QUE NEM TU: Silvero Pereira critica visões estereotipadas do Nordeste na TV e no streaming

O cearense apresenta neste sábado (9) o espetáculo Silvero interpreta Belchior em Fortaleza e conta o que une a obra do cantor "de amar e mudar as coisas" a sua trajetória

Escrito por Redação ,
SIlvero Pereira
Legenda: O cearense apresenta seu show em homenagem a Belchior em Fortaleza
Foto: Ismael Soares

O menino que saiu de sua cidade, Mombaça, no Interior do Ceará, para ver o mundo. Assim é a história de Silvero Pereira (41), que escreve, em sua própria narrativa, uma jornada do herói que faz inveja a grandes roteiristas. Nas histórias da vida real, o cearense se encontra através do teatro, faz sua revolução junto a outros artistas, cai no mundo para encantar públicos do Brasil e do mundo e realiza o sonho de também transformar a realidade da família. Silvero foi pra fora, mas a cada passo que se distanciava de casa se aproximava ainda mais de suas origens.

Estar conectado com o Nordeste e não arredar o pé do que sua terra é virou também um discurso potente do multiartista. Em entrevista ao Que Nem Tu, durante o episódio desta quinta-feira (7), ele mais uma vez criticou como a TV, o Cinema e o Streaming usam e reforçam estereótipos do Nordeste em suas produções. " Isso é um desserviço sobre a imagem que o Nordeste tem hoje".

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Na semana em que a primeira foto da novela No Rancho fundo, da Globo, foi divulgada e super criticada por trazer personagens do Nordeste caracterizados como pessoas sujas, sofridas e queimadas de sol, o artista cearense reforçou como o Nordeste encanta o público, mas ao mesmo tempo está tão distante de ser representado nessas produções audiovisuais.

"Falar do Nordeste é o melhor produto que a gente tem hoje. É a região brasileira que mais tem crescido nos últimos anos. A gente está falando aqui sobre energia eólica, medicina, cientistas, arte... Nos últimos 10 anos os grandes filmes vencedores de festivais saíram do Nordeste. A gente tem "Bacural", "Pacarrete", "Praia do Futuro", "¨Tatuagem". Se a gente for elencar que nos últimos anos filmes ganharam o mundo, 90% foram produzidos no Nordeste. Mas ainda hoje cometem esse erro do que é o Nordeste", explanou.

SIlvero explica que esse erro acontece por falta de conhecimento e envolvimento de pessoas da própria região. "Por que boa parte dessas produções ainda são de sudestinos que colocam o caju num pé de amora amarrado por um fio pela castanha. São pessoas que não sabem o que é o Nordeste e o que é mais grave: não saberem o que é o Nordeste e ainda imprimir uma imagem antiga do que nós fomos. Nós fomos uma região de muita seca, de chão rachada, de muita lama, muita areia, muita falta de água, muita sede. Mas hoje a gente não é isso. Mas quando vai se produzir  alguma coisa pro cinema, pra televisão ainda é essa imagem antiga".

SIlvero Pereira
Legenda: O cearense apresenta seu show em homenagem a Belchior em Fortaleza
Foto: Ismael Soares

O impacto desse mercado que olha a região com um olhar distante e estrangeiro atinge em cheio os artistas. Silvero que coleciona muitos espetáculos, personagens em novelas, como Elis Miranda (A Força do Querer) e Zaquieu (Pantanal), além de vários filmes "Serra Pelada", "Bacurau", "Fantasma Neon", "Bem-Vinda a Quixeramobim". Mesmo com vários prêmios, ele ainda sofre com um mercado que coloca os nordestinos em caixas preestabelecidas e tenta minar um caminho múltiplo de possibilidades desses artistas.

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No início não houve saída além de aceitar personagens que se assemelham. Mas depois foi preciso coragem para romper a lógica. "Sendo muito sincero, no início não tem muito o que escolher. Eu cheguei a um ponto que eu pensei: Caramba! Se eu me permitir entrar nesses fluxo eu não vou conseguir mais sair dele. Então eu preciso tomar outras decisões. Foi quando eu, de fato, comecei a dizer não para essa caixas, do nordestino, do LGBT, que eram sempre as mesmas coisas que chegam pra mim. E a partir do momento que eu passei a dizer não pra isso é que o mercado passou a me olhar de uma maneira diferente. Aí eu consigo mostrar uma outra faceta. ".

Para ele, não é difícil só romper com padrões, é também lutar para ter espaços iguais com quem vem do sul e sudeste.

"Já é difícil confrontar o mercado que te coloca numa caixa e às vezes chegam as caixas prontas e o mercado diz que você não tem perfil pra isso. A minha última coluna fala sobre isso, que é o artista nordestino. Na hora de pensar um artista nordestino para fazer nordestino é ok. E aí não se pensa num nordestino pra fazer um outro tipo de personagem. Mas na hora que tem produções nordestinas, também não se coloca os nordestinos para serem protagonistas da história. A história é contada pelos sudestinos. Aí é outra briga com o mercado"
Silvero Pereira
Ator, cantor, diretor

A busca, reforça ele, não é de representatividade. Mas sim, proporcionalidade. "A gente já sabe elencar os nordestinos que estão aí fazendo trabalhos maravilhosos e estão alcançando protagonistas. Embora seja um número muito pequeno, mas falta proporcionalidades. E essa proporcionalidade não é só na frente da câmara, é em todos os processos", pontua. 

Silvero Pereira, Alan Barros e Karine Zaranza durante entrevista do Que Nem Tu
Legenda: Silvero contou sobre sua trajetória de vida, comentou trabalhos marcantes, a chegada ao cinema e televisão e ainda revelou o que vem por aí no palco com sua assinatura
Foto: Ismael Soares

Para seguir confrontando o mercado, pode continuar convidado Silvero.  Ele topa! O cearense  lembra que foi surpreendido pelo convite para protagonizar o filme sobre o Maníaco do Parque, que tem previsão de estreia ainda em 2024.

"Quando me fizeram o convite para fazer o Maníaco do Parque, eu fiquei me perguntando quando ia aparecer um jornalista nordestino, que seria meu papel. Quando eles falam: você é o maníaco do parque. Eu fiquei em choque. Eu fiquei uns 3 segundos de boca aberta olhando pro produtor. Ele disse: Desde o primeiro momento que o projeto chegou na nossa mesa eu pensei eu quero o Silvero fazendo esse personagem. Então pra mim isso é um grande salto. Olhar pra esse ator nordestino que só fez coisas nordestinas, inclusive, de grandes difusões na televisão, e ainda conseguir passar por cima disso mostra o quão esse cara tá fora desse mercado de encaixotar as pessoas".

Silvero interpreta Belchior e reconhece sua história

Sua história de briga com o mercado para não aceitar padrões que excluam outros tantos e a si mesmo é uma das similaridades que ele encontra com a história de outro artista cearense. Belchior, poeta, cantor e compositor de Sobral, encanta seu conterrâneo há muitos anos. Mas foi há 5 anos, que ele decidiu mergulhar fundo no estudo da vida e obra do rapaz latino-americano. E, por se enxergar tanto, nas letras e também na história de Belchior, Silvero trouxe para si a missão de interpretar no teatro suas canções.

"Quando eu comecei a ouvir as músicas do Belchior há 5 anos atrás eu fiquei assim: "Caramba! Como ela fala sobre quem eu sou". É um cara também do Interior do Ceará, de Sobral, que foi pra Guaramiranga, que estudou dentro de seminário, foi fazer medicina, estudou literatura e se tornou artista. E que confrontou. A história do Belchior é de confronto, também de xenofobia. Quando ele escreve "eu não estou interessado em certas teorias" ele tá dando um recado direto para todos esses compositores nordestinos que foram até o sudeste e foram obrigados a compor como o sudeste. E o Belchior nunca fez isso. Ele construiu a história dele, a carreira dele escrevendo sobre o Nordeste. Ele é uma grande referência pra mim. É mais um grande artista da nossa terra que sempre valorizou o lugar de onde veio".
SIlvero Pereira
Ator, cantor, diretor

Preste a estrear no streaming com uma série "Desejos S.A", ele também roda o Brasil com seu espetáculo "Silvero interpreta Belchior". Neste fim de semana, ele sobe ao palco em Fortaleza. No sábado, ele promete emocionar o público cantando os clássicos, no Pirata Bar. E sair desse atravessamento de Belchior transformou o artista Silvero que antes de considerava um ator que cantava. Agora, ele se reconhece cantor. 

Assim como o intérprete, ele quer que o público sai transformado do show . "Se vc escuta Belchior com precisão e atenção, com certeza você não vai sair a mesma pessoas. Silvero interpreta Belchior pq eu quero que a letra seja ouvida. Esse show é como faca, ele é corte profundo. Quero que as pessoas sejam atravessadas".

  • Serviço: "Silvero Interpreta Belchior"
  • Quando: sábado, 9, às 21h30min
  • Onde: Pirata Bar (rua dos Tabajaras, 325 - Centro)
  • Quanto: R$ 90 (inteira) e R$ 45 (meia); R$ 60 (ingresso solidário); vendas no site Sympla

 

 

 

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