O Grupo Carrefour Brasil anunciou que adquiriu 4 mil bodycams (câmeras corporais) para uso de seus funcionários no País. Somente no Ceará, segundo a companhia, foram implementados mais de 100 equipamentos em todas as 13 lojas das bandeiras Atacadão e Sam’s Club no Estado.
O objetivo, ainda segundo a empresa, é "dar mais transparência para as interações entre colaboradores e clientes, pois com elas é possível acompanhar a aderência dos funcionários aos protocolos de atuação, sempre com respeito e priorizando a boa relação com todos”.
A medida, contudo, tem implicações na privacidade dos clientes e sobre os direitos trabalhistas dos fiscais de prevenção internos e seguranças externos que utilizarão esse recurso. Ao todo, o Carrefour investiu R$ 16 milhões nas câmeras e afirma que já registrou uma redução de 30% no número de incidentes nas primeiras 150 lojas que receberam os equipamentos.
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O advogado João Rafael Furtado, presidente da Comissão sobre a Lei Geral de Proteção de Dados (CLGPD) da OAB Ceará, explica que o princípio de proteção de dados pessoais registrados pelas bodycams é o mesmo aplicado às câmeras de segurança instaladas nas lojas, por exemplo.
Segundo ele, a LGPD protege todos os dados que podem identificar uma pessoa. “Quando pensamos em dados, sempre pensamos em CPF, número de telefone, e-mail. Mas também são dados o rosto da pessoa, a biometria, os olhos, a boca. Tudo isso serve para identificar as pessoas. Então, logicamente, a câmera também serve para identificar as pessoas e, de forma consequente, a Lei Geral Proteção de Dados protege isso”, explica.
Em regra, destaca Furtado, é preciso pedir permissão para coletar as informações do cliente. Com o uso de câmeras, entretanto, esse procedimento é muitas vezes inviável. É considerando isso que a lei prevê exceções.
"O estabelecimento pode alegar que o funcionário está usando a câmera para garantir a segurança. Então, consequentemente, não precisaria do consentimento do titular do dado”, afirma. Essa permissão, contudo, deve levar em conta a forma como esses dados serão tratados e posteriormente descartados.
Além disso, essas gravações devem ocorrer em local público. No caso, por exemplo, de um segurança entrar em um banheiro e filmar alguém, o profissional estaria cometendo uma ilegalidade por invadir a privacidade do cliente.
O uso de bodycams também tem implicações nos direitos dos empregados. Segundo o advogado Eduardo Pragmácio Filho, doutor em Direito do Trabalho pela PUC-SP, o Brasil não possui uma lei específica sobre o uso dessas câmeras. "Mas isso não impede o empregador de adotá-las no ambiente de trabalho, desde que tome alguns cuidados”, explica.
Segundo ele, “a empresa tem a prerrogativa de organizar sua atividade, da maneira mais adequada e que achar conveniente”.
Todavia, o empregador deve sempre levar em conta os chamados direitos de personalidade dos empregados, o que inclui nome, imagem e dados biométricos.
Assim, para que se utilizem as câmeras, seja no ambiente de trabalho, ou seja no próprio corpo do empregado, a empresa primeiro tem que ter um motivo relevante, como é o caso da segurança e, também, tem o dever de informar previamente os trabalhadores"
Além disso, acrescenta Pragmácio, o empregador, “tem o dever de manter o sigilo e o manejo sobre a coleta de tais dados de forma adequada”.
Esse procedimento pode ser feito de forma unilateral pela empresa, por meio de uma norma interna, ou por negociação coletiva, “o que, em alguma medida, tornaria mais democrática a regulação”, conclui.
A questão também envolve o Direito do Consumidor. Segundo o advogado André Souto, especialista na área, no caso de algum cliente se sentir lesado, “ele pode registrar uma reclamação junto à empresa, buscar a orientação legal de um advogado especializado em direito de consumidor ou direito de privacidade/imagem para entender as opções que possui e quais medidas judiciais podem ser tomadas”.
Além disso, orienta Souto, a pessoa que entender ter sido desrespeitadas em seus direitos “pode reportar para órgãos como o Procon ou a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que é responsável por fiscalizar a proteção de dados pessoais no brasil”.
Conforme o especialista, o uso de câmeras corporais levanta preocupações legítimas com relação à privacidade dos clientes e sobre o direito de imagem.
“É importante que a empresa esteja ciente dessas questões e tome medidas adequadas para proteger os direitos dos clientes, garantindo que as gravações sejam feitas de forma ética e legalmente responsável. Isso pode incluir a obtenção de consentimento dos clientes quando apropriado e o estabelecimento de políticas claras para o uso das bodycams, conclui.