Longe de mim querer falar na maioria do meu tempo sobre maternidade. Não porque eu não gosto, mas falar de maternidade é polêmico. As pessoas sempre tem uma opinião pra dar. É como se tivesse custado muito a aprender sobre algo e quisessem passar a todo custo ou ainda como se as pessoas tivessem que injetar algo de qualquer maneira.
Então, hoje não venho falar sobre a maternidade em si, mas do cordão umbilical que não é cortado depois que parimos. Lembro da minha primeira saída depois que a Manuela nasceu. Deixei ela com os avós e o pai e fui a pé pra praia. O fone altíssimo nos ouvidos pra ver se eu conseguia silenciar o desespero que eu estava de ter feito esse corte imaginário, pelo menos temporariamente, por vinte minutos.
Eu sofria, sofria que chorava de dar soluços, como se eu tivesse escolhido cortar esse cordão. “Desnaturada”, eu pensava. “Pra que sair, Mila?”. Pra tanta coisa, Mila.
Foi bom, voltei pra casa morrendo de saudade. Ainda sem entender muito bem porque fui. Foi mais por impulso, um estímulo de lembrar quem eu era como indivíduo antes da maternidade. Fui porque estava querendo cuidar da gaveta Mila.
Sempre fiz essa analogia que somos como uma cômoda e cada gaveta representa um setor da nossa vida. Hoje tenho a gaveta casamento, Manuela, trabalho e a gaveta Mila indivíduo.
Confesso que essa última anda empoeirada e vazia depois que engravidei. Esse fato não me deixa triste, no momento.
Sei que a vida é isso: um eterno equilibrar os pratos, tentar deixar as gavetas proporcionais. Nem sempre dá, nem sempre é o momento e em algumas épocas, alguma gaveta vai ser a primeira a ser aberta, outras ficarão em segundo plano com menos coisas e importância. Mas uma hora, eu precisava abrir, nem que fosse por vinte minutos.
Cada coisa, de fato, tem seu momento e seu tempo e pensar assim tirou uma parte muito grande de uma possível angústia no pós parto. Eu tinha sempre em mente que ia passar, que era fase, que é normal não estar ok toda hora, que um bebê não sabe que mundo é esse e está aprendendo, que é parte do pacote.
Mas a gente precisa deixar essa felicidade individual entrar de alguma forma, no começo, pelos buraquinhos, naquela hora em que o bebê dorme ou quando a gente consegue “fugir” pra um lugar só nosso – seja física ou mentalmente.
Enquanto termino de escrever e anotar na minha agenda os planos de voltar pro esporte que mais amo, a natação – um amor que não veio com o casamento, nem com a maternidade, é algo só meu, construído por mim - a Manuela tá acordando.
Ela é minha primeira gaveta, provavelmente sempre será (que bom), mas hoje, enquanto escrevia meus planos, deixei minha gaveta, aquela meio abandonada, aberta e cuidada.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora.