O debate, em mais um dia normal de treta e funaré nas redes sociais, começara com um certo climão de seriedade. Coisa de corte superiora, alto nível. Discutia-se a peleja entre os ministros Gilmar Mendes e André Mendonça, ambos do STF.
O católico Mendes havia falado da existência de “narcomilícias evangélicas”; Mendonça, pastor da Igreja Presbiteriana Esperança de Brasília, rebateu a expressão: “Grave, discriminatória e preconceituosa”.
Nada como um post atrás do outro para que o tema descambe para o escárnio e a fuleragem — a filosofia cearense por excelência. O tema religioso levou o advogado paulista Welington Arruda a lembrar da queixa trabalhista de um autointitulado “caidor”, um “profissional” mantido por algumas igrejas neopentecostais para cair e estrebuchar nos templos.
O objetivo desse novo ofício seria simular, como um ator, a presença do diabo no corpo. O “possuído” é uma das trapaças mais eficientes para atrair público e converter novos fiéis.
Sofrer reclamações de trabalhadores na Justiça não é monopólio de denominações evangélicas, é bom que se diga. Existem, óbvio, inúmeros processos contra as cúpulas católicas — para ficar apenas nas duas correntes religiosas mais populares no país.
O curioso nessa história é a nova profissão em si. Será arte? Só pode. Envolve o domínio do drama. A munganga pela sobrevivência também guarda algo singelo de um Pedro Malasartes ou de João Grilo, o personagem do cordelista paraibano João Martins de Athayde que Ariano Suassuna adaptou para o teatro.
Essa literatura picaresca é muito rica na Espanha (Lazarilho de Thormes é o Chicó deles) e no Nordeste brasileiro. Um sujeito que finge receber o Coisa-Ruim, como meio de vida, é extremamente literário. Não entro no mérito moral, por enquanto, fico na observação desses anti-heróis das virações para ganhar a vida.
Captei. Agora recordo. A primeira vez que li sobre a novíssima função foi em um ótimo texto de Jeritza Gurgel, minha colega colunista deste “DN”, ainda em 2021. Ela havia testemunhado o caso no Fórum Autran Nunes, no centro de Fortaleza. Vale a pena ler de novo.
Fico por aqui, até a próxima. E, como diria um bom “caidor”, xô satanás.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.
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