A transposição e o Ceará

As águas do Rio São Francisco oficialmente chegaram ao Ceará.

O ato que determinou a concretização da obra foi dado pelo presidente da República próximo à divisa com Pernambuco, do lado de lá, do distrito de Milagres, em Verdejante (PE). Dali foi liberado o fluxo hídrico que, percorridos poucos quilômetros, adentrou o território cearense em direção à barragem de Jati, na região do Cariri. Do lado de cá, a cerimônia inaugural se deu em Penaforte, às margens da obra que trouxe os recursos hídricos do leito do Velho Chico. O evento marcou, também, a primeira visita do presidente da República, Jair Bolsonaro, ao Estado, e contou com a presença de uma comitiva de ministros, dentre outras autoridades.

Por mais de uma década, a transposição esteve suspensa no horizonte da esperança de quem vê nela a garantia de maior segurança hídrica para todo o Ceará. Numa região assolada por secas periódicas, quando ainda está bem viva a memória da temporada de seis longos anos de estiagem, vividos na última década, a notícia é animadora. É promessa que, se concretizada, pode mudar o cotidiano daqueles que vivem do que plantam e do agronegócio local.

A obra, iniciada em 2007, atravessou gestões de perfis diversos e seguiu não sem interrupções. Foi retardada por sequenciados atrasos e prorrogações de prazos. Estava em curso, quando o Ceará enfrentava uma temporada extensa de seca e necessitava de água para garantir a subsistência de famílias e a continuidade dos negócios que geram riqueza do solo. Os investimentos na obra passam de R$ 10 bilhões. A previsão inicial era que seriam necessários cinco anos para a conclusão dos trabalhos - uma construção que atravessaria 477 quilômetros em obras, reunidas em dois grandes canais para abastecer açudes e rios que, nos períodos de seca, entram em colapso em quatro estados da região Nordeste: Ceará, em Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte

No início, encontrou críticos e resistência, de um lado, e apoio e entusiasmo, de outro. Após ser iniciada, não poderia mais ser parada, dado seu significado para os estados beneficiados. Tornou-se pauta permanente das bancadas nordestinas, que insistentemente cobraram a garantia de recursos, a continuidade dos trabalhos e a pronta conclusão da obra.

O Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (Pisf) concretizou uma ideia antiga, anterior mesmo à capacidade técnica de executá-la. Foi ainda no século XIX, quando o Brasil vivia sob o regime do Segundo Império que se concebeu um plano de águas de um leito marcado pela bonança para terras que viviam sob o signo da seca. A transposição daquele que é um dos mais importantes cursos d'água da América do Sul para solucionar o problema histórico e permanente da escassez hídrica causada pela seca no Nordeste.

Um importante passo foi dado. Para que os avanços prometidos se realizem é fundamental que o Cinturão das Águas, outra obra monumental, em geografia cearense, seja concluído e leve a água às regiões mais necessitadas. Só com ações e trabalhos articulados farão os problemas históricos legados pelas secas que assolam o Nordeste se tornarem matéria do passado.


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