Por que queremos dar nome ao que sentimos

Há muitas guerras acontecendo e procurar respostas, nomes e rotas para o que sinto torna-se um respiro fundo, uma dose a mais de ar no peito

Escrito por
Dahiana Araújo dahiana.araujo@svm.com.br
(Atualizado às 11:31)
Legenda: Em certos momentos, quem está ao meu redor me vê respirando fundo, como se tentasse alargar o coração para ter mais espaço para o furacão de sensações que habitam em mim
Foto: Pexels

Acordei, e o mundo está em guerra… há conflitos entre países, tecnologias, narrativas. Humanos contra humanos. Máquina contra quem? Mulheres mortas, homens feridos, crianças sem lar. Dói em todes. Durmo, sonho com pesadelos - e volto a levantar para um novo dia. Quantos de nós tem tido dificuldade de dar nome ao que sente em meio a tantos desafios? 

Eu não sei qual é a ordem das coisas. E nem quais os caminhos me são direção. Opções não me afetam justamente porque estou atarefada demais para pensar. Agir ainda não foi cogitado. Parece que parei (apenas) para sentir. O quê exatamente? Também não sei. Me sinto efusivamente cansada ao enxergar daqui já a travessia que vou fazer dentro de mim enquanto percebo que isso é um início de um texto-suspiro. Tudo passa. Respiro. 

Sempre tive uma imensa necessidade de dar nome às coisas ao meu redor. E também aos sentimentos, pois desde muito pequena as sensações que latejam em meu interior são demasiado intensas. Amor e dor são sempre gigantes. Indiferença dificilmente é minha escolha. Todas as vezes em que tomei decisões optei por sentir. 

No entanto, nem sempre consigo definir o que sinto. Tanta coisa do que me atravessa permanece em mim sem resposta. Tenho marcas de passados bravios, porém ainda indecifráveis. É como se eu precisasse de palavras em línguas que desconheço ou de formas que não sei desenhar e pintar; explicações  que definitivamente não sei esboçar.
 

Tudo em mim é enorme. Redemoinhos indomáveis estão ativos aqui dentro, a todo instante, e até mesmo quando estou na quietude do meu silêncio, as ondas de mares agitados quebram insanas dentro do peito. Às vezes, viram palavras, às vezes nem pensar.  E é por isso que, em certos momentos, quem está ao meu redor me vê respirando fundo, como se tentasse alargar o coração para ter mais espaço para o furacão de sensações que habitam em mim. 

Multiplico-me em vários instantes para dar conta do tamanho das minhas utopias. E também das minhas ilusões. Transformo alguns dos meus aprendizados sobre o interior de mim em ferramentas para lidar com que eu sou, por isso vivo envolta em perguntas-silêncios sobre cada caminho que traço (e percorro). Tenho em mim muitas rotas. Mas, como muitas vezes assusta-me o destino, prendo minhas ideias no meio dos (meus) caminhos - como uma pausa para refletir. 

Fico testando combinações de palavras e sentimentos sobre mim mesma pra ver se encontro algumas respostas que pairam em meu ser feito estrelinhas de desenho animado rondando a minha cabeça. Ora sou absolutamente complexa nas saídas que reparo dentro de mim, ora inexplicavelmente singela. Um sopro de leveza, ou vice-versa. 

Grade de ponte com diversos cadeados do amor presos, com o Rio Sena e a Torre Eiffel desfocados ao fundo
Legenda: Todas as vezes em que tomei decisões optei por sentir
Foto: Pexels

Contesto o mundo a minha volta algumas vezes sem mexer nem a pálpebra dos meus olhos atentos. E outras vezes grito horrores porque as pessoas estão caladas dentro de suas próprias histórias, umbigos de “minimundos”. Sozinha, fico ouvindo a minha própria voz ressoar com todas as perguntas que tenho sobre ser quem eu sou, ou somos. 

Eu não sei recusar se o caminho estiver sombrio, apesar de todos os pavores que tenho na mente e coração; cato o quanto puder de coragem porque não aceito paralisar sem uma resposta. E às vezes me canso de mim mesma, porque ser e existir também são verbos-desafios. E dou a volta em mim - no mundo que sou - pra retornar ao ponto onde me desconcentrei de algum fragmento de vida; depois sigo destino (acreditando) em terra firme. 

Há muitas guerras acontecendo, em muitos territórios, concretos e abstratos; coletivos e individuais. Por isso, procurar respostas, nomes e rotas para o que sinto torna-se um respiro fundo, uma dose a mais de ar no peito cansado. Como se eu ganhasse tempo. Sigo, portanto, buscando dar nomes às coisas e ao que sinto. Nem sempre há palavras.

Acordei e o mundo está em gerras…