Segunda onda da pandemia interrompe recuperação do fluxo de passageiros no Aeroporto de Fortaleza

Após nove meses de gradual retomada do volume de viajantes, queda da movimentação em fevereiro refletiu recrudescimento da pandemia e deve a se aprofundar em março. Perspectiva agora é de nova queda em 2021

Legenda: Cenário epidêmico amplia pressão sobre o mercado aéreo
Foto: Helene Santos

Antes que as medidas de lockdown começassem a ser vastamente implementadas pelos estados e cidades brasileiras, movimento que veio ganhar mais força em março diante do iminente colapso dos sistemas de saúde, o fluxo aéreo de passageiros já tinha começado perder fôlego em fevereiro. Agora, diante de um quadro dramático da pandemia, as expectativas de crescimento do tráfego aéreo em 2021 caem por terra.

Em Fortaleza, a movimentação vinha crescendo gradualmente, mês a mês, desde o baque em abril do ano passado (veja gráfico abaixo). Essa tendência mantida por nove meses seguidos foi interrompida pelos resultados de fevereiro, quando passaram pelo Aeroporto de Fortaleza 251 mil passageiros - queda de 39,7% ante janeiro (416,6 mil) e de 54,4% ante fevereiro de 2020, último mês antes da chegada da pandemia no País.

Os dados foram divulgados ontem (24) pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Mesmo levando em conta a diferença sazonal - janeiro tem, tradicionalmente, movimentação maior por conta das férias -, a demanda por voos domésticos em fevereiro no País foi a mais fraca desde outubro de 2020, também segundo a Anac, refletindo o agravamento da pandemia e a consequente proibição de festividades que gerassem aglomerações no Carnaval.

Em entrevista à coluna no mês passado, o pesquisador Alessandro Oliveira, coordenador do Núcleo de Economia do Transporte Aéreo do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), tinha apontado justamente o risco das festividades para o desdobramento da pandemia para desmistificar uma "pretensa euforia" que se tinha no mercado. Ainda assim, a dimensão que a pandemia tomou surpreendeu - se antes a perspectiva era a de que o tráfego aéreo deste ano superasse o de 2020, agora a previsão é o que o oposto aconteça.

"Em comparação a 2020, acho que (a movimentação) vai ser pior, porque 2020 ainda teve os três primeiros meses (de tráfego menos impactado pela pandemia), né? Que foram bem melhores do que os três primeiros meses desse ano. E é possível que quando a recuperação retome, é claro, assumindo que não vai haver uma terceira onda, variantes - são muitos riscos envolvidos numa previsão -, mas não havendo nada de novo, acho que a retomada vai ser mais ou menos parecida com essa que a gente teve, talvez um pouquinho até mais rápida por causa da vacinação", analisa Oliveira.

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Cenário de instabilidade

Apesar de o pessimismo no mercado aéreo ter dimensão internacional, com a segunda onda forçando as companhias aéreas a refazerem planos mundo afora, o pesquisador lamenta que, no Brasil, "a incerteza é elevada à potência".  "É desolador, porque não dá para planejar, é sempre para o curtíssimo prazo mesmo. A gente nunca sabe qual é o pico de mortes de Covid-19, então dá para ver que teremos aí pelo menos esse fim de março e abril períodos difíceis", aponta.

Com recuperação plena do tráfego aéreo prevista apenas para 2024, 2025, que vai depender do comportamento da pandemia e do ritmo de vacinação, entre outros fatores, é difícil ainda prever a partir de quando a movimentação voltará a crescer novamente - e se será de maneira semelhante ao observado a partir de maio do ano passado. 

"Eu acredito que a recuperação vai ser gradual, mais ou menos da forma como a gente está observando por conta da vacinação, um retorno em escadinha, mas a partir do momento de inflexão. Essa é a grande incerteza, quando vai começar esse ponto de inflexão, que depende muito do controle sanitário e foge de qualquer previsão econômica", avalia Oliveira.

Por enquanto, aponta o pesquisador, com as barreiras internacionais, a expectativa é que este ano também seja péssimo para esse mercado. No doméstico, o enxugamento da malha aérea também deve impactar as operações no Aeroporto de Fortaleza. E as iniciativas regionais, como preveem a Itapemirim ou a Nella, por exemplo, ficam bastante comprometidas.

Mas mesmo em um cenário tão obscuro, ainda há esperança no médio a longo prazo. "O desejo de voar continua, né? Acabando as barreiras sanitárias, a tendência é que as viagens a lazer sejam catapultadas mais rapidamente - apesar de não tão rápido quanto a gente queria - que as viagens a negócios. Acredito que uma cidade turística, como Fortaleza, seja beneficiada".