Beato Zé Lourenço venceu o racismo e o elitismo brasileiros

Ele inaugurou uma forma de convivência coletiva, que pode ser considerada a primeira experiência de reforma agrária de cunho popular no Brasil

Legenda: José Lourenço Gomes da Silva, o beato, que nasceu há 150 anos, está finalmente tendo o reconhecimento merecido
Foto: Acervo Jackson Bantim

Quando se analisa a liderança nas organizações públicas e privadas do Brasil, poucos são os negros ocupando cargos de destaque, de decisão. Neste fim de ano, inclusive, testemunha-se essa que parece ser uma herança do racismo estrutural à brasileira. 

No momento em que se constitui um novo governo, vê-se um desfile de homens brancos e heterossexuais, com raras exceções, o que demonstra que o discurso de diversidade feito em forma de crítica contra o governo que se encerra pode ter sido só discurso mesmo. 

Pois bem. Lideranças pretas e pardas neste país sempre houve e sempre haverá, por mais que isso ainda não se reflita na elite da nação com o maior número de seres humanos negros fora da África. 

Esse prólogo foi necessário para que se tenha uma noção real da vitória que é a transformação do Caldeirão do Beato Zé Lourenço num parque estadual pela governadora do Ceará, Izolda Cela.

Foto: Acervo Jackson Bantim

José Lourenço Gomes da Silva, o beato, que nasceu há 150 anos, está finalmente tendo o reconhecimento merecido. Infelizmente, após a morte, ocorrida depois de sofrer com a força física e psicológica do Estado, que, como defensor da elite do momento, esmagou a experiência comunitária do Caldeirão.

Como este mesmo colunista já trouxe aqui nestas linhas, o beato inaugurou uma forma de convivência coletiva, que pode ser considerada a primeira experiência de reforma agrária de cunho popular no Brasil, como bem explica o professor Domingos Sávio de Almeida Cordeiro, autor de "Um beato líder: narrativas memoráveis do Caldeirão".

Conforme o pesquisador Edmar Pinheiro, da URCA, esse patrimônio histórico do Caldeirão é tão importante quanto a questão ambiental quando se analisa a importância da preservação.

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Agora, demarcado em forma de parque estadual, o espaço vai ter uma administração profissional e pública. Espera-se que, entre os seus administradores, estejam pardos e pretos. 

Que o Parque Estadual do Caldeirão faça jus à contribuição do beato e seja exemplo da representativade da sociedade plural que realmente compõe o povo brasileiro. Do contrário, ficar-se-á novamente apenas no discurso.