Com memorandos de entendimento já firmados para a produção de hidrogênio verde no Ceará, grande aposta do Estado para o desenvolvimento da região, o Governo Federal tem o desafio de criar um arcabouço legal e regulatório para a cadeia produtiva do setor, o que envolve muito mais que a pasta e os órgãos de energia.
De acordo com o diretor do Departamento de Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia, Carlos Alexandre Pires, a expectativa do governo é entregar ao menos parte desse arcabouço, a Política Nacional do Hidrogênio, até o fim deste ano. Hoje, a pasta entrega ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) resolução para publicar em até 60 dias as diretrizes do programa.
O documento deverá incluir direcionamentos para a normatização do uso, transporte, qualidade, segurança, armazenamento e abastecimento do hidrogênio no País, entre outras definições. "É um desafio gigante, porque nós estaremos partindo praticamente do zero. Mas é um desafio que é problema em todos os países porque, sendo uma tecnologia disruptiva, tem pouco ou quase nada de arcabouço regulatório no mundo".
Matizes do hidrogênio
A regulamentação, entretanto, não deve considerar apenas o hidrogênio verde (produzido a partir de energia renovável). Outras "cores", como o azul (quando a fonte é fóssil, mas o carbono emitido é capturado para neutralizar as emissões) também serão levadas em conta no plano nacional. A ideia, segundo Pires, visa a "neutralidade tecnológica".
"Ainda reconhecendo que o hidrogênio verde será predominante em termos de pesquisa e em projetos de grande porte em áreas como o Ceará, a tendência é que nós adotemos uma neutralidade, alguns outros matizes, como o hidrogênio azul, a partir do gás natural. Nós temos outras possibilidades de hidrogênio a partir da energia nuclear que também é carbono zero", aponta.
A estratégia, segundo o diretor, visa evitar um "trancamento tecnológico", quando se adota apenas uma dentre um leque de tecnologias e, eventualmente, torna-se refém dela. "Nossa estratégia principalmente no curto e médio prazo será de abertura para desenvolvimento da tecnologia do hidrogênio independentemente do matiz".
O diretor ainda destaca que o CNPE já colocou o hidrogênio no topo das prioridades para a pesquisa e desenvolvimento no Brasil voltados a energia. "Quando a gente olha para o hidrogênio verde, a gente vê que o Brasil pode se tornar um mercado muito relevante na produção, podendo se tornar um exportador, mas nossa preocupação é de também desenvolver o mercado interno";
Passos da regulamentação
Para construir o marco legal para esse segmento, Pires destaca a necessidade de alinhamento com diversas pastas, o que vai demandar tempo. "De cara, com o Ministério de Ciência e Tecnologia, da Economia, eventualmente do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Regional", lista o diretor. A regulamentação também deve passar tanto pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), como pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
"A nossa intenção é colocar a discussão pública e de forma sistematizada. Ouvir principalmente os investidores dos diferentes segmentos para ver onde exatamente nós temos expertise e diferencial para desenvolvimento"
Essa necessidade se dá também pela versatilidade do uso do hidrogênio, considerado um vetor energético - capaz de armazenar e transportar energia - e que também pode ser injetado na malha de gás natural e usado como combustível de transportes. Sem falar dos subprodutos que, segundo Pires, incluem metanol e amônia, usada na fabricação de fertilizantes.
"O Brasil é uma das maiores potências agrícolas do planeta e é importador de fertilizantes. Se nós formos autossuficientes na produção de hidrogênio, também seremos uma grande potência para a produção de fertilizantes", aponta.