Atuação de PP e PL no Ceará mostra o risco de traição no casamento entre Bolsonaro e centrão

A razão do poder dos partidos de centro é a capacidade de se atrelar a poderes locais para crescer. Bolsonaro quer o partido ao qual vai se filiar longe da esquerda

Legenda: Jair Bolsonaro chegou a negociar com o PP, de Ciro Nogueira, mas aprofundou conversas com o PL. A filiação, porém, não está confirmada
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

No último dia 2 de outubro, relatamos nesta coluna, a influência e o poder conquistado pelo chefe da Casa Civil do governo Bolsonaro, Ciro Nogueira, que tem familiares e aliados políticos no Ceará. O motivo da influência de Nogueira – e até a razão de ele estar ocupando atualmente o principal ministério do governo - é a capilaridade de sua liderança no Congresso Nacional e a natureza de seu partido político, o Progressistas, antigo PP. 

A legenda é uma das principais do chamado centrão que dá sustentação ao governo Bolsonaro no Congresso e fez o mesmo com Temer, Dilma, Lula, FHC e Collor, independentemente dos programas de governo e das ideologias. 

Neste hall se encontra também o PL, cuja atuação no Ceará se dá em total harmonia com o grupo governista local, adversário de Bolsonaro, que pode se filiar à legenda. 

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Trata-se de um ajuntamento de partidos com um volume considerável de parlamentares – a maior parte, de baixo clero – cujos líderes comandam as negociações no Legislativo e, com frequência, são convocados para cargos no Executivo e até para comporem chapas nas eleições para presidente.

Para estes partidos, quanto mais turbulências houver na relação entre Executivo e Legislativo, maior a dependência do presidente da República. Este grupo parlamentar volumoso e influente em Brasília não surge de graça. Ele advém da atuação pragmática de suas lideranças em relação ao espectro político nos estados.  

Se aliam a qualquer grupo que esteja no poder local, se beneficiam disso e geram uma influência capaz de deixar refém qualquer chefe de Executivo em Brasília. Geralmente, estes parlamentares podem apoiar qualquer governo, independentemente de que corrente integre, e é isso que faz sua força.

A estratégia de Bolsonaro de quebrar essa regra é de difícil execução e, por isso, o risco de traição e de problemas maiores é acentuado.

Lideranças locais

No Ceará, o PP é comandado pelo deputado federal AJ Albuquerque, filho do deputado estadual Zezinho Albuquerque, uma das lideranças do grupo governista local, próximo de Cid e Ciro Gomes.

Ciro Gomes em comício ao lado de Zezinho Albuquerque e AJ Albuquerque
Legenda: Zezinho Albuquerque é parceiro político antigo de Ciro Gomes e é um dos líderes do PP, junto com o filho e deputado federal AJ Albuquerque
Foto: Reprodução redes sociais

É graças a esta parceria que o PP mantém a segunda maior bancada na Assembleia Legislativa, com cinco deputados e um total de 10 prefeitos eleitos.

O PL, no mesmo rumo, é comandado pelo prefeito do Eusébio, Acilon Gonçalves, um político governista também experiente que tem um grupo de prefeitos aliados, inclusive o filho, e também com o apoio e a articulação do deputado federal Júnior Mano. 

Governador Camilo Santana ao lado de prefeitos do PL no Ceará
Legenda: Acilon Gonçalves (à esquerda), com os prefeitos de Aquiraz e Itaitinga, ambos aliados, ao lado do governador Camilo Santana
Foto: Reprodução redes sociais
 

Nos dois casos, os partidos mantêm parceria com o governo do Estado comandado pelo PT de Camilo Santana, e pelo PDT de Ciro Gomes. 

Uma das razões do destaque de ambas as legendas é a parceria com o poder local que ocorre no Ceará e se replica em boa parte dos estados brasileiros.  

A provável filiação de Bolsonaro a qualquer um dos dois, ao passo que poderá fortalecer o presidente no ano eleitoral, eleva à máxima potência o risco de traições, tendo em vista o desejo do presidente de controlar os rumos da legenda pela qual pretende se candidatar à reeleição. 

Não à toa, os debates ríspidos entre os envolvidos que estão sendo travados neste momento. Estar abraçado com o centrão nas eleições pode significar para Bolsonaro, uma oportunidade e um risco, a ser meticulosamente calculados.