Não há dúvidas de que casos de agressão devem ser tratados em acordo com o que dita o Código Penal brasileiro. Ameaças à integridade física e intelectual do outro não podem ser admitidas em uma sociedade que garanta aos cidadãos de seu território seus direitos humanos básicos. São manifestações de incivilidade, de desrespeito à regra mais elementar da ética, de respeito ao próximo; como tal, devem ser vigorosamente repreendidas.
O que deveria ser apenas óbvio exige ser reafirmado, em dias que o noticiário traz histórias de barbárie. Levou-se ao conhecimento da sociedade casos estarrecedores de agressões inadmissíveis, uma delas chegando a resultado irreparável. A morte recente de uma empresária segue em investigação, com o caso podendo vir a ser classificado como mais um feminicídio. Em outro episódio, um jovem foi agredido por um grupo, sem chances de defesa, dada a desproporção de forças, em um estabelecimento comercial. Suspeita-se ter sido este um crime de ódio, de homofobia.
Ambas as histórias, que à primeira vista parecem em tudo desencontradas, convergem quanto à vulnerabilidade de parcelas da sociedade, por questões de gênero. Neste contexto, por mais graves e chocantes que sejam os casos reportados, ambos figuram num quadro maior de situações semelhantes. São, portanto, mais comuns do que a repercussão pública dos casos pode sugerir.
Não são episódios isolados e, portanto, não devem ser tratados como tragédias, que remetem a ideias antiquíssimas de inevitabilidade e de destino. Ao contrário, são fenômenos sociais e, como tais, devem ser compreendidos a partir das ferramentas rigorosas da razão. A partir daí, é que devem ser estabelecidas ações no sentido de coibi-los.
Os dois casos vistos nesta semana já adentraram a esfera investigativa e judicial. São assuntos de Polícia e, em pouco tempo, espera-se, devem ser levados à justiça, para que as medidas cabíveis possam ser tomadas. As decisões, sejam quais forem, deverão ser consideradas exemplares, pois mostram a disposição das instituições de tratarem casos semelhantes.
Contudo, a sociedade precisa, mesmo nestes momentos de perplexidade diante do que é aparentemente absurdo e alheio à razão, tomar as rédeas de seus ânimos e olhar além destes casos. É mister não atomizá-los. Deve-se indagar, em todos os setores – públicos e privados – e, ainda, de forma individual e coletiva, o que pode ser feito para que situações como esta sejam minimizadas, convertam-se em exceções verdadeiramente excepcionais, e não regras de uma conduta para a qual se faz vista-grossa.
Os crimes de ódio seguem padrões distintos de outros, ligados às facções e ao tráfico, por exemplo. Envolvem, não poucas vezes, agressores sem passagens anteriores pela polícia, “cidadãos de bem”, que se ocultam sobre o aspecto de normalidade. Mas, em geral, o que se vê é a formação em espiral do crime.
A agressão física é precedida por comportamentos violentos e discurso de ódio. Estes são alertas e, desde suas primeiras manifestações, devem ser constrangidos, desestimulados e, quando correto, punidos. Tão fundamental como imputar sanções pelos casos concretizados é eliminar o ambiente que torna novos episódios possíveis.