Editorial: Danos e impunidade

Não pode ser acomodado no rol das banalidades o retardo de edital da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão subordinado ao Ministério da Educação, para apuração técnico-científica de um dos maiores desastres ambientais já registrados no hemisfério Sul, o derramamento de óleo na costa do Nordeste brasileiro - o que desde agosto último se registra, em episódios que alcançam o Ceará de forma extrema e penosamente onerosa para a natureza e para a economia, compreendendo desde os empreendimentos hoteleiros e a pesca a pequenas atividades comunitárias.

Noticiou-se, nesta semana, que a Capes, instituição federal à qual coube responsabilidade para analisar causas e efeitos do problema, operacionalizou edital no valor de R$ 1,3 milhão para selecionar propostas de trabalho. Além de o tempo ter sido relativamente curto para inclusão de projetos, a data predefinida para divulgação de resultado, 18 de dezembro, não foi seguida e até agora não se sabe quando serão conhecidos os aprovados.

Mais ainda: o valor pouco supera a metade do que Pernambuco disponibilizou para iniciativa semelhante. O Estado vizinho reservou verba de R$ 2,5 milhões.

A gravidade dos vazamentos ocorridos já foi tema de diferentes abordagens e preocupa por dois aspectos, principalmente. Primeiro, pelos graves e irreversíveis danos que causou, está causando e por certo ainda vai causar. Depois, pelo acentuado risco de impunidade. O Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da Universidade Federal do Ceará, definiu o caso em artigos internacionais como "mais severo desastre ambiental em oceanos tropicais".

Inicialmente, o Governo Federal chegou a atribuir a um navio grego a culpa pelo despejo de um conteúdo de petróleo que, segundo as fontes oficiais aventaram na época, seria venezuelano. A empresa proprietária de pronto negou envolvimento. E, apesar do estardalhaço e das especulações, por enquanto, nada se concluiu, com base em análises técnicas. O Brasil, igualmente lento em medidas internas para o caso, não cobrou reparações nem punições nas cortes internacionais. Ficou, como se fala, o dito pelo não dito.

O artigo 23 da Constituição Federal diz que "é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (...) proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas", assim como, conforme o artigo 24, "compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre (...) responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico". A Carta Magna estabelece tais responsabilidades aos entes públicos, para que tema da maior importância não seja relegado ao descaso.

Isso destacado, é imperativo que venha à tona a explicação para o caso, com desejável (e, em verdade, necessária) responsabilização de seus autores. Os vazamentos, e a imagem negativa que trouxeram ao litoral do Nordeste, afetaram aspectos vitais para o cidadão em proporções ainda não dimensionadas. Cabe às autoridades, sem mais demora, a solução deste mistério e a afirmação do compromisso do País com o meio ambiente e com o rigor das leis.