Acreditem, pois é vero. Um empresário da indústria e da agropecuária instalou em sua fazenda, na Região Metropolitana de Fortaleza, um conjunto de placas fotovoltaicas que geram – por meio da insolação—energia elétrica suficiente para irrigar uma grande área ajardinada.
Ele cometeu, porém, um ato que, no entendimento do governo estadual cearense, feriu a Lei.
Pouco divulgada e, por isto mesmo, desconhecida de quase 100% da população cearense, essa legislação estabeleceu um tributo pelo uso da água, quer ela venha do subsolo, quer ela seja a oferecida pelos rios, pelos açudes ou pelas lagoas de quaisquer tamanhos.
As placas solares do sítio do empresário em tela ocupam não mais do que 10 metros quadrados, mas foram – “criminosamente”, segundo o entendimento das distintas autoridades – instaladas em uma plataforma flutuante fixada sobre o espelho d’água do minúsculo lago da propriedade.
Este é um caso que revela o apetite insaciável do Poder Público de criar e cobrar novos tributos do já castigado contribuinte.
Outro caso, este mais recente, está revoltando a população de mais de 3 milhões de habitantes desta bela cidade de Fortaleza, cujo governo municipal começou a cobrar uma denominada “taxa do lixo”, proposta pelo Executivo e aprovada – sabe Deus a que custo – pelo Poder Legislativo.
Esta coluna é analfabeta em questões do Direito, mas entende que, já existindo o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), a criação e a cobrança da “taxa do lixo” parecem significar dupla tributação.
Mas, como no Brasil as leis são elaboradas exatamente para provocar dúvidas e para permitir a frenética atividade advocatícia, a Procuradoria-Geral do Estado entrou no Tribunal de Justiça com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade da Lei 11.323/22, que criou a Taxa do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos de Fortaleza – o nome é longo e bonito.
Ontem, sexta-feira, último dia para o pagamento da primeira das nove prestações deste exercício de 2023 da “taxa do lixo”, o contribuinte fortalezense dividiu-se: uma parte pagou a parcela; outra parte optou pela desobediência civil e recusou o pagamento do que considera – como a considerou a PGE – inconstitucional.
De acordo com o que tradicionalmente se registra em casos semelhantes, acontecerá o seguinte: o Tribunal de Justiça deverá acolher o recurso do Ministério Público, o que levará a Prefeitura Municipal de Fortaleza, por meio de sua Procuradoria-Geral, a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), cujos ministros darão a palavra final.
Advogados ouvidos pela coluna disseram que “dificilmente” a Justiça emitirá sentença contra a Prefeitura.
Se o entendimento dos ministros do STF for favorável ao interesse da PMF, quem deixou de pagar ontem a primeira parcela da “taxa do lixo” terá de fazê-lo, então, com multa e correção monetária.
O Brasil tem uma carga tributária de Primeiro Mundo, mas os serviços públicos que, em troca, oferece à população são de quinta categoria.
Por esta razão, o brasileiro é obrigado a trabalhar dobrado para pagar pela escola privada dos filhos, pois a escola pública é de baixa qualidade; pela segurança privada, pois a que o Estado oferece é deficiente, e a prova é o avanço das facções do crime organizado sobre as cidades; pelo plano de saúde privado, porque a saúde pública segue sendo exemplo de precariedade.
Não há razão – a não ser a vontade de arrecadar mais para sustentar a agora ampliada máquina administrativa estatal nos seus níveis federal, estadual e municipal – para que se cobre pelo uso da água de um pequeno açude construído pelo dono com seu próprio dinheiro.
Nem para cobrar por um serviço de limpeza urbana cujo custo está incluído no IPTU.
Um dia, ninguém sabe ainda quando, o Brasil, seu Distrito Federal, seus estados e municípios e sua população conviverão de maneira civilizada: a carga tributária será menor, os serviços públicos serão eficientes e o Poder Público e o contribuinte conviverão abraçados.