Houve um tempo em que esperávamos, ansiosos, o dia da eleição. Lembro que, pelo menos no meu interior, era como se preparar de fato para uma festa da democracia. Arrumávamos o cabelo e separávamos nossa melhor roupa, com as cores do partido e dos candidatos em que acreditávamos. Usar preto ou branco sequer era opção.
A cidade despertava diferente. O movimento de moto nas ruas de paralelepípedo era intenso enquanto eleitores, aos montes, iam às suas sessões eleitorais animados. Não me lembro de sentir medo nesta época.
Nós nos enchíamos de adesivos. Nem precisava da colinha em um papel discreto como a que me acompanhou neste último domingo. Os votos já estavam ali, grudados na nossa própria roupa, sem medo. Todo mundo podia gritar sua opinião na festa da democracia sem receio de ser violentamente xingado ou de sofrer agressão física.
Lembro que eu e uma de minhas melhores amigas de infância nunca escolhíamos os mesmos candidatos. Mas saíamos sempre juntas, toda eleição, para votar. Íamos o tempo todo brincando, tentando convencer a outra a mudar de voto, sem briga e com muito respeito.
Geralmente estávamos quase viradas do dia anterior, quando os conterrâneos faziam um caldo bem gostoso - há quem diga que era para esperar a compra de votos, outros que era para alimentar os fiscalizadores fervorosos contra este crime eleitoral. Nem estes possíveis desvios eram fortes a ponto de lançar sombras sobre a nossa festa da democracia.
O fim do dia da eleição no interior também era uma festa. A postos, estavam os carros de som com as mesmas paródias de sempre, preparados para celebrar vitórias e frescar com os derrotados, independentemente de quem fossem. “Arruma a mala aê” é um clássico histórico das eleições do interior, cuja maioria dos candidatos costuma morar mesmo é na capital e só se muda mesmo para lá quando eleito.
Quando havia a festa da democracia, sentávamos na calçada para acompanhar a apuração todos juntos, com as camisas coloridas conforme as bandeiras políticas de cada um. Toda hora chegava gente com um boletim parcial diferente, provando que as urnas eletrônicas no Brasil sempre foram auditáveis. Deixávamos o rádio ligado para ouvir a apuração, com nossos dedos e olhos bem distantes dos celulares de hoje. Era emoção. Era rojão também, irmão.
No fim da festa, era natural que parte do eleitorado permanecesse feliz. Entre eu e minha amiga, sempre saía uma decepcionada. Mas seguíamos juntas, certas de que a escolha de governantes só pode vir pela via democrática, envolvendo toda a população brasileira.
Hoje o dia da eleição não é mais como aqueles tempos, mas seguimos certas de que todos temos o direito de nos manifestar. E que o ato de votar é um compromisso a ser preservado pelo futuro dos nossos filhos.
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