Nossa relação com o Ceará sempre foi muito boa e assim vamos prosseguir, diz governador do Piauí

Wellington Dias espera que uma perícia do Exército acabe com o litígio de mais de um século sobre áreas na região da Ibiapaba

Escrito por Sérgio Ripardo ,
Legenda: Governador do Piauí, Wellington Dias (PT), disse que a relação com o Ceará vai prosseguir "muito boa"
Foto: Foto: Agência Brasil

Uma disputa territorial entre Ceará e Piauí voltou à tona e caminha para o capítulo final após uma recente decisão de Cármen Lúcia, ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), determinando que o Exército comece uma perícia técnica para resolver o litígio, que iniciou ainda no Império (1822-1889), há quase 139 anos.

"Nossa relação com o Ceará sempre foi muito boa e assim vamos prosseguir. Temos uma área que desde a Constituição de 1988 era para dar solução e não foi possível. Assim entendo, como já fizemos e com solução com a divisa do PI, BA, TO e MA, com esta perícia vamos também encerrar um litígio de mais de um século", disse, ontem, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), ao Diário do Nordeste.

No despacho, é informado que o Ceará se recusou a pagar metade dos custos da perícia, alegando que o ônus cabe ao Estado vizinho, autor do pleito. Em abril, o Piauí pagou 100% dos custos, quase R$ 7 milhões, para o Comando do Serviço de Cartografia do Exército fazer o trabalho de perícia e resolver o litígio histórico.

 

Região importante para o agronegócio, o setor de energia eólica e o turismo, a Serra da Ibiapaba, no noroeste do mapa do Ceará, é o principal palco desse conflito, já que as áreas reclamadas pelo Piauí estão nos territórios dos municípios de Viçosa, Tianguá, Ubajara, Ibiapina, São Benedito e Carnaubal, estendendo-se até o Sertão de Crateús.

A disputa envolvendo as áreas começou após a publicação do Decreto Imperial 2012, de 22 de outubro de 1880, que alterou a linha divisória das então duas províncias. Em 1920, sob mediação do presidente Epitácio Pessoa, os dois Estados assinaram um acordo arbitral, com a previsão de que o Governo da República mandaria "engenheiros de confiança" fazer um levantamento geográfico da região, o que não ocorreu até hoje, informa o site do Supremo (Processo relacionado: ACO 1831).

Na Ação Cível Originária 1831, o Estado do Piauí argumenta que as áreas indivisas se tornaram, com o passar do tempo, "terras sem lei", pois não se pode punir os crimes mais diversos ali praticados em razão da regra geral de fixação da competência pelo lugar da infração prevista no Código de Processo Penal.

Pelo mesmo motivo, não se cobram tributos devidos ao Erário e este, por sua vez, não se faz presente na construção e na manutenção de escolas, postos de saúde e estradas. A perícia será realizada pelo Comando do Serviço de Cartografia do Exército Brasileiro - e pelo seu Departamento de Ciência e Tecnologia (DCT) - a partir de levantamento de modelo digital de elevação a ser feito por empresa privada.

História

Na edição dos dias 4 e 5 de agosto do ano passado, um caderno especial publicado pelo Diário do Nordeste, intitulado "Território em Disputa", abordou esse litígio, ouvindo moradores das comunidades na divisa entre os dois estados.

A história do litígio começa no tempo da colonização do Brasil, precisamente com o Ceará subordinado à Capitania de Pernambuco e o Piauí à Capitania do Maranhão: "Nesse tempo, os maranhenses já reivindicavam a Ibiapaba, tanto é que eles pedem ao rei de Portugal que a missão jesuítica que foi fundada pelo Padre Vieira, com sede em Viçosa do Ceará, ficasse sob a jurisdição do Maranhão. Aí perderam a primeira questão, pois foi mantida como sendo no território do Ceará. Depois, com a criação da Capitania de São José do Piauí; e do Ceará, a questão da fronteira permaneceu indefinida no tocante à Ibiapaba", relatou João Bosco Gaspar, oficial substituto do Cartório Nogueira Lima, de Registro Civil, de Tianguá.

Ele ressalta que, em 1880, para resolver essa questão, os deputados das então províncias do Piauí e do Ceará, elaboraram um projeto, sob a vigilância do imperador, que se tornou decreto no dia 22 de outubro. O problema, segundo Gaspar, foi que o acordo especificou dois pontos de troca, de Luís Correia e Crateús, e a indefinição do restante permanece até hoje.

Cronologia do caso

2011

Agosto - A ação é ajuizada pelo Piauí contra o Ceará

2018

Janeiro - Ministro Dias Toffoli, do STF, determina a intimação do Exército para realização de perícia

Setembro - Ministra Cármen Lúcia substitui Toffoli na relatoria

2019

Fevereiro - Piauí pede determinação no recolhimento do restante do valor dos honorários requeridos pelo Comando do Serviço de Cartografia do Exército Brasileiro, ao Estado do Ceará

Março - Ceará salienta que "o responsável pelo recolhimento integral dos honorários do perito é a parte que requereu a perícia"

Abril - Piauí apresenta documento comprovando o recolhimento da complementação dos valores necessários à realização da perícia pelo Exército