Furto famélico: juíza solta homem que furtou carne para matar fome; entenda o excludente de ilicitude

O homem admitiu ser dependente químico e estava em situação de rua há quatro meses. Furto aconteceu em um supermercado em Novo Gama, no Interior de Goiás

Legenda: O homem detido por furtar peças de carne em um supermercado, foi solto após audiência de custódia
Foto: Kid Junior

Um homem em situação de rua, que havia sido preso por furtar peças de carne em um supermercado, foi solto neste sábado (27) após audiência de custódia, em Novo Gama, no Interior de Goiás. Na decisão de soltura, a juíza Marianna de Queiroz Gomes caracterizou o episódio como ‘furto famélico’, por se tratar de um furtar para matar a fome.

"Trata-se de caso nítido de furto famélico, diante de estado de necessidade presumida, evidenciado pelas circunstâncias do caso, o que enseja a aplicação do princípio da insignificância e a exclusão da tipicidade material da conduta. Nessa leitura do fato, não há crime, sendo medida adequada o relaxamento do flagrante”, explicou a magistrada.

O homem admitiu ser dependente químico e estava em situação de rua há quatro meses. As peças de carne totalizavam o valor de R$ 98,30.

Após ser parado por uma funcionária do supermercado, o suspeito devolveu uma das peças de forma voluntária. A segunda peça estava escondida nas calças dele e foi encontrada após revista. A polícia foi acionada e o homem foi preso em flagrante na sexta-feira (26), segundo informações do jornal O Popular.

"Não houve violência nem grave ameaça à pessoa. A coisa não devolvida foi uma peça de carne, valor aproximado de R$50. Trata-se de pessoa claramente dependente de drogas, devendo ser considerada doente, portanto, conforme Organização Mundial da Saúde. A situação de rua o torna pessoa hipervulnerável", decretou a juíza.

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O que é furto famélico e qual artigo trata do excludente de ilicitude 

O furto famélico ocorre quando alguém toma algo que pertença a outra pessoa, mas motivado por uma necessidade urgente e relevante. E isso não se aplica apenas ao furto de alimentos, mas também de medicamento ou qualquer outro item considerado imprescindível para sua sobrevivência, como roupas para evitar o frio, por exemplo.  

O crime de furto está tipificado no artigo 155 do Código Penal (CP). E, para ser assim considerado, a subtração do item deve ter ocorrido sem violência ou ameaça.

A pena é de um a quatro anos de prisão, além de multa, podendo aumentar conforme as circunstâncias que qualificam o crime. 
Contudo, o artigo 23 do CP diz que não há crime quando o agente pratica o fato em estado de necessidade (inciso I). É considerado em estado de necessidade "quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade”, diz o artigo 24.  

Ou seja, no furto famélico o agente que se encontra em estado de necessidade e pratica o furto para suprir essa necessidade (por exemplo, matar a fome), está amparado por um excludente de ilicitude. Então, não houve crime.