No Brasil que vê um terço da população viver com insegurança alimentar, jovem de 17 anos ignora preconceito e espera, com a costura, mudar a vida da família e deixar de depender do Bolsa Família
Quando senta diante de uma máquina de costura, Kauan Soares está determinado a fazer o seu melhor. Não é comum ver um rapaz de 17 anos tão obstinado com linhas e tecidos. Mas de tanto observar a avó mover mãos e pés para manejar uma máquina, ele se interessou por aquela arte de juntar pedaços de pano e entrelaçar fios para produzir algo totalmente novo.
“Minha avó dizia que é como dirigir um carro. É controlar a direção com as mãos e o acelerador com os pés. Peguei gosto”, ele diz. Kauan nunca costurou com a avó, mas se aventurou ao trabalhar em uma loja de estofados e agora está se dedicando em um curso profissionalizante.
“Quando estou com a máquina de costura, preciso dar o melhor para sair bem feito. Ali estou fazendo uma roupa que vai ser usada por alguém. Mas atrás daquela roupa, está a história de quem costurou. E essa história é a minha”, resume.
A história dele é a de um garoto que espera um dia mudar de vida costurando. Vivendo num país em que um terço da população sofre com a insegurança alimentar, Kauan conta que já viu faltar comida na casa onde vive com a mãe e os irmãos, no bairro Granja Lisboa, na periferia de Fortaleza.
“A gente confia em Deus e aprende a não se agoniar. Come o que tem, quando falta arroz. Aí levanta a cabeça, pega esse curso e sonha em sair do aperto”, diz ele, que é religioso. A família dele sobrevive apenas com o valor de quase 700 reais do Bolsa Família, uma quantia insuficiente para pagar aluguel e alimentar a família na quarta capital brasileira. Quando a situação fica mais complicada, é a igreja que salva com alguma doação.
Para tentar melhorar a renda familiar, Kauan conta que deixou a escola há poucos anos e decidiu trabalhar na loja de estofados. Mas viu que a escolha não foi a mais acertada e agora espera completar 18 anos para fazer o caminho de volta pelo EJA.
Neste meio tempo, faz o curso itinerante do Centec e costura para sonhar. Há quem olhe torto ao ver a cena incomum de um jovem garoto pilotando uma máquina de costura. “A gente sabe que tem muito preconceito. Um homem costurando? As pessoas já falam mal. Eu não ligo para as opiniões das pessoas. Confio no que eu curto”, ele diz.
Kauan não tem máquina, mas tem um desejo enorme de conseguir um emprego em alguma empresa costurando. “Eu não só finalizo. Costuro uma roupa do começo ao fim. A professora desenha e eu faço”, ele diz, orgulhoso. E segue sonhando: com o emprego, com o futuro, com a possibilidade de um dia ter sua própria empresa.
“Meu sonho é dar uma vida melhor para a minha família. Espero conseguir isso costurando”.