Em todo processo de análise de contas de governo, é comum o órgão de controle externo, caso do Tribunal de Contas do Estado (TCE), apresentar um conjunto de questionamentos sobre a aplicação dos recursos públicos e expedir recomendações ao governo do Estado – neste ano foram 70, ao todo. É assim em praticamente todos os anos.
Na análise das contas de Camilo Santana do ano de 2021, no entanto, o parecer do Ministério Público de Contas e o voto da relatora do processo fez o clima esquentar e causou preocupação entre os secretários do governo do Estado.
No fim da análise, como também é de praxe, as contas tiveram parecer para aprovação com ressalvas, mas o embate técnico evidenciou um problema reconhecido até mesmo pelos membros do Estado. O parecer agora vai para a Assembleia para decisão final dos deputados estaduais.
O centro da polêmica, na sessão desta quarta-feira (26), foi a abertura de créditos suplementares ao Orçamento estadual. Essa ferramenta, prevista na Lei Orçamentária Anual (Loa) e na Constituição Federal, é de aplicação permitida, porém dentro de limites impostos pela lei. O Estado ultrapassou esse limite no Exercício de 2021.
O crédito suplementar é um dispositivo que, como o nome sugere, suplementa ou reforça uma dotação orçamentária já prevista na LOA. Por exemplo, na Saúde, os recursos previstos inicialmente podem precisar de reforço e isso é feito por meio de decreto governamental, limitado ao percentual máximo de 20% do total, conforme regra constante na LOA, que é aprovada pelo Poder Legislativo.
Em caso de descumprimento deste percentual, incorre o Estado em suplementação sem a devida autorização legislativa. Um erro grave, reconhecido pelos sete conselheiros da Corte, independentemente do voto final que acabou sendo pela aprovação das contas com ressalvas.
Segundo o parecer do Ministério Público de Contas, entre novembro e dezembro de 2021, o Estado emitiu 10 decretos suplementando o orçamento acima do percentual determinado em lei, totalizando R$ 1,9 bilhão em recursos.
“Desnecessário ressaltar a gravidade da abertura de créditos em desrespeito ao limite legalmente fixado; o dinheiro público não pode ser livremente manuseado pelo administrador, que, para alterar ou adicionar dotações orçamentárias inicialmente previstas, não pode prescindir da devida autorização legal”
Na sessão, ele reforçou a tese embora tenha feito uma ressalva sobre a austeridade. “Não quer dizer que há corrupção e desonestidade, mas há uma questão técnica que precisa ser respeitada".
O parecer causou incômodo na equipe econômica do Estado, liderada pela secretária da Fazenda, Fernanda Pacobahyba, e pelo secretário de Planejamento, Ronaldo Borges. O Estado disse acreditar na tese da “anualidade das contas". Por esse entendimento, o fato de o Estado ter enviado uma lei já no fim de dezembro para modificar esses percentuais limites, de 20% para 28%, daria respaldo às operações. Parte dos conselheiros discordou desse entendimento.
“Uma Lei Orçamentária é regida pelo princípio da anualidade, independentemente de uma norma ser aprovada em abril, em setembro ou em dezembro, a alteração deve viger em todo o exercício. O Estado do Ceará sempre pensou assim”, disse a secretária Pacobahyba.
"Pelo conjunto da obra, principalmente pelo cenário catastrófico da covid-19, o governador Camilo não merecia uma desaprovação de contas. Ainda bem que os conselheiros chegaram a um consenso que respeitou o conjunto da obra que foi excepcional”.
A decisão pela emissão de parecer prévio pela desaprovação das contas, defendeu a conselheira Soraia Victor, se deveu exatamente à abertura de créditos adicionais sem a prévia autorização legislativa. Ela foi acompanhada pelos conselheiros Patrícia Saboia e Alexandre Figueiredo.
Já o conselheiro Edilberto Pontes, que abriu a divergência em relação ao voto da relatora, considerou que, similar ao entendimento formulado pelo TCE Ceará para gestões municipais, que seria necessário assegurar um regime de transição para o governo estadual, já que não há precedentes, em exercícios anteriores, de falha semelhante. “Foi um erro procedimental grave do Governo, mas não dolo de burlar um comando constitucional”, argumentou.
Durante a sessão, diante do quadro de críticas a esse problema, alguns dos secretários ainda chegaram a conversar com conselheiros sobre a compreensão sobre a norma legal.
No fim, o resultado apertado, terminou 4 x 3 para o parecer pela aprovação com ressalvas, mostrou a importância do papel do controle externo que o Tribunal exerce sobre as contas do Estado.
PELA APROVAÇÃO
PELA DESAPROVAÇÃO