A demolição do São Pedro e a produção dos Espaços Amnésicos em Fortaleza

O edifício seria um espaço diferenciado na cidade do tempo presente, mas a sociedade fortalezense abdicou dessa possibilidade

Legenda: O Edifício é a marca espacial da reestruturação urbana e econômica de Fortaleza
Foto: Kid Júnior

A demolição do Edifício São Pedro é o assunto da semana. Um prédio de propriedade particular, datado do ano de 1951 e construído na mais famosa praia de Fortaleza, a de Iracema, tem no ano de 2024 a sua data de “morte”.

Quando o Edifício foi inaugurado e sua função hoteleira instaurada, a cidade de Fortaleza caminhava a passos largos para abraçar o litoral e incorporá-lo a sua urbanidade. A Praia de Iracema era ocupada por casas de praia – bem antes da construção da Avenida à Beira-Mar – recebia uma inovação inspirada em cidades litorâneas-balneárias mais conhecidas internacionalmente.

O Edifício São Pedro é vestígio do processo de mudança econômica da cidade, haja vista a origem dos capitais da Família Filomeno Gomes, reconhecidos industriais cearenses. De fato, o Edifício é a marca espacial da reestruturação urbana e econômica de Fortaleza.

As fotografias dos anos 1960 e os cartões postais retratam uma orla belíssima, marcada por belas casas térreas e o colossal Iracema Plaza Hotel. As memórias de moradores e dos jornais daquele período demonstram o quanto era orgulho local hospedar-se ou morar naquele lugar. Imagino o quanto de diferencial nosso litoral ganharia caso tivéssemos a consciência coletiva de manutenção de parte das características daquele espaço do passado.

Sem sombra de dúvidas, a Praia de Iracema seria muito mais “instagramável”. Seria um espaço diferenciado na cidade do tempo presente. Mas a sociedade fortalezense abdicou dessa possibilidade.

Na verdade, Fortaleza é uma cidade que quer ser grande, rica e moderna, não importa o custo social. Isso é claramente observável quando falamos dos espaços construídos e do avanço dos interesses econômicos e imobiliários.

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As tentativas de patrimonialização, tombamento e reestruturação do Edifício foram, pouco a pouco, desconstruídas e inviabilizadas. No fundo, a questão principal não é o caso em si, não é a situação restrita ao São Pedro. O debate é outro, mais amplo. Estamos discutindo o modelo de valorização da memória, do passado e dos espaços construídos na cidade de Fortaleza.

Se o apagamento das referências for a perspectiva escolhida pela sociedade de Fortaleza, não é difícil compreender que a estratégia persistirá e o Edifício da Praia de Iracema será só mais um.

A cidade que queremos para o futuro passa efetivamente pelo o quanto somos capazes de pensar os marcos históricos. No final, num processo incessante de destruição e construção, Fortaleza será uma cidade, como diz a geógrafa Ana Carlos, dos tempos efêmeros e espaços amnésicos. A construção de mais prédios, quase que iguais, pasteuriza e monotoniza a nossa paisagem e nos faz menos diversos. É isso que queremos?

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