O fracasso da cédula de R$ 200 no país onde as pessoas brigam por ossos

Com custo alto, nova nota foi criada com justificativa de demanda maior por dinheiro. Mais de um ano depois, projeto é um fracasso

Legenda: Ceará possui cerca de 1,47 milhão de notas de R$ 200 em circulação
Foto: Banco Central

Alguém viu a célula de R$ 200 por aí? Pouco mais de um ano depois do início da circulação da nova nota, talvez sejam maiores as probabilidades de esbarrar com um dragão-de-komodo nas ruas de Fortaleza do que passar a mão no dinheiro do lobo-guará.

Mesmo sob uma enxurrada de críticas de especialistas, a cédula foi criada pelo governo federal em 2020, com a justificativa de dar vazão à crescente demanda por papel-moeda no contexto da liberação de auxílios excepcionais durante a pandemia.

Veja também

Se na época que antecedeu a concepção da nota, esta já era rejeitada na sociedade civil por ser uma medida notadamente cara e inócua — bem como recebeu reprimendas de entidades especializadas no combate à corrupção pelas facilitações que criaria em relação a desvio de dinheiro e pagamento de propinas em espécie —, agora, com o Brasil assolado pelo aumento da pobreza e miséria, o fracasso desse projeto é tão gritante quanto grotesco.

Dinheiro em espécie ainda é forte

Um parêntese: nas classes média e alta, é comum se ouvir a seguinte pergunta: 'quem é que ainda usa dinheiro em espécie hoje em dia?'. Trata-se de uma percepção de bolha.

Apesar de ser inconteste o aumento das transações digitais, sobretudo com a chegada do PIX, o dinheiro em espécie ainda é a opção favorita de 53% dos brasileiros, conforme estudo da Fundação Dom Cabral.

Principalmente nas faixas de renda mais baixas, nas quais a desbancarização e exclusão digital são naturalmente mais elevadas, o dinheiro vivo continua sendo o principal elo com a economia.

Custo alto e efeito zero

Mas o custo para produzir a cédula de R$ 200 foi exorbitante (acima de R$ 140 milhões), o que é passível de escrutínio principalmente no momento de arrocho fiscal pandêmico.

Somente a campanha de publicidade da nota custou à União R$ 18,8 milhões, menos do que os anúncios de incentivo à prevenção contra Covid-19, que custaram R$ 14,4 milhões.

Com a redução do auxílio emergencial — que, em 2020 chegava a pagar R$ 1.200 na maior faixa e caiu para, no máximo, R$ 350 — e a deterioração da economia, ter investido valor tão alto na criação de uma cédula neste valor chega a ser um insulto a quem peregrina as ruas em busca de uma moeda que seja.

Um país cuja população se amontoa em volta de ossos e carcaças para ter algum resquício de proteína na mesa não precisa de cédula de R$ 200, nem mesmo com a inflação galopante, o enfraquecimento do real e o derretimento no poder de compra da população.

Precisa, em verdade, de uma economia capaz de gerar mais oportunidades.



Assuntos Relacionados