O debate aberto entre artistas nas redes sociais sobre política mostrou, nesta semana, que, mesmo para os olimpianos, os ídolos, os aparentemente inalcançáveis, o muro está estreito para se equilibrar.
Enquanto reuniões da CPI da Covid no Senado, sessões do Supremo Tribunal Federal (STF), transmitidas ao vivo - para citar dois exemplos -, atraem milhares de olhares curiosos por saber o que dizem, como atuam as figuras públicas que têm por dever servir o povo brasileiro, por que tanta gente parece estar interessada também em ouvir o que tem a dizer Juliana Paes?
Sim, neste caso, uma coisa tem tudo a ver com a outra.
De onde parte a resposta
A reconhecida atriz com quase 30 milhões de seguidores no Instagram respondeu, em um vídeo, a uma colega que lhe apontou covardia.
Foi uma resposta às críticas pela “escolha de não militar publicamente escolhendo um dos lados políticos nesse debate público”, após ter saído em defesa da médica Nise Yamaguchi, que foi acusada na CPI da Covid de promover divulgação de suposto "tratamento precoce", sem eficácia comprovada contra a doença.
Ela se manifestou contra a forma como senadores se dirigiram à médica durante o depoimento.
Juliana rejeitou qualquer rótulo de omissão, deixou claras algumas de suas opiniões (como o desejo de “um governo liberal que respeite as liberdades individuais”), mas disse estar inserida, assim como outros brasileiros, em um ambiente no qual não se sente representada por ninguém.
Nisso ela tem razão. Quem não conhece alguém que nutra desconfiança pela classe política? Muitas vezes, esta é, aliás, a justificativa usada por anônimos e famosos para se omitir.
Mas apesar da semelhança, a atriz tem diante de si um fosso de diferenças que lhe afastam da grande maioria do povo. Fala de um lugar de privilégios. De um lugar, portanto, onde não chegam – ou pouco chegam – mazelas sociais. Muitas ainda mais escancaradas nesta crise sanitária.
Para todos
No alto de suas bolhas, algumas figuras públicas parecem esquecer que a própria origem da palavra política está associada à vida em coletividade. Não é para os seus; é para todos. Ela está presente não só em como algo me afeta, mas em como chega ao outro. Um “outro” que tem cara, nome, voz.
Por que, então, muita gente quer saber o que Juliana Paes tem a dizer?
Quem influencia ocupa uma posição de poder, o que exige responsabilidade. Espera-se posicionamento. Não à toa, influencers, artistas, atletas têm sido cobrados enquanto insistem em forjar realidades paralelas. Ninguém vive no Brasil das novelas.
São quase 500 mil mortos pela Covid-19. Desemprego e fome. A realidade exige uma boa dose de realismo. A lógica vale para as escolhas políticas também.
Se a omissão é inaceitável, o ativismo limitado às pautas que geram engajamento nas redes sociais da vez é insuficiente.
É importante, mas também um tanto cômodo, sendo famoso, se posicionar por mais vacinas, pela preservação da Amazônia, pela saúde mental dos brasileiros - de forma ampla e só. Assim como criticar “esses” ou “aqueles” políticos, num distanciamento pasteurizado, sem identidade.
Tudo é político. Isso não era para ser apenas um clichê.