica petista, a maior bancada de deputados estaduais e com a deputada federal mais votada em Fortaleza, Luizianne Lins. E além da base fortalecida no Estado e na Capital... 

2) Deu Lula na disputa pela Presidência 

Se teve um discurso repetido por Camilo Santana na estratégia de pedir votos na campanha eleitoral, foi o de dizer o quanto seria importante ter um governador e um presidente aliados, de preferência, claro, do mesmo partido. O ex-governador se ressente de, em oito anos de mandato, ter tido menos de dois de parceria plena, no então governo de Dilma Rousseff (PT), que sofreu um impeachment em 2016.  

O colunista e editor de política do Diário do Nordeste, Wagner Mendes, relembrou esse cenário do Governo Camilo logo após o resultado das urnas no último dia 30.  

Pois bem, com o PT de volta à Presidência da República e com amplo apoio do Ceará: o Estado registrou o maior aumento proporcional de votos em Lula no 2º turno entre os estados do Nordeste. 

Além do apoio do eleitorado, a governadora Izolda Cela (sem partido) é cotada para integrar o Governo Lula, com chances até de ocupar um ministério, como o da Educação. O próprio Camilo Santana é outro nome cotado para a formação de governo entre as lideranças cearenses. 

A relação direta é promissora para a futura gestão no Ceará, com o destravamento de projetos e investimentos em áreas estratégicas para o Estado. Se o cenário for positivo como o esperado, os petistas chegarão com mais força na mesa de negociação das eleições de 2024, tanto para a Prefeitura de Fortaleza como para a de outros municípios. Por falar em petistas... 

3) E Luizianne Lins? 

Não dá para falar em PT e eleições municipais em Fortaleza sem tratar do papel da ex-prefeita e deputada federal eleita para o terceiro mandato, Luizianne Lins. Desde que deixou a Prefeitura, em 2012, ela disputou o cargo novamente em 2016 e 2020. Em ambos os pleitos, ficou em terceiro lugar. 

Em 2016, pouco antes de o partido amargar o impeachment de Dilma, a candidatura em Fortaleza foi homologada com a presença de Lula. O hoje governador eleito, Elmano de Freitas, era o então candidato a vice de Luizianne, após ter sido derrotado em 2012 por Roberto Cláudio. 

Foto: Thiago Gadelha

Em 2020, Luizianne chegou a ficar tecnicamente empatada nas pesquisas de intenção de voto contra os candidatos Capitão Wagner (então no Pros) e José Sarto (PDT), mas terminou distante dos adversários, com 17,7% dos votos. A campanha desse ano acirrou o racha com o PDT, diante dos ataques sofridos por Luizianne por parte da campanha pedetista. 

Nas duas disputas, Camilo adotou postura de neutralidade no primeiro turno por causa de seus impasses pessoais em apoiar PT ou PDT. 

Mesmo sem o apoio do principal cacique petista, Luizianne manteve força junto ao eleitorado fortalezense, o que se confirmou com o resultado das eleições de 2022. A petista foi a mais votada na Capital, com 119.326 votos, 8,52% do eleitorado. No Estado, ela foi a sétima parlamentar mais votada, com 182.232 votos. 

Se esse capital político será testado novamente em 2024, ainda não se sabe. Mas, por enquanto, o foco é mapear a força atual das lideranças. E a preço de hoje, outro destaque é a presença de históricos aliados de Luizianne na equipe de transição de Elmano de Freitas. 

Oficializada no último dia 6 de novembro, a lista traz, na equipe de Izolda Cela, o ex-candidato a vice-prefeito na chapa de Luizianne, Vladyson Viana, presidente do Sine-IDT no Ceará. Já na equipe de Elmano, estão dois nomes fortes da gestão da ex-prefeita: Alfredo Pessoa, ex-coordenador da comissão de transição da gestão Luizianne Lins e secretário do Planejamento e Gestão no secretariado da petista; além de Ana Maria Fontenele. Doutora em Economia, ela comandou as secretarias de Administração e de Educação no governo municipal e assumiu também a Saúde em período de forte crise da pasta, em 2011. 

Alfredo Pessoa é, inclusive, um dos cotados para assumir a pasta do Planejamento no Governo Elmano, como mostrou o colunista do Diário do Nordeste Egídio Serpa. E se o assunto é transição de governo, não é possível deixar de ressaltar também o papel de... 

4) Izolda Cela 

A consolidação da relevância política da primeira mulher governadora do Ceará tem se mostrado, em dentre outras atuações, no fortalecimento de seu nome como possível ministra da Educação do Governo do Lula. 

A sondagem não é de agora, mas, nos últimos dias, ganhou apelo público entre nomes fortes das políticas públicas de educação no País. 

A co-fundadora e presidente-executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz, declarou que há "muita chance" de Izolda assumir a pasta. Priscila respondeu ao ex-presidente do Novo, João Amôedo, que defendeu os nomes de Izolda, da própria Priscila e da ex-diretora de Educação do Banco Mundial, Cláudia Costin. 

"Cláudia Costin e eu estávamos na reunião da transição de hoje de manhã. E Izolda Cela tem muita chance de ser a primeira ministra mulher desde a redemocratização", disse Cruz.

De que forma esse capital político de Izolda vai se refletir para as tratativas de 2024 é uma incógnita, mas ela se tornou, em 2022, uma peça importante da política cearense. Sem partido desde que deixou o PDT, há quem alimente expectativas de que ela possa se filiar a siglas como PT ou PSB. Mas por enquanto, Izolda tem dito que merece umas "feriazinhas" pós-governo. Aguardemos. 

Foto: Thiago Gadelha

4) E Roberto Cláudio? 

Quem também está sob uma atmosfera de expectativa sobre o uso da bagagem política em um futuro próximo é Roberto Cláudio. Desde que ficou em terceiro lugar na disputa pelo Governo do Ceará, o ex-deputado e ex-prefeito de Fortaleza tem se mantido recluso de agendas públicas. 

Logo após o primeiro turno, manifestou-se apenas em publicações nas redes sociais, na qual agradeceu o apoio dos eleitores, da militância e de aliados políticos. Em relação à vitória de Elmano, desejou "sucesso e boas realizações aos vencedores", sem citar nomes. 

Durante a disputa do segundo turno, uma mobilização do PDT em Fortaleza chegou a convocar militantes para o evento "Sou Ciro e RC, Tô com Lula". Na ocasião, nem Roberto Cláudio muito menos Ciro estiveram presentes. 

Foto: Thiago Gadelha

Após a vitória de Lula, Roberto Cláudio parabenizou o presidente eleito pelo resultado e desejou sucesso à gestão. 

O baixo desempenho na eleição de 2022, especialmente em Fortaleza, onde tem o atual prefeito como aliado e uma ampla base de vereadores pedetistas, é um dos abalos no histórico do grupo político na Capital nos últimos 10 anos. Até porque, daqui a menos de dois anos, Sarto vai ter de decidir se concorrerá à reeleição, e o cenário de hoje não está tão favorável como outrora esteve em 2020. 

5) Sarto e a possibilidade de reeleição 

Sarto ainda tem dois anos de gestão pela frente, é bastante tempo para fortalecer seu papel como prefeito e demonstrar força para disputar uma campanha de reeleição. Na campanha de 2022, Sarto teve protagonismo aquém do esperado no que diz respeito a transferir apoio político.  

A vitória em Fortaleza ficou com Capitão Wagner, com 41,51% dos votos (602.050), cerca de 60 mil votos à frente de Elmano e com mais do dobro de Roberto Cláudio. Nas duas últimas eleições, de 2016 e 2020, Wagner levou a disputa com RC e com Sarto para o segundo turno pela Prefeitura de Fortaleza.  

Ele sai de 2022 muito mais forte que seus ex-adversários na Capital. 

Foto: Camila Lima

Por agora e com o tempo que há pela frente, há espaço para Sarto. Na campanha de 2º turno, mesmo com o sumiço de Roberto Cláudio e Ciro, seus padrinhos políticos, Sarto chegou a reunir vereadores e a atuar diretamente na campanha em favor do petista. 

Em outubro, o próprio Cid chegou a dizer que "é natural" que Sarto seja candidato à reeleição. Mas já vimos, em 2022, que a lógica do "é natural que" não é lá muita garantia.  

6) E Capitão Wagner? 

Sem mandato a partir de 2023, quando encerra a atuação como deputado federal, Capitão Wagner não tem muito a perder se engatar o pós-2022 numa pré-campanha à Prefeitura de Fortaleza. 

Em 2020, Wagner saiu do 2º turno contra Sarto com a sensação de que foi por pouco que a vitória escapou. Se o atual prefeito não aproveitar os próximos meses para fazer sua marca, deixa espaço para a oposição pavimentar uma campanha competitiva. 

Dessa vez, o deputado federal terá no seu entorno aliados de Jair Bolsonaro que se consolidaram junto ao eleitorado da Capital. 

Foto: Thiago Gadelha

A bancada parlamentar, por exemplo, atraiu uma fatia significativa do eleitorado da Capital. Nomes como André Fernandes (PL), Ronaldo Martins (Republicanos), Dra Mayra Pinheiro (PL) e Priscila Costa (PL) estiveram entre os candidatos a deputados federais mais votados no Estado. O deputado estadual mais votado de Fortaleza foi Carmelo Neto (PL). 

Se, até 2024, não houver uma ruptura dentro da oposição, com chances de outros nomes disputarem a cabeça de chapa, há chances de uma aliança mais robusta entorno de Wagner. 

7) Finalmente, a disputa que importa agora 

E a saga das eleições em 2022 ainda não acabou! Calma, não é um comentário sobre os resultados das urnas, afinal a integridade e a regularidade do processo eleitoral seguem firmes e fortes.  

A questão agora é a eleição dos presidentes dos poderes Legislativos na Capital e no Estado. Na Assembleia Legislativa, há um movimento em apoio à recondução de Evandro Leitão à presidência da Casa – como já mostrou o colunista Inácio Aguiar. 

Foto: Thiago Gadelha

Evandro Leitão segue como o maior partido da Assembleia, com 13 deputados. Tradicionalmente, a maior bancada indica o presidente. Além disso, Evandro é um nome que, desde o início da campanha, esteve próximo da campanha de Elmano e Camilo e protagonizou uma das cenas mais irreverentes da comemoração da vitória petista, no palco do comitê petista.

Já na Câmara Municipal de Fortaleza, havia uma disputa de bastidores entre Gardel Rolim (PDT), que é o líder do governo Sarto na Casa, e Léo Couto (PSB), também aliado do prefeito. Nos últimos dias, porém, uma articulação de Cid Gomes (PDT) acabou retirando a candidatura de Léo. Agora, Gardel tem o caminho livre para virar presidente e se fortalecer na Capital.



Assuntos Relacionados