Como evitar frustrações ao tentar ajudar alguém?

Quando se ajuda alguém sem nenhuma outra intenção além da solidariedade, o ideal é não cobrar e nem esperar nada em troca. No entanto, pode surgir a decepção

Escrito por
Adalberto Barreto producaodiario@svm.com.br
Legenda: Ao ajudar ou se relacionar com alguém, é comum, mesmo que inconscientemente, projetar nossos próprios desejos, valores ou soluções sobre o que acreditamos que o outro precisa
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A frustração é um sentimento que nasce quando criamos expectativas sobre o comportamento e as respostas das pessoas que convivem conosco. Muitas vezes, ao oferecermos ajuda de maneira sincera, movidos somente pela solidariedade e sem esperar reconhecimento ou reciprocidade, acabamos nos decepcionando quando a resposta do outro não corresponde ao nosso desejo ou intenção.

Quando se ajuda alguém sem nenhuma outra intenção além da solidariedade, o ideal é não cobrar e nem esperar nada em troca. No entanto, pode surgir a decepção se, em algum momento, o outro retribuir um favor, uma gentileza ou um gesto de ajuda cobrando algo, ou exigindo uma contrapartida. Esse desencontro de expectativas é fonte comum de frustração, ao revelar que nem sempre o gesto é interpretado da mesma forma por quem recebe.

Além disso, situações atuais podem servir de gatilhos que despertam situações vividas na infância em que me senti injustiçado por não ser reconhecido em meu esforço de ser reconhecido e me tornar visível. O cenário de ontem se funde e se confunde com o de hoje e a revolta que não pude expressar no passado surge com uma força desproporcional, revelando que não estou reagindo ao fato de hoje, mas sim ao que ele me revela de ontem.

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Ao ajudar ou se relacionar com alguém, é comum, mesmo que inconscientemente, projetar nossos próprios desejos, valores ou soluções sobre o que acreditamos que o outro precisa. Essa conduta cria uma imagem ideal de como gostaríamos que a situação se desenrolasse ou de qual seria a resposta esperada em troca dos nossos gestos de cuidado ou apoio.

No entanto, quando a realidade se apresenta diferente dessa construção interna, a frustração surge e, muitas vezes, se transforma em decepção. O fato de criarmos uma expectativa sobre o comportamento do outro — esperando gratidão, reciprocidade ou reconhecimento — faz com que, ao não recebermos o que imaginamos, sintamos uma frustração por não acontecer o que esperávamos.

Essa distância entre expectativa e realidade é fonte direta de frustração. Esse sentimento é especialmente intenso em vínculos mais próximos, onde existe maior investimento emocional.

Nessas relações, o desejo de ser reconhecido e de receber reciprocidade é mais forte, tornando a decepção ainda mais profunda quando o outro não corresponde ao que idealizamos ou esperamos. Na realidade, o que houve foi um equívoco de minha parte, um erro de compreensão, interpretação ou julgamento, geralmente causado por informações incompletas, pressupostos incorretos ou falta de comunicação clara.

O equívoco ocorre quando entendemos algo de maneira diferente do que a outra pessoa realmente quis dizer ou precisa, levando a mal-entendidos e, muitas vezes, à frustração ou decepção. Uma pessoa acredita que seu gesto de ajuda será recebido com gratidão e reciprocidade, mas o outro entende como uma obrigação ou até como imposição, não reagindo como esperado.

O equívoco está em presumir que o outro compartilha dos mesmos valores ou expectativas. Ele acontece ao projetar desejos pessoais na vida do outro, sem considerar sua individualidade. Reconhecer o equívoco é o primeiro passo para aprimorar a escuta, a comunicação e o respeito à alteridade, evitando conflitos desnecessários nas relações.

O sentimento de frustração nasce deste equívoco criado por minhas expectativas. É quando descubro que cada pessoa é diferente e que, embora sejamos parecidos na aparência, cada um tem uma essência própria recheada de elementos de sua história familiar. Se fôssemos iguais, não existiria a alteridade, seríamos clones com pensamentos iguais e comportamentos previsíveis.

É do choque das diferenças que vamos gradualmente descobrindo que somos seres especiais e irreplicáveis. Cada um tem sua digital própria, embora tenhamos todos o mesmo dedo polegar. Esse talvez seja uma das principais fontes de conflitos e decepções, acreditar que o outro é como eu e que estou reagindo ao presente e não ao passado.

Cada cabeça tem uma sentença com pensamentos e desejos próprios e, se não considerarmos essa realidade, nossa tentativa de ajudar pode ser um ato de desrespeito e intromissão ao projeto do outro e uma confusão com problemas pessoais e familiares ainda não resolvidos.

Aqui é um dos pontos críticos nas relações familiares, quando os pais agem sutilmente para querer influenciar ou determinar as escolhas profissionais de seus filhos. E muitos filhos, com receio de contrariar seus pais a quem tanto amam, abortam seus projetos de vida ou enveredam por caminhos contrários aos valores de sua família.

O que fazer para evitar equívocos repetidos?

A primeira coisa a considerar é que o outro é bem diferente de mim. Daí a importância de ampliar a escuta, sobretudo se existe uma demanda. Ser mais minucioso em suas perguntas: deixe-me ver se entendi, você está me solicitando que te ajude a refletir sobre a situação que você está vivendo, ou você está só querendo desabafar e quer que eu faça algo? Sermos mais interrogativos do que afirmativos. Outro ponto crítico é ficar no campo da materialidade, do hoje.

Um exemplo partilhado em uma roda de Terapia Comunitária ilustra bem este aspecto. Uma amiga desabafa com outra, falando de suas dores nas costas, de seu excesso de trabalho e de noites mal dormidas. A amiga que escutava pensou que ela precisava de um sofá confortável para se repousar. Decidiu fazer uma surpresa e lhe presenteou um sofá novo. Dois dias depois, a amiga devolveu o sofá, por ocupar muito espaço em sua casa já pequena.

Surge a dor da decepção: eu fiz um esforço, comprei um sofá novo para minha amiga e ela, em vez de me agradecer por essa gentileza e pela surpresa, me devolveu o sofá. O que de fato sua amiga estava precisando era de um ombro amigo, de um “sofá afetivo”, para consolá-la e não de um sofá material.

O que esperava era que sua amiga a escutasse, reconhecesse o seu esforço de mãe e dona de casa. Ou seja, ela esperava uma resposta não em um nível material, e sim em um nível imaterial. O equívoco foi não perceber a real necessidade da amiga e agir a partir de suas próprias referências.

Outro aspecto importante é deixar de ser a referência com seus valores pessoais.Tenho meus valores, meus pontos de vista e minha história pessoal, mas o outro tem os seus que podem ser bem diferentes dos meus. Nem sempre minhas carências são as carências do outro, nem minhas necessidades são as mesmas.

Quando vou falar, falo a partir do que para mim é importante, sem querer impor ao outro o meu ponto de vista. Posso fazê-lo, mas dando margem ao outro para discordar. Vale lembrar que, quando solicitamos auxílio a alguém, o que de fato queremos é ter um ponto de vista diferente para poder comparar com o seu e ver o problema de outra perspectiva. Portanto, quando discordo de outro ponto de vista, estou auxiliando o outro a rever seu posicionamento, sua visão do problema.

Ajudar não significa que o outro siga meus conselhos. Ajudamos quando discordamos, porque leva o outro a refletir sobre suas decisões.

Precisamos ter o entendimento de que ajudar não é dizer o que o outro tem que fazer ou exigir que o outro se submeta aos meus conselhos e diretrizes, e sim trazer elementos que permitam ao outro refletir e tomar a decisão que lhe desejar. Ajudar sem querer impor o próprio ponto de vista é um exercício constante de humildade, empatia e verdadeira escuta.

Muitas vezes, ao tentar ajudar, arriscamos projetar no outro nossos próprios desejos, carências, soluções e valores, esquecendo que cada pessoa traz consigo uma história única, necessidades particulares e maneiras próprias de enxergar a vida. Cultivar uma escuta ativa e aberta pode ser de grande utilidade. Isso significa ouvir sem pressa de responder, sem buscar imediatamente uma solução ou uma confirmação de nossas próprias ideias.

Antes de oferecer conselhos, é essencial perguntar, investigar e validar o que está sendo partilhado: Como posso te ajudar de verdade? O que faria sentido para você nesse momento? Ao dar espaço para o outro nomear suas necessidades, evitamos interpretações precipitadas, diminuindo a chance de agir motivados por pressupostos equivocados.

O equívoco, longe de ser um fracasso, é uma oportunidade de aprendizado. Ao perceber que a ajuda não foi recebida como esperávamos, em vez de nos decepcionarmos, podemos buscar compreender melhor: o que levou ao desencontro? Qual era, afinal, a real demanda da pessoa? Essa atitude exige maturidade emocional e desapego do desejo de reconhecimento e reciprocidade.

Lidar com os equívocos sem se decepcionar passa, então, por abdicar da expectativa de que o outro retribua ou compreenda nossa intenção da mesma forma que a sentimos. Enxergar o outro como legítimo em sua diferença é, ao mesmo tempo, um gesto de respeito e um convite ao autoconhecimento: até onde meu desejo de ajudar é legítimo e até onde quero somente confirmar minhas próprias ideias?

Assim, a frustração deixa de ser obstáculo e se transforma em um caminho para relações mais autênticas, maduras e respeitosas. Ajudar, portanto, é também um ato de entrega: oferecer o melhor de si, mas saber que o outro dará à nossa oferta o significado que fizer sentido para sua própria trajetória. Quanto mais livres estivermos do desejo de controlar a resposta, maior será nossa capacidade de acolher, compreender e crescer a cada encontro.