Quiet Cracking: o custo invisível do silêncio no trabalho

Escrito por
Delania Santos ds@delaniasantos.com
(Atualizado às 15:42)
Legenda: O Quiet Cracking é uma espécie de fissura silenciosa que vai minando a cultura organizacional aos poucos
Foto: Shutterstock

Setembro Amarelo está chegando e com ele um convite para refletirmos sobre saúde mental e sobre a urgência de quebrar silêncios que, muitas vezes, custam caro.

Conversas evitadas, feedbacks não dados, lideranças ausentes e pequenas exclusões do dia a dia podem gerar rachaduras invisíveis que comprometem não apenas a produtividade, mas o bem-estar de todos. Vamos refletir?

Na vida pessoal, sabemos que expressar pode salvar o bem-estar e as relações. No mundo do trabalho, esse princípio também é verdadeiro e deveria ser natural, mas, infelizmente, não é!

Um fenômeno, muito mais difícil de ser notado que o Quiet Quitting (quando um colaborador decide reduzir o nível de esforço e engajamento e limitar sua atuação às linhas do seu cargo), surge e preocupa especialistas e líderes.

Já Quiet Cracking é uma espécie de fissura silenciosa que vai minando a cultura organizacional aos poucos. Diferente de um grande conflito ou de uma ruptura evidente, ele surge em gestos sutis: um colaborador que deixa de ser ouvido, uma equipe que não recebe reconhecimento, uma liderança que se fecha em vez de dialogar, provoca um distanciamento difícil de ser resgatado.

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O Quiet Cracking ou “rachadura silenciosa, em tradução livre”, é o fenômeno que caracteriza o profissional que aparece na empresa, faz o seu trabalho, mas sofre em silêncio enquanto exerce o seu papel. As metas continuam sendo batidas, os relatórios entregues e todas as expectativas atendidas.

O ambiente parece funcional, mas por baixo há desgaste emocional, perda de pertencimento e, em muitos casos, um sofrimento profundo que passa despercebido. A desconexão emocional com a empresa é gradual e o perigo está justamente na sua sutileza.

O custo desse silencio é alto. Empresas que não percebem as rachaduras invisíveis acabam assistindo à queda do engajamento, ao aumento da rotatividade e ao afastamento de profissionais talentosos.

No entanto, mais grave do que isso, estão as consequências humanas: quando alguém não encontra espaço para expressar suas dores ou inseguranças no trabalho, o impacto atinge sua autoestima, sua saúde emocional e até sua vida fora da empresa. Não é raro que sentimentos de solidão e desesperança se intensifiquem nesse cenário.

Alguns gatilhos provocam o Quiet Cracking e para uma melhor identificação, preferi dividi-los em três categorias:

Fatores Organizacionais

· Falta de comunicação clara e transparente: informações truncadas ou decisões tomadas sem explicações alimentam insegurança.

· Liderança ausente ou autoritária: quando o líder não escuta, não apoia ou não dá feedback construtivo, o time perde confiança.

· Reconhecimento insuficiente: esforço e dedicação ignorados levam à sensação de invisibilidade.

· Cultura de exclusão: microexclusões, reuniões sem convite, grupos fechados e piadas veladas corroem o senso de pertencimento.

· Mudanças malconduzidas: reestruturações, cortes ou novas metas impostas sem diálogo geram medo e silêncio.

Fatores Relacionais

· Falta de confiança entre colegas: quando há competição excessiva ou ambiente tóxico.

· Conflitos não resolvidos: divergências varridas para debaixo do tapete que se transformam em distanciamento.

· Ausência de empatia: quando sentimentos e necessidades emocionais são constantemente desconsiderados.

Fatores Individuais

· Medo de retaliação: profissionais que acreditam que falar trará punições preferem se calar.

· Esgotamento emocional: quem está perto do burnout se recolhe, evita interações e apenas “sobrevive” no trabalho.

· Sensação de inutilidade ou falta de propósito: quando o colaborador não enxerga sentido no que faz.

Por isso, o Setembro Amarelo nos lembra que abrir espaço para a fala não é apenas uma causa social, mas também um dever de líderes e organizações. É preciso cultivar ambientes em que a escuta genuína seja prática, em que o diálogo seja valorizado e em que a vulnerabilidade não seja vista como fraqueza, mas como parte da condição humana.

Mais do que prevenir fissuras culturais, essa postura protege o que temos de mais valioso: as pessoas.

Como os líderes podem identificar sinais de Quiet Cracking?

Os líderes são os guardiões da cultura organizacional e responsáveis por engajar com propósito. Nesse sentido, identificar os sinais em meio às demandas organizacionais será um grande desafio.

Alguns sinais comuns incluem queda no engajamento; isolamento; desmotivação silenciosa (entregas feitas no limite mínimo, sem energia ou criatividade); ausência de reconhecimento mútuo (time já não celebra as conquistas); e um clima de desconfiança (as conversas ficam mais formais e sem espaço para vulnerabilidade).

E quando o líder está com rachaduras silenciosas? O cenário fica ainda mais desafiador! Impossível lidar com isso nos liderados quando há um sofrimento profundo. As empresas precisam criar e implementar iniciativas que construam um ambiente sem rótulos ou “paredes”.

Criar indicadores de bem-estar e engajamento; capacitar os líderes para identificar os sinais e atuar com escuta empática; entender com profundidade o perfil dos colaboradores para entender a diversidade de necessidades e promover a saúde mental como parte da experiência corporativa são iniciativas importantes e necessárias.

Você se sente assim na sua empresa?

O primeiro passo é reconhecer que algo não vai bem! Muitas vezes preferimos minimizar a encarar o que realmente estamos sentindo. Não há nada de errado em não estar bem, e isso não compromete suas qualidades e talentos. Busque apoio conversando com alguém de confiança dentro ou fora do trabalho. Depois...

1. Expresse-se: se possível, compartilhe suas percepções com a liderança ou RH.

2. Cuide de si: reserve tempo para atividades que renovem sua energia emocional.

3. Procure ajuda profissional: não hesite em buscar acompanhamento psicológico, especialmente se sentir que a sobrecarga está grande demais.

No fim das contas, a lição é simples e poderosa: falar pode salvar vidas dentro e fora do trabalho. E liderar, hoje, também significa garantir que ninguém precise carregar sozinho o peso de um silêncio que dói!
 

Nesta coluna, trarei reflexões sobre carreira, liderança, coaching e tendências que impactam o mundo do trabalho. Sua participação é muito bem-vinda! Deixe sua pergunta, comente este post ou envie uma mensagem pelo Instagram: @delaniasantosds. Aproveite para se inscrever no canal do YouTube: @delaniasantosds. Será um prazer ter você comigo nessa jornada. Até a próxima!

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