Dialogando com minha pele

Muitas doenças de pele são, ao mesmo tempo, um desejo de contato mais próximo e uma estratégia para criar uma barreira e impedir o contato íntimo

Legenda: Temos uma tendência a esquecer que todo sintoma deve ser visto em duas perspectivas: a biológica e a simbólica. Vale refletir sobre alguns aspectos de nossos relacionamentos e tentar decifrar as mensagens inconscientes veiculadas por nossos problemas de pele
Foto: Prostock-studio/Shutterstock

As expressões: “está bem em sua própria pele…”; “preciso mudar de pele…”; “estar de pele nova…”; “entrar na pele do personagem…” mostram a função simbólica da pele. A pele mede cerca de 2 metros quadrados. Com sua textura sensível e porosa, é uma grande aliada do cérebro, fornecendo-lhe os dados necessários para poder exercer sua função. Ela permite a ventilação e a transpiração de odores, o que elimina as toxinas nocivas ao corpo.

A pele tem como função principal proteger o corpo de qualquer tipo de agressão material ou microbiana. Através de cerca de 700 mil terminações nervosas, é possível sentir o ambiente e interagir com ele. A pele sempre lembra a conexão, o calor do contato e as dificuldades, além de ter uma grande habilidade de cicatrização. Ela proporciona ao organismo a capacidade de curar e construir-se de forma autônoma.

Nota-se que as feridas que surgem em situações de grande sofrimento psíquico têm dificuldade de se curar. A pele é um órgão de grande relevância social, sobretudo em culturas que valorizam o toque, como a cultura brasileira. Quando surgem problemas de pele, geralmente nos detemos apenas no aspecto material, externo e procuramos usar remédios, cremes para cuidar e tratá-la.

Temos uma tendência a esquecer que todo sintoma deve ser visto em duas perspectivas: a biológica, material, objetiva detectável pelos exames clínicos e laboratoriais, onde se busca explicá-lo analisando os processos bioquímicos e mecânicos do organismo; e a simbólica, invisível e subjetiva aonde se procura decodificar a comunicação inconsciente veiculada por ele. A psicossomática nos alerta que cada sintoma é o lado visível de um processo inconsciente, invisível. A primeira compete ao médico, aos profissionais de saúde, diagnosticar e tratar e a segunda somos nós que devemos cuidar e nos curar.

Precisamos estar atentos que, atrás de um sintoma, há sempre um alerta, uma mensagem, um apelo que precisamos decodificá-lo. Proponho hoje esboçar um diálogo com nossos problemas de pele. Os eczemas, micoses, vitiligos, psoríases, pústulas, botões falam de nossas dificuldades relacionais e interativas com o meio ambiente. É como se esses sintomas nos mostrassem que tem sido difícil, para nós, conviver com o mundo externo.

Minha proposta é acolher o meu problema de pele e dialogar com ele. Diálogo esse que só será possível se nos dispusermos a olhar para nossa história, nossos relacionamentos e nos abrirmos a outras leituras, para percebermos o homem na sua totalidade e imerso na sua cultura.

Vejamos: problemas na pele denunciam carência de afeto, porém de forma ambivalente. Ao mesmo tempo, em que deseja suprir essa carência, a pele com seus problemas afasta do contato. De fato, quem gostaria de tocar numa pele purulenta? Expressa o apelo com ambivalência de comunicação.

Em outras palavras, ao mesmo tempo, em que desejamos nos aproximar, inconscientemente nos afastamos do objeto desejado, apresentando enfermidades semelhantes às dos botões. É interessante notar a ambivalência comunicacional expressa pela pele. Muitas doenças de pele são, ao mesmo tempo, um desejo de contato mais próximo e uma estratégia para criar uma barreira e impedir o contato íntimo.

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As placas azuladas (manchas roxas) aparecem quando vivemos sentimentos de injustiça com fortes emoções. Essas placas falam das vezes em que não conseguimos digerir agressões e nem as liberar. Manchas na pele nos convidam também a refletir sobre algum sentimento de culpa ou desejo de nos camuflar, nos tornarmos invisível ao olhar do outro.

As irritações epiteliais falam de nossa irritabilidade em contextos em que não nos sentimos protegidos e com sentimentos de ameaças. As Acnes e Botões (pequenas elevações avermelhadas da pele) nos convidam a refletir sobre um sentimento de autorrejeição. Pele seca, pouco hidratada, fala de emoções retidas e de bloqueios no relacionamento com outras pessoas. Essa é uma maneira que o corpo encontra de expressar sua necessidade de ser cuidado, hidratado e alimentado, por meio de ações revitalizantes de atenção, afeto, carinho e amor.

O Eczema surge em contextos confusos e perturbadores. A Seborreia ou Pele Gordurosa nos diz respeito ao desejo de descartar o que não nos satisfaz. O Lúpus eritematoso é uma doença que afeta diversos órgãos, sendo considerada uma doença autoimune. O lúpus nos revela uma profunda desilusão, raiva e vergonha devido à grande carga de culpabilidade emocional que afeta o nosso sistema de defesa, o que nos torna vulneráveis e suscetíveis. Nessa situação, preferimos punir, isolar-nos ao invés de nos afirmar. Ou seja, o lúpus nos mostra a fraqueza e a derrota diante da vontade de viver.

A Psoríase denuncia um duplo abandono. É, ao mesmo tempo, um desejo de preencher um vazio afetivo, pela aproximação, e um medo do contato direto com a pele. A psoríase é uma tentativa que o corpo apresenta tomando a distância necessária para tentar resolver esse problema. Ela revela o desejo secreto de ser amado e acariciado. Geralmente aparece em pessoas muito sensíveis, após um choque moral. Essas pessoas temem ser magoadas novamente e se protegem a todo custo.

O Vitiligo, a pessoa sinaliza seu sentimento de não pertencimento, de sentir-se excluída da família, do trabalho e da comunidade. Fala também de um sentimento de ter sido separado brutalmente de pessoas muito queridas, junto a quem se sentia impotente e incapaz, mas com quem tinha a sensação de ser protegida de toda violência. O vitiligo é o nosso desejo de nos esconder para nos proteger. Mostra nossa necessidade de clarificar as coisas e ter cuidado real.

As Verrugas falam do sentimento de rejeição e incompreensão diante dos outros. Nos fala de humilhações vivenciadas, seja na escola ou na sociedade. As verrugas aparecem para preencher um vazio emocional.

Enfim, em face dos problemas de pele, vale refletir sobre alguns aspectos de nossos relacionamentos e tentar decifrar as mensagens inconscientes veiculadas por nossos problemas de pele. Vale salientar que estamos no âmbito da subjetividade e não de uma ciência exata. Precisamos ter consciência de que se trata de uma ciência mais interrogativa do que afirmativa. Somente a pessoa que apresenta o problema pode dar sentido.

Aqui estão algumas perguntas que podem nos ajudar a compreender meus problemas de pele: Como anda minha atmosfera familiar? Tive colo na minha infância? O que temo no contato com as pessoas? Tenho história de separação dolorosa? Tenho consciência que minha pele está apelando para eu ser cuidado/a?

Será que estou necessitando de carícias e estou impedindo que isso aconteça? Estou vivendo solidão no meio da multidão? O que tem me irritado ultimamente? Tenho medo do toque para eu não ter lembranças traumáticas do passado? Que acontecimentos vergonhosos me impedem de ser espontâneo/a?

Espero que essas questões sejam úteis para você, que tem problemas de pele, para complementar o tratamento que já está fazendo.

Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.

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