Futuro do Aeroporto de Sobral: novos voos e desenvolvimento regional

Legenda: Projeto atual do Aeroporto de Sobral apresentado à Anac pós-indeferimento da homologação
Foto: Divulgação

O novo Aeroporto Regional de Sobral, Luciano de Arruda Coelho, foi homologado na semana passada e está apto a receber voos. A portaria que inscreve o equipamento público no cadastro de aeródromos foi assinada na última terça-feira (10) pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O documento de homologação permite a abertura do tráfego aéreo no local.

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O aeroporto teve as obras civis inauguradas ainda em abril de 2022 pelo então governador Camilo Santana. O aeródromo, portanto, passou, por uma extensa campanha de trâmites e adequações finais com a Anac de mais de 09 meses.

O que é a homologação?

Segundo a Anac, “a homologação da infraestrutura aeroportuária pública deve ser feita para fins de inscrição inicial do aeródromo no cadastro, abrindo-o ao tráfego aéreo”.

“Ao fim do processo a Anac notifica o Instituto de Cartografia Aeronáutica – ICA (órgão integrante da estrutura do COMAER) para a divulgação das respectivas informações em serviço de informação aeronáutica disponível na internet – AIS WEB.”

O ex-secretário da Infraestrutura do Ceará, Lúcio Gomes, comemorou a homologação. Lúcio esteve à frente das obras. 

“Estava coincidentemente voltando de Sobral quando soube, em primeira mão sobre a homologação, o que me deixa muito feliz, boa notícia para nós todos! A expectativa é que a publicação se dê ainda essa semana”, disse ele à coluna.

Segundo Lúcio Gomes, a portaria de homologação seria lançada no Diário Oficial da União no dia útil seguinte, quando após, a Aeronáutica ficaria a cargo de inscrever o aeródromo no Rotaer-AISWEB.

Ainda, segundo Gomes, a inscrição no sistema acima representa uma virada de chave, já que toda a operação aérea do aeroporto atual (Virgílio Távora) passará para o novo aeródromo regional: “Não existe período de transição, no sistema não há espaço para dois aeroportos”, respondeu-nos.

O Governo do Estado ratifica em nota que, com a homologação, todas as informações referentes ao aeródromo serão incluídas no Rotaer Digital, que é disponibilizado pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) para auxiliar no planejamento e realização dos voos no espaço aéreo brasileiro. 

Voos comerciais

O próximo passo do processo será a operação dos voos comerciais. Para isso, o aeroporto aguarda a certificação, também emitida pela Anac. Segundo a autarquia, “o processo de certificação é o meio pelo qual é feita uma avaliação da infraestrutura do lado ar do aeródromo e da capacidade do operador de aeródromo de cumprir os regulamentos técnicos da Anac”.

Segundo o RBAC-139 (Regulamento Brasileiro de Aviação Civil – Certificação Operacional de Aeroportos), a certificação é necessária para aeródromos em que se pretenda realizar serviços domésticos regulares ou não, quando são aferidos o cumprimento de elementos mínimos de infraestrutura e de segurança operacional.

O processo já foi iniciado e deve ser concluído em 30 dias. Nessa etapa serão conferidas e classificadas, por exemplo, os tipos de operação permitidos para a pista de pouso e decolagens e a categoria da seção contra incêndio.

Desenvolvimento do tráfego aéreo no novo aeroporto

Digo que será o início de um novo patamar de operações aéreas no novo aeródromo de Sobral. Por quê?
Porque o aeródromo atual Virgílio Távora não possui estrutura para receber aeronaves para muitos passageiros. 

Segundo Lúcio Gomes, as aeronaves que serão possíveis de operar no novo aeródromo nunca operaram em Sobral, “nem de perto tivemos aeronaves assim”. 

“Com a homologação agora, poderá pousar o A320”. Se não de todos os modelos, a Família A320 é a mais numerosa frota de aeronaves do Brasil. Operações com A320 são o piso de qualquer aeroporto que deseje ganhar relevância: ponto para Sobral.

O ex-secretário, porém, chama atenção para a cadência gradual com a qual a cidade deve ganhar novos voos, com conhecimento de causa:

“Precisamos ter os pés no chão, que nada ocorrerá do dia para a noite. Precisa haver um estudo de demanda para o início de voos comerciais mais representativos, ninguém vai por um voo de carreira se não houver demanda”.

Complementado com muita coerência: “o mais comum é que o início das operações se desse com um ATR-42 ou 72”, aeronaves operadas pela Voepass e pela Azul. Lúcio Gomes se refere às aeronaves regionais, boas para desenvolver novos destinos. 

Lembra ainda que o aeroporto tem muita área para expansões: “com o tempo, podemos ampliar no futuro, em todos os aspectos, ampliar e alargar pista, por exemplo. Ao contrário do outro, o atual tem o rio Acaraú de um lado, não tem espaço para fazer um terminal decente. As coisas devem acontecer a partir de agora”.

Por fim, o desejo do ex-secretário formalizado inclusive para a equipe de transição do atual Governo do Estado, é o de transformar o aeroporto Virgílio Távora em parque, aproveitar áreas verdes para amenizar o clima sobralense para quem estiver por perto.

Como era a aviação comercial em Juazeiro do Norte há 20 anos?

Para ilustrarmos como Sobral pode crescer em tráfego aéreo, trazemos para discussão um dos booms da aviação comercial no Ceará. Apresento dados da evolução de número de passageiros embarcados em Juazeiro do Norte entre os anos de 2000 e 2021, segundo a Anac.

Em 2000, foram 16.126 passageiros embarcados, contra 255.287 em 2019 (pré-pandemia), aumento de 16 vezes.

Cresci em Juazeiro e de fato, a aviação comercial da cidade no início do século XXI era restrita a companhias charters que não operavam diariamente.

Podemos apontar como um dos pontos de grande indução de crescimento do aeroporto, o uso do Fokker 100 pela Oceanair e a chegada da companhia Gol ao aeroporto, ambos em 2006. A Oceanair deixou de usar o Embraer Brasília em 2006, passando a utilizar o jato Fokker 100. A Gol marcou o início das chamadas até então “low costs” no Brasil.

Desde então o aeroporto de Juazeiro só cresceu e hoje é o 3º aeroporto mais movimentado do interior nordestino atrás de Porto Seguro e Ilhéus.

Como se iniciaram as operações comerciais em Jericoacoara?

Eu sempre digo que Jeri é um dos fenômenos da aviação comercial brasileira. Em menos de 6 anos de operação, o aeroporto já rivaliza números com o grande destino Fernando de Noronha.

Porém, lá em 2017, as companhias aéreas iniciaram operações prevendo o grande sucesso do destino? A resposta é não!

Na verdade, o aeroporto teve suas obras finalizadas em janeiro de 2017, mas apenas em junho recebeu o 1º voo comercial (charter).

O aeroporto que hoje chega a ter 5 ou 6 decolagens comerciais por dia, iniciou com um voo da Gol aos sábados. Tudo se iniciou em 24/06/2017.

O aeroporto passou todo o mês de julho daquele ano (alta estação) com apenas 1 operação semanal, até que quase 2 meses depois, a Azul iniciou voos aos sábados e domingos. Ou seja, o início do aeroporto foi bastante paulatino.

Então é certo que os dois grandes aeroportos regionais do Ceará um dia foram pouco relevantes. Sobral inicia sua história nos próximos dias e tentará se viabilizar.

Perspectivas de aumento de voos comerciais

Mas qual seria a real demanda aérea por voos da região de Sobral?

Hoje, Sobral opera com voos 3 vezes por semana pela Azul Conecta (segundas, quartas e sextas). Há a expectativa de muitos anos atrás de aumentar a posição na cidade com o turboélice ATR-72 de até 70 lugares com a Azul. 

Um executivo da companhia aérea certa vez disse que “no dia que o aeroporto de Sobral for entregue, no outro nós começamos a operar lá”.

Possivelmente, o voo poderia continuar ligado à Fortaleza ou conectar Sobral ao hub da companhia em Recife.

Entretanto, afirmo, dado que Sobral e a região norte possuem números pujantes, que o novo aeródromo venha a receber uma boa quantidade semanal de jatos das principais companhias aéreas brasileiras.

Como poderíamos prever uma quantidade de passageiros com base estatística para o futuro aeroporto de Sobral?

Selecionamos 7 dos maiores aeroportos do interior nordestino e cruzamos dados (aproximados) de população e de passageiros até novembro de 2022 (Anac). 

Buscamos aeroportos em regiões que não possuem relevante apelo turístico. Percebam que os aeroportos estão em cidades das mais importantes do interior nordestino, assim como Sobral é para o Ceará: cremos que o modelo estatístico consegue capturar uma previsão considerável.

O resultado é a reta de tendências em pontilhado na figura acima. Para uma análise conservativa (pessimista), nos basearemos apenas na população do município de Sobral (desconsiderando cidades ao redor) que é de 210 mil habitantes, segundo o IBGE (2020).

Com a análise estatística, a movimentação de passageiros esperada para o novo aeroporto de Sobral é da ordem de 110 mil passageiros em 12 meses (embarque e desembarque).

Por dia, portanto, o potencial estatístico desse levantamento para a cidade do norte do Ceará é de 301 passageiros, o que demonstra que Sobral poderia receber um A320 por dia, ou um 737-Max, com mais de 80% de ocupação. Ambas aeronaves podem ser operadas no novo terminal.

Sinergias de rotas 

Para potencializar o resultado de futuras rotas para Sobral, as companhias aéreas poderiam fazer voos triangulares entre destinos no Sudeste, Jericoacoara e Sobral, ou até Parnaíba e Sobral. Pela grande proximidade das cidades, companhias poderiam ter sinergias de mercados distintos e encher aviões.

A Azul já o faz, realizando o voo triangular Campinas-Parnaíba-Jeri alguns dias da semana.

O sucesso do novo aeroporto pode significar diminuição de passageiros nos aeroportos de Jericoacoara (Cruz) e Fortaleza, mas mais facilidade para que a população da zona norte acesse grandes centros brasileiros.

O novo aeroporto de Sobral será o 5º grande terminal do Ceará.

O que faltava para a homologação do novo aeroporto?

Abrimos questionamento em 16/12 na plataforma Fala.br (GOV.BR). Lá direcionamos a pergunta para a Anac o que faltava para a homologação de Sobral? 

As respostas foram todas atinentes a modificações no projeto de sinalização horizontal de pátio de estacionamento e pistas de taxiamento (taxiways).

Até outubro/22, segundo informado pelo ex-secretário Lúcio Gomes, o desenho da sinalização era como na figura abaixo, em que as posições de estacionamento eram paralelas ao terminal de passageiros:

Legenda: Plano prévio da disposição de estacionamentos (1 a 6) de aeronaves e raias de taxiamento (outubro/22)
Foto: Divulgação

O projeto acima seguia modelos utilizados em aeroporto estaduais como Jericoacoara (Cruz) e Aracati.

Legenda: Detalhe de aeronaves estacionadas paralelamente ao terminal de passageiros no Aeroporto de Jericoacoara
Foto: Divulgação

O modelo de sinalização horizontal acima, entretanto, fora questionado pela Anac no sentido de não respeitar alguns critérios do RBAC-154 como separação entre eixo de taxiway e pátio, além da possibilidade da formação de sombras à noite no lado oposto aos refletores.

Dessa forma, a Seinfra precisou alterar o projeto com uma sinalização do modelo de Juazeiro do Norte, em que as aeronaves estacionam perpendiculares ao terminal de passageiros (TPS).

Mix de Aeronaves

Segundo a planta do projeto enviado pela Seinfra, o novo aeroporto de Sobral terá a capacidade de receber simultaneamente gama variada de aeronaves como turboélices King Air, Learjet-45 e Embraer-145 (jatos), ATR-72 e há espaço para o gigante narrowbody da Airbus A321-Neo de até 44 metros.

Acreditamos que o A321-Neo tenha sido utilizado para ilustrar que o pátio possui bastante espaço, porém, não creio que o A321 possa operar no aeroporto, dado que a pista possui apenas 1.800 metros: a penalização em diminuição de passageiros não compensaria a operação.

Conforme figura 03, o estacionamento do A321-Neo seria oblíquo (inclinado) em relação ao pátio. Assim, a reboque, a posição 6 de estacionamento poderia receber todos os jatos de um corredor comuns da aviação mundial: desde os Embraer Jets 190, 195; Boeing 737-700 e 800 e toda a família Airbus, do A319 ao A321.

Sobral terá por fim, um aeroporto que credencia a região a um grande salto na aviação comercial, difícil até pensar sobre como a região não diligenciou antes a construção de um aeródromo robusto como o pretendido.

Ademais, chamo atenção para o fato de que as aeronaves parqueadas nas posições de 1 a 6 poderem manobrar sozinhas para deixar o pátio. Vejam os arcos que acompanham a movimentação do trem de pouso do nariz, prescindido de tratoramento para movimento de push-back.

Uma dúvida que pode pairar é sobre se o pátio pode receber jatos médios como Boeing e Airbus nas posições de 1 a 5. O comprimento do Embraer-145 na posição 1 é de 29m, já o 737-800 tem 40m de comprimento: o aeroporto poderia então receber apenas 01 jato médio por vez (posição 06).

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*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.



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