No arraiá da Covid, quero ver quadrilha presa

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Mês de junho é período de colheita, de fartura, de complemento de renda, de sorriso no rosto e, acima de tudo, de fé e gratidão. É quando o sertanejo explode em felicidade e celebra as bênçãos de São João, São Pedro e Santo Antônio, nesse ritual bonito de danças ao redor da fogueira, de oferendas com comidas típicas, de simpatias de amor e de conexão entre corpo, alma e religião.

Todo nordestino tem uma história sobre festa junina para contar. As lembranças tem o sabor do nosso “pratim”, tem o som do triângulo, da sanfona e da zabumba, tem o gosto do beijo roubado na paquera, tem o suor das mãos entrelaçadas com as do seu par na quadrilha e até o gosto amargo da ressaca de pinga no outro dia. Ô saudade!

São dois anos consecutivos sem o verdadeiro espetáculo do sertão e, se você é nordestino, posso garantir que seu coração anda saudoso também. Mas posso ser sincero?

Saudade mesmo eu tenho é de ver meu povo com saúde e feliz, independente da época do ano, porque não tem festa junina, carnaval ou réveillon que tire a tristeza, a indignação, a raiva e o peso de 500 mil mortos por uma doença que já tem vacina.

No Arraiá da Covid, é o Governo da Morte quem anda fazendo a festa. Tem de tudo! Barracas do negacionismo, da ignorância, da corrupção, da cloroquina, da falta de compromisso com a saúde pública; fogueira para queimar provas, prêmios no bingo para quem ler menos e-mails de oferta de vacinas, casamento matuto de pastores e políticos, quadrilha de milicianos dançando solta por aí e, no lugar do arrasta pé, inúmeras mãos arrastando o nosso dinheiro.

É cansativo pensar sobre tudo isso, eu sei, e é exatamente isso que querem de nós: apatia, desânimo e tristeza para nos imobilizar, para que paremos de lutar. Mas se você é um bom matuto como eu, sabe bem que sertanejo não foge da luta, nem arrega da vitória. Portanto, mantenha a sua fogueira da responsabilidade acesa, cuide de si e dos outros, vista-se de máscaras de proteção (elas combinam com chapéu de palha e roupa xadrez também), sossegue o facho em casa e não vá a festas clandestinas.

Ano que vem, com fé em São João Batista, a gente explode em brilho, colore o céu de bandeirolas, dança colado o forró dos vacinados e se esbalda em milho cozido, mungunzá e pamonha, festa e religião, fartura e colheita. Em 2021, não. Cuide-se! Vacine-se!

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.