Quem me acompanha, sabe que sou um grande entusiasta das redes sociais. Estou em praticamente todas elas, seja produzindo conteúdo, expondo minha vida particular, trabalhando e, principalmente, atento a tudo que escrevem sobre o meu trabalho, tanto por meio da crítica especializada ou através do público que gosta de interagir com suas opiniões, por vezes, adoráveis, noutras, nem tanto.
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Recentemente, fui abordado nessas plataformas, principalmente no Twitter, por conta da nova fase da minha personagem Zaquieu, de Pantanal. O ex-mordomo, ao voltar para a fazenda de José Leôncio, decide se tornar peão e lutar por aceitação nesse meio, trazendo mais uma discussão social dentro da trama: o lugar do gay no mercado de trabalho.
Muitas pessoas comentaram sobre o assunto criticando o novo peão e outras elogiando a tentativa de Zaquieu de descaracterizar clichês e provar que seu lugar não precisa ser, necessariamente, dentro de um salão de beleza, uma cozinha ou qualquer outro serviço que a nossa sociedade machista teima em taxar como feminino. Pode parecer algo pequeno para algumas pessoas, mas isso nunca foi discutido abertamente dessa forma na TV.
Outro ponto intensivamente comentado e criticado tem sido o fato de Zaquieu, repetidamente, precisar esclarecer questões sobre sua sexualidade no meio da peonada. A sequência de cenas, por vezes enaltecida por alguns internautas, também gera inquietação no fato de muitas delas serem explicativas, didáticas, e eu acredito que falta talvez uma visão mais ampla do poder educativo da TV na grande massa.
Para nós, artistas e criadores, também é preocupante a forma como chegamos no espectador, porque queremos ser canais de envolvimento. Quando recebemos uma cena extremamente didática, primeiramente, tentamos compreender e estudar a sua importância. Em seguida, tentamos “amolecer” o diálogo, não deixar tão duro, seco ou professoral. Nosso objetivo é fazer o diálogo fluir da maneira mais natural possível e com isso causar emoções em quem assiste, causar catarse.
Na Psicologia, a catarse é o caminho pelo qual limpamos as emoções negativas que carregamos e conseguir fazer sua tristeza e raiva desobstruirem os caminhos da plenitude, tal qual um abrir de janelas de um cômodo antigo pra que entre luz, pra que aquele ambiente se torne um pouco mais saudável.
Na Arte, vem desde o teatro grego como uma purificação do espírito do espectador através da purgação de suas paixões, expulsando os sentimentos de terror ou de piedade vivenciados na contemplação do espetáculo trágico.
No Teatro, Bertold Brecht estabelecia regras no objetivo de utilizar o teatro, para além do divertimento, como possibilidade de transformação do espectador, que nunca deveria ficar passivo diante do que via.
Foi nesse ponto que me senti fisgado pela arte, pelo teatro, pelo desejo de ser ator. Sempre fiz questão de que meus trabalhos tivessem um ato didático, de ensinamento, mas sem ser meramente prático/teórico, sem fazer o espectador perder o interesse pelo entretenimento teatral, pela magia.
Quando iniciei meu trabalho no audiovisual, nunca pensei em trilhar um caminho diferente. Sempre optei por continuar sendo fiel aos meus desejos de artista inquieto, questionador, provocador.
Novela significa narrar um acontecimento, real ou imaginário e são a paixão nacional, justamente, porque abordam temáticas essenciais da nossa sociedade, polêmicas e tabus, transmitindo uma mensagem que pode se tornar tema de debate e de reflexão pelos espectadores a partir de novas perspectivas.
Sabe por que uma novela é dividida por capítulos onde, muitas vezes, a “mesma história” é repetida? É que além dos espectadores cativos, muitos não conseguem acompanhar assiduamente, por diversos motivos. Então, essa repetição de assunto se torna necessária para que o público compreenda, absorva e reflita o fio condutor da trama.
Essa característica está na própria natureza do sistema de educação, onde aprender exige repetição, tentativas, como no ditado “tanto bate até que fura”. Você, certamente, aprendeu o alfabeto repetindo as letras; aprendeu a falar, repetindo as palavras; aprendeu a andar repetindo os pequenos passinhos.
Aprender sobre um assunto também exige repetição e temas como os que Zaquieu leva a milhões de casas brasileiras precisam mesmo de repetições, de esmiuçamento, de martelar nas cabeças até furar, para que a transformação atravesse a ficção e se torne real, para talvez ser “tanto bate até que educa”.
Não se enganem com novelas. Não são e nunca foram meramente entretenimento. Não há arte sem política, não há arte sem educação, não há arte sem transformação. Nem sempre a arte será tão subjetiva, nem sempre a arte será subliminar. Muitas vezes, talvez na maioria delas, a arte vai dizer a que veio claramente, didaticamente, educativamente. Mais importante do a forma que um trabalho artístico está sendo realizado é a consequência dele na sociedade.
* Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor