Até o começo de março deste ano, havia uma agenda clara sendo trabalhada pelas principais forças da política representativa do País. O Governo Federal intencionava seguir com as reformas estruturantes, com as quais o grupo político no poder havia se comprometido na campanha eleitoral de 2018. No ano passado, mobilizou o Congresso Nacional e, não sem dificuldade, concluiu a reforma da Previdência. O Palácio do Planalto almejava voos ainda mais altos para 2020, com a aprovação de não uma, mas duas grandes reformas - a tributária e a administrativa.
A pandemia da Covid-19 pôs em suspenso, retardou ou mesmo pôs fim a planos de pessoas e instituições. Não houve tempo para se pensar no que fazer com tantos projetos, mesmo que as nuvens carregadas se anunciassem desde o começo do ano. Sobrevoaram a Ásia, chegaram à Europa e, enfim, ao continente americano. O ineditismo da situação levou a uma espécie de vertigem, no qual mesmo as instituições tiveram dificuldade de reconhecer o tamanho do desafio.
As duas reformas acalentadas pela equipe do presidente Jair Bolsonaro, obviamente, não figuram na categoria dos planos abandonados. Ainda que as propostas gestadas tivessem uma linha condizente com o fazer político do grupo mandatário, o certo é que ambas já figuram, há tempos, entre os nós a serem desatados pelo País. A discordância existente é quanto ao modo de fazê-las, não do mérito de promovê-las.
Suspensas, as reformas não encontrarão espaço enquanto o Brasil tiver temas mais urgentes a serem tratados. E o enfrentamento ao novo coronavírus é uma pauta totalizante. De fato, a pandemia e suas consequências se negam a uma apreensão fácil. Não há uma resposta única a ser dada. O cenário exige acompanhamento permanente. Dos três poderes, em especial do Executivo e do Legislativo, tem se exigido decisões e ações rápidas, tendo em vista não apenas a calamidade presente, como as futuras que se avizinham.
O processo deste anseio reformista será, inevitavelmente, retardado. Não incidirá sobre ele apenas o "atraso" destes meses de exceção. Sobre os planos de reformas recairá, ainda, uma realidade nova, com obstáculos ainda imprevistos a serem superados. A Política e a Economia são dois campos cujas ações, em princípio, não são guiadas por "achismos". Se avançam e buscam construir o futuro, o fazem observando tendências e, com método, buscando sinais para antecipá-las. A crise que o mundo vive, contudo, não constaria nas variáveis dos analistas.
Há de se tirar lições dos infortúnios - é a forma de se ganhar alto, em meio a tantas perdas. Se a pandemia levará o País para um outro cenário, ainda imprevisível, não se chegará a ele apenas com incertezas. Pessoas e instituições têm sido postas à prova na busca por uma forma de viver e operarem, respectivamente, em tempos de pandemia. Nesse exercício, têm se confrontado com obstáculos que há muito deveriam ter sido removidos; ajustes que não foram feitos, e que já eram necessários, cobram um preço ainda mais alto no momento; e também se reavaliando a importância de certos elementos. As reformas que o Brasil um dia fará precisam incorporar as lições duras e contundentes da crise, para o bem maior de todos.