Solidão, temida ou incompreendida?

Legenda: Conforme especialista ouvida pela reportagem, a solidão é um sentimento que é reflexo de isolamento social, estigma, depressão grave que causa sofrimento significativo e que pode exacerbar nessa época do ano em que tradicionalmente as famílias se reúnem.
Foto: Pexels

A quem diga que a solidão é ruim. Outros sustentam que ela boa e necessária. Pode ser que as duas possibilidades sejam verdadeiras. 

Você já se sentiu sozinho? Em que momento da sua vida isso aconteceu? Qual a emoção que surge quando rememora essas situações? 

À primeira vista, quando falamos de solidão, parece vir um desconforto. Como se a falta de outrem anunciasse uma falta de algo dentro de nós. O que lhe falta? 

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A solidão pode aparecer em diversas situações. 

Existem aqueles que buscam um grupo para além de não ficarem sós, juntam-se para darem força uns aos outros e assim conseguirem realizar os seus objetivos. Pode ser uma prática esportiva, um clube de leitura, de dança, um grupo religioso. Enfim, além do objetivo específico de cada grupo, a interação social surge como fonte de motivação e atração para se juntar. 

A solidão pode revelar a dificuldade de se relacionar. Inseguros, por medo de sofrer, de ser abandonado; abandonam. Renunciam à possibilidade de construir vínculos mais profundos através da entrega a um relacionamento, fechando-se e esperando ser convencido a confiar e se dedicar.

Portanto, por medo de ser abandonado e ficar só, acabam inconscientemente construindo a solidão que temiam. 

Segundo o filósofo João Francisco P. Cabral, Aristóteles defendia que o homem é um ser que necessita de coisas e dos outros, sendo, por isso, um ser carente e imperfeito, buscando a comunidade para alcançar a completude. 

Existem aqueles que passam pela solidão a dois. Casais que não têm sintonia, não têm afinidades, não têm sexualidade, não têm afetuosidade e têm muita dificuldade em aceitar as diferenças.  Quantos casais não vivem assim? Solitários na companhia constante um do outro(a). Que “precisam” dos smartphones para ocupar o vazio do abismo que os separa. 

No dizer de Graciliano Ramos: “O isolamento em companhia de uma pessoa era mais opressivo que a solidão completa”.  

Para Fernando Pessoa, a solidão é a condição inevitável do ser humano. Noutro trecho de sua poesia, assim diz: “E se sinto, quando estou verdadeiramente só, sinto-me livre, mas triste”. 

Cabe a cada um se perguntar o que busca na companhia dos outros. Para alguns, a necessidade do outro surge do anseio de completar-se na relação, completando o que lhe falta. Grande armadilha. 

Embora seja mais comum falarmos da solidão como a falta do outro, precisamos também evocar a solidão oriunda da falta que sentimos de nós próprios, quando nos abandonamos e priorizamos os outros, à medida que não investimos em nós mesmos, no autoconhecimento, nos nossos projetos e sonhos; quando não assumimos a responsabilidade em nos cuidar e, ilusoriamente, a terceirizamos. 

Por nos esquecermos de nós, damos ao outro e a sua “falta”, uma dimensão acima do real. Desnutridos de nós mesmos, ficamos mais fracos e frágeis, amedrontados com a possibilidade de ficarmos sozinhos.  

Se precisamos dos outros, precisamos muito mais de nós.  

Todos passaremos por desertos onde teremos somente a nossa companhia. 

Precisamos incluir, no nosso dia a dia, momentos de silêncio onde possamos escutar nossas necessidades mais genuínas. 

Precisamos cultivar momentos de imersão em nosso mundo interno, contemplação, meditação e oração.   

Quanto mais e melhor cuidarmos de nós, sentiremos alegria e prazer estando sozinhos, não temendo a solidão. E naturalmente atrairemos pessoas interessantes, que agreguem. Não para nos salvarem, pois ninguém salva ninguém, mas para compartilhar e construir conosco momentos felizes.  

Paz e bem! 

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.