O que os filhos aprendem quando a gente não está falando
Presença, exemplo e vínculo no cotidiano da maternidade
A pauta da tecnologia é constante entre pais de crianças pequenas. Estamos atentos ao tempo de tela, preocupados com os estímulos digitais e com o quanto o uso excessivo de aparelhos pode interferir no desenvolvimento infantil. Mas, em muitos casos, esquecemos de observar o nosso próprio comportamento.
Outro dia, Beatrice me chamou para brincar e foi direta: “Mamãe, guarda o celular. Agora é hora de brincar comigo.”
Fiquei paralisada. Aquela frase me atravessou como um espelho. O que estamos ensinando, mesmo sem perceber? Que presença é essa que oferecemos quando dividimos a atenção com uma tela?
A verdade é que não adianta discurso sem coerência. As crianças nos observam o tempo todo e aprendem mais com o que fazemos do que com o que falamos.
“A gente precisa se autoeducar. É quase como apertar uma tecla e se perguntar: ‘Qual é a imagem que eu quero passar para o meu filho?’ E então me reconstruir a partir dessa imagem. Há muita concessão envolvida".
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Presença não é performance
Vivemos numa cultura que valoriza muito o fazer: levar para a escola, preparar a lancheira, garantir as atividades extracurriculares, manter tudo sob controle. Mas presença verdadeira vai além da agenda cheia de compromissos.
Estar com os filhos é sobre conexão, escuta, entrega. É sentir e deixar-se sentir. É participar, não apenas controlar. Às vezes, é melhor uma hora de brincadeira de corpo e alma do que um dia inteiro junto com o pensamento distante. Caroline reforça essa relação:
“Cuidar de uma criança não é só cumprir as tarefas do dia a dia. Estar com uma criança é também aquilo que a gente chama de memórias afetivas. É ter paciência para escutar, é ter disponibilidade para acolher o choro, é estar conectado e poder perguntar: ‘Mas aí, o que foi que aconteceu?’ É poder construir memórias. Educar uma criança tem muito a ver com o quanto estou disponível - para além de apenas gerir a vida dela.”
Exemplo ativo: o sedentarismo começa em casa
Outro ponto que me atravessou nesses dias foi a relação entre saúde, movimento e rotina. Toda mãe deseja que o filho cresça com saúde, mas será que estamos sendo agentes dessa construção?
Um estudo da Universidade Estadual Paulista (Unesp) mostrou que filhos de pais sedentários têm maior tendência a serem inativos. Já quando pais e mães têm uma rotina ativa, o impacto positivo nos filhos é expressivo e duradouro.
Nossos hábitos falam. Caminhar, dançar, brincar ao ar livre, se mover, tudo isso ajuda a formar uma criança mais consciente do próprio corpo e mais aberta à vida.
Entre a frustração e a esperança
Nem sempre é fácil. Às vezes, a culpa aparece, o medo toma espaço, a insegurança se impõe. Mas também é nesse lugar de vulnerabilidade que podemos encontrar força para mudar, melhorar, recomeçar.
“A maternidade é uma montanha-russa - e não dá aviso prévio. A gente se prepara vivendo, sabendo que não temos controle sobre todas as coisas. É imperfeita e tem limites. Porque ser mãe é apenas uma das funções que a mulher exerce”.
Ser mãe é um exercício constante de tentativa, erro e recomeço. Não buscamos perfeição, mas presença, consciência e vínculo. Que nossas escolhas - mesmo imperfeitas - sejam sempre atravessadas por intenção, por amor e por esperança.