O índice de analfabetismo caiu 18,2% entre 2010 e 2022. Isso representa 2,5 milhões de pessoas a menos nessa condição, segundo os dados do Censo Demográfico 2022, um serviço do IBGE.
É um avanço, mas ainda podemos ir mais longe, não é, Maria Felícia? Maria e outros 11,4 milhões de brasileiros sabem mais do que ninguém do que estamos tratando.
“É como se você tivesse uma venda nos olhos. Você não vê nada”, Maria, 69 anos, empregada doméstica cearense, nos responde, aqui em aspas tiradas de reportagem de Gabriela Custódio, neste Diário do Nordeste.
“Brasil, país do Paulo Freire, tem 11 milhões de analfabetos”, salta o sociólogo paulista Emir Sader, em um assombro pedagógico, num post nas redes sociais.
Entre o ensaio sobre a cegueira, na visão de Maria, e o susto de Emir, há um chamado de urgência ao poder público, valendo para presidente, governadores e prefeitos. Valendo para todo e qualquer político. Executivo, Legislativo, Judiciário... Autoridades civis, militares e eclesiásticas, como diria o cerimonioso locutor oficial dos palácios e palacetes.
Bem sabemos dos planos arrojados do ministro Camilo Santana e de Izolda Cela, secretária- executiva do MEC, para alfabetização de pessoas de todas as idades. O espanto diante dos 11,4 milhões, porém, nos motiva para um desafio nacional urgente: vamos zerar o número de analfabetos? — ou chegar perto disso.
Seria um feito histórico. Repare que o Chile (4%) e Argentina (3%) estão bem melhores, apesar de economias menos poderosas.
Mire-se no exemplo de Angicos, Brasil, no sertão do Rio Grande do Norte. Foi lá que uma equipe do professor Paulo Freire comandou, em 1963, uma experiência capaz de alfabetizar 300 trabalhadores em apenas 40 horas de aulas.
Angicos foi uma prova prática para mostrar que o método do educador pernambucano, a partir da consciência das palavras, funciona. E rápido. Na época, o índice de analfabetismo era de 40%.
Um plano de alfabetização nacional, comandado por Freire, estava pronto para ser adotado em 1964. Para infelicidade dos brasileiros, veio o golpe e os generais da Ditadura Militar rasgaram as cartilhas e prenderam o “perigoso” mestre.
É hora de jornadas de Angicos no Brasil inteiro. Para ajudar Maria Felícia, filha de Crateús, a tirar a venda que a separa do entendimento da palavra escrita.
Para ir além do coraçãozinho do zap, para viver momentos como este, de uma antiga cantiga popular interpretada por Fagner, no disco “Manera Fru Fru, Manera”:
“A minha amada me mandou um bilhetinho
Só pra ver se eu conhecia a letra dela
A letra dela já era conhecida
Ela me amava, eu também amava ela”.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.
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