O futebol, a utopia e a ilusão de reviver o que já foi bom um dia
A realidade é que o Neymar e o Vina ideal, embora vivos nas lembranças dos torcedores, são utópicos
Como Wilton Bezerra gosta de relembrar, Nelson Rodrigues tachava de idiota da objetividade aquele que buscava racionalidade onde se enxergava transcendência. Para Nelson, o futebol sem forças sobrenaturais não existia. A questão é que, hoje, tal pensamento não pode ser confundido com a ilusão de acreditar que é possível reviver o que já foi bom um dia.
Vejamos o caso de Neymar. Um retorno badaladíssimo ao Santos, com todas as pompas possíveis, na expectativa de recuperação do maior talento que o futebol brasileiro produziu nos últimos 15 anos. Esperança esta nutrida pelo anseio de reviver o craque que conquistou a América pelo próprio Santos, ainda com 19 anos. E que logo depois ganhou a Europa e o Mundo pelo Barcelona formando um dos trios mais espetaculares que o futebol moderno já viu.
A realidade: um fiasco completo. O camisa 10 foi muito mais protagonista nas páginas de fofoca que no noticiário esportivo. Sem contar as lesões, a falta de sequência e o fatídico último lance com a camisa do Peixe - ao menos se não renovar, a expulsão pelo gol de mão ficará marcada como tal.
Trazendo para a realidade do futebol cearense. O anseio de parte da torcida do Ceará no retorno de Vina passa muito por similar ilusão de reencontrar aquele jogador que já proporcionou momentos únicos.
Vina fez um 2020 incontestável no Ceará. Com 23 gols e 19 assistências, participou diretamente de 42 gols em 59 jogos daquela temporada. Foi o melhor meia do Brasileirão com merecimento e encantou. Foi um ano mágico que criou no imaginário do torcedor alvinegro que aquele era o normal dele. Mas não era.
A temporada em questão foi a melhor da vida do paranaense, que não conseguiu repetir os desempenhos nos anos seguintes. Inclusive, a saída do Ceará, em 2023, foi em baixa. Mas com o distanciamento temporal, é natural que os bons momentos falem mais alto na mente dos torcedores. Isso apegado à vontade da repetição de um nível de atuação que, verdade seja dita, hoje, não se sustenta.
Aos 34 anos, Vina vem de uma temporada que tem até bons números pelo Al-Jubail (em 19 jogos, 8 gols). Mas vale lembrar que estamos falando da 2ª divisão da Arábia Saudita, sem a menor comparação de competitividade com uma Série A de Campeonato Brasileiro, disputada em outra intensidade, outra rotação e que exige uma entrega muito maior.
Ainda mais para o modelo de jogo adotado por Léo Condé, que requer um Ceará focado no coletivo, e não no individual - em 2020, o Ceará era muito moldado para jogar tendo Vina como protagonista.
Guardadas todas as devidas proporções (todas mesmo, aqui não há absolutamente nenhum tipo de comparação), mas o Neymar e o Vina ideal são utópicos.
Ambos vivem de alimentar no torcedor a expectativa por um jogador que já foi espetacular, mas que hoje, não existe mais.
O tempo passa. E chega para todos. É preciso entender que, no futebol, nem sempre é possível reviver o que já foi bom um dia.