Regina Duarte é o retrato fiel do 'Brazil que mata o Brasil' 

Legenda: "Pra frente Brazil, salve a Seleção"
Foto: Arte: Antonio Laudenir

O show nazi encenado por Roberto Alvim foi só um treinamento. Uma canja. 60 dias depois de assumir o cargo decorativo de secretária especial da Cultura, Regina Duarte não deixou barato e rivalizou com o antecessor. A bizarra entrevista à CNN causou comoção pela crueldade. 

Espanto nenhum. A performance faz parte de um plano de governo. Não existe cultura na gestão defendida pela atriz. Artista é o inimigo a ser exterminado. Nunca houve Ministério da Cultura, que dirá secretaria. O que ocupa esse espaço é um faz de conta. Outra homeopática dose de horror midiático para desviar atenções.   

Mas, vamos lá. Regina cantarolou. Reduziu a Fundação Palmares a um “puxadinho” do Ministério do Turismo. Passou recibo à demência coletiva que saliva por AI-5 e ditadura militar. Questionada por ações concretas da secretaria gaguejou uma ou outra coisa ininteligível. Saiu de cena da forma mais constrangedora possível após tomar um esculacho. Da Maitê Proença.  

Se os dias seguem dolorosos, com a insustentável morte de brasileiros pela Covid-19, Regina aprofundou o tratamento desumano com a própria classe. Não basta a inoperância e o desdém na criação de medidas emergenciais, no sentido de socorrer artistas que estão passando fome com essa pandemia. 

A semana para a cultura brasileira foi marcada pelas perdas de Aldir Blanc Flávio Migliaccio. Da secretaria não se ouviu qualquer palavra de solidariedade. Nenhum tipo de reflexão em torno do legado deixado por estes dois realizadores. No máximo, parece ter rolado uma mensagem via zap zap aos familiares, algo assim. 

Ações concretas para minimizar a difícil situação dos trabalhadores da cultura, bulhufas. O Fórum Nacional dos Secretários e Dirigente Estaduais de Cultura cobrou o conjunto de propostas emergenciais discutidas com Regina, durante reunião realizada no dia 19 de março. 

Os secretários também querem respostas sobre a liberação do Fundo Nacional de Cultura. São 900 milhões de reais apontados no orçamento de 2020. Valor que teria por objetivo apoiar a classe artística e rede de trabalhadores da cultura e da arte, durante a crise da Covid-19.

Os artistas seguem desamparados pelo Governo Federal. É inexpressiva qualquer atuação direta nesse sentido. Estão abandonados. Sina angustiante. Os que produzem arte e cultura são esquecidos. Logo eles, cujo fruto do trabalho tem sido tão necessário à população no período de confinamento. Se algum tipo de política pública voltada a estes trabalhadores é anunciada, hienas com camisetinhas da CBF rangem os dentes nas redes sociais. 

Crueldade
 
Os próximos capítulos da novelinha “secretaria especial da cultura” podem ser ainda mais indigestos e surreais. O show nazi de Roberto Alvim foi só o ensaio. No melhor estilo ave de rapina, postulantes ao cargo já sobrevoam a cabeça da "namoradinha do 'Brazil'". A julgar pelo nomes ventilados na mídia, os requisitos de inanição intelectual e charlatanismo, tão indispensáveis em Brasília, estão garantidos. 

Regina Duarte retrata fielmente o “Brazil que mata o Brasil”. O verso entre aspas é referência à canção “Querelas do Brasil”, cria de Maurício Tapajós e Aldir Blanc. O mesmo Blanc que a secretaria afirmou desconhecer durante a presepada ao vivo. Pode? Parece que sim. 

Esse Brasil paralelo, com “Z”, é o território pantanoso de uma gente ressentida. Mortos vivos que idolatram o passado de morte e abominam a cultura do próprio País. São perdedores motivados pelo despeito, por alguma neura nunca resolvida. EUA acima de todos. “O Brazil não merece o Brasil. O Brazil tá matando o Brasil”. 

Os sucessivos e grotescos episódios desse “Brazil” dilaceram. Cansam. O esgoto pelo qual entramos e de onde “nada pegamos” pulveriza apatia. Tragédia sem precedentes, a Covid-19, por si só, seria suficiente para nos ensinar algum tipo de evolução pessoal. Longe disso. Sensatez, entretanto, nunca foi lá o nosso forte.  

Mundo de Mad Max

O "Brazil" comprova diariamente sua faceta mais bestial e grotesca. Arrotando “E daí?”  por cima do cadáver de mães e pais de família, o jeitinho brasileiro, a malemolência da boçalidade brazuca se supera e atinge níveis desesperadores. Trata de um pedaço de chão com a incrível capacidade de gerar e nutrir hordas assassinas. Pode uma nação ser mais hostil e perigosa que um vírus mortal? Sabemos da dolorosa resposta. Temos até carreatas para ela.

O instante de total devastação moral que vivemos se assemelha com o universo das ficções distópicas. Falo de episódios reais dialogando com algo antes restrito ao mundo do cinema. O comboio homicida que exige nas ruas o fim da quarentena é um exemplo doloroso. A cada novo fato e testemunho pessimista minha mente é tomada pela voz que narra o prólogo de “Mad Max 2 - A Caçada Continua” (1981).  

“Eu me recordo de uma época caótica. De sonhos arrasados. De uma terra devastada...”, nos conta o irretocável texto. E continua assustador: “Nesse turbilhão de decadência, homens comuns eram castigados e esmagados”. 

O “pum do palhaço” foi longe demais. Toma aqui essa nota de repúdio e estamos conversados.