Demolir é necessário: entulhos e escombros de nós mesmos

A verdadeira solidão não é não ter amigos e nem se afastar deles e sim não ser amigo de si mesmo e se afastar de sua própria essência

Legenda: O que no passado simbolizava o luxo, hoje é lixo, escombro, entulhando a paisagem e pondo a segurança dos transeuntes em perigo
Foto: Thiago Gadelha

A demolição do edifício São Pedro na praia de Iracema, tem suscitado debates e reflexões. O que no passado simbolizava o luxo, hoje é lixo, escombro, entulhando a paisagem e pondo a segurança dos transeuntes em perigo. As ruinas de castelos e moradias nos falam de um tempo em extinção. Na Europa, no passado, os castelos suntuosos, moradia dos reis e rainhas, símbolos do poder econômico e político, hoje alguns viraram museus, e a maioria deles são ruinas abandonadas.

Esses entulhos nos falam de um tempo que já passou. A vida tem seus ciclos que se abrem e se fecham. Nos lembra o proverbio popular: "pais ricos, filhos nobres e netos pobres". Que lições podemos tirar para nossas vidas? Que a falta de conservação de nossos valores edificantes pode nos transformar em escombros vivos, entulhando a existência na família e na sociedade, prejudicando nossa saúde física, mental e espiritual além de nos envelhecer, nos adoecer.

Quando fechamos as portas e janelas de nossa existência, deixando de falar e saudar pessoas que pensam diferente de mim, que não concordam com minhas ideias, deixamos de interagir com nosso meio ambiente, nos asfixiamos e terminamos nos refugiando em um exilio relacional. Viramos entulhos vivos. A verdadeira solidão não é não ter amigos e nem se afastar deles e sim não ser amigo de si mesmo e se afastar de sua própria essência.

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A essência da vida é trocar energia. É dar e receber, amar e ser amado, aprender e ensinar, falar e escutar. Vejamos o exemplo das plantas. Elas se alimentam absorvendo o ar sujo o CO2 e eliminando o ar puro o oxigênio que alimenta todos os seres vivos. É pela fotossíntese que ela transforma o meio ambiente, purificando a atmosfera. Nesse processo, ela precisa de luz.

Nós humanos, como os vegetais, nascemos com a missão de nos transformar e transformar o meio onde vivemos. Para isso precisamos exercitar nosso senso crítico-analítico, gerador de consciência para crescermos como pessoa e modificar nosso entorno. Do mesmo jeito que sem luz a planta não vive e nem purifica a atmosfera, para os humanos, sem consciência, somos apenas ecos de ruídos produzidos por outros em outros tempos.

Para trocar energia, para dar e receber precisamos estar com o corpo e a mente abertos para receber e se deixar interpelar. Ser mais interrogativos que afirmativos, desenvolver o senso crítico. Ouvir só o que quero, é muito fácil, mas ouvir o que ainda não ouvi, ser questionado em minhas certezas, isso sim é um desafio libertador. Quando me isolo, me fecho e fecho o coração que não sente, fecho os ouvidos que não ouve, fecho os olhos que não vê.

Me fecho para o mundo exterior, me asfixio, me torno prisioneiro de mim mesmo e conheço a prisão afetiva, econômica, material, que me leva à morte relacional. Me refugio em uma bolha de alienação e negacionismo para não ter que pensar e mudar de ponto de vista. Me torno um escombro vivo poluindo a vida de tantas pessoas. Por isso se diz que toda certeza é uma prisão que me isola e me impede o processo de trocas indispensáveis ao crescimento humano e comunitário.

Precisamos ser mais interrogativos do que afirmativos, desenvolver o senso crítico. Ouvir só o que quero é muito fácil, mas ouvir o que ainda não ouvi, ser questionado em minhas certezas, isso sim é um desafio libertador. Como dizia o prof. Darcy Ribeiro, “só aprende quem se dispõe a rever suas certezas”. Quando fico na postura de só dar ou só receber ou só falar sem escutar, me desconecto da minha essência do SER que tem algo a contribuir. Meu crescimento fica comprometido e minha família e a sociedade deixam de receber o que tenho para oferecer.

O egoísmo que nos isola dos outros, que nos faz superior ao outro, é tão nocivo quanto a devoção excessiva, onde nos anulamos em nome de um amor à humanidade, gerando culpabilidades à aqueles a quem me devoto. As polarizações que marcam os relacionamentos atuais é um exemplo de entrave ao desenvolvimento a abertura necessária para escutar, abrir-se para acolher o novo a informação que eu não sabia. A medicina chinesa nos lembra, que o segredo da vida e da longevidade é movimentar-se.

Legenda: Em nosso corpo físico, lá onde a energia deixa de circular, aparecem as dores e doenças
Foto: Kid Júnior

Em nosso corpo físico, lá onde a energia deixa de circular, aparecem as dores e doenças. Em nossas mentes, lá onde as ideias deixam de ser repensadas, discutidas, verificadas sua veracidade, existem bolhas de alienação, tão nocivas como a poluição do ar. Nos isolamos, fugimos de nossa essência que é nos relacionarmos com os amigos, familiares.

Nos tornamos entulhos e escombros de um passado que não existe mais. Deixamos de nos atualizar, de fazer o download necessário para estarmos em sintonia com os as exigências do presente sem se desligar dos valores eternos. A magia de um lugar está nas pessoas que lá convivem. Uma casa só vira escombro, quando não guarda memorias de momentos felizes, de encontros com familiares e amigos, como nas casas de nossos avós, que mesmo envelhecidas continuam vivas as lembranças de momentos inesquecíveis. E você o que precisa fazer para renascer dos seus escombros?



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