Prestação de contas

O incômodo do cidadão diante do mau uso do dinheiro público é persistente. Afeta a relação que mantém com a política, os representantes eletivos, as legendas partidárias e, por extensão, até mesmo com a própria instância do poder público. Desconforto e indignação são alimentados, claro, por casos concretos de corrupção, mas há ainda a falta de clareza na aplicação de recursos.

A transparência, por parte daqueles que ocupam cargos ou operam com recursos públicos, é imperativa. Exigida pela lei, sua importância vai muito além de cumprir um ritual administrativo e jurídico. Afinal, o sedimento da confiança do cidadão nas instituições que lhe representam numa democracia passa, obrigatoriamente, por oferecer o que lhe é devido - acesso fácil e irrestrito às formas como o dinheiro que, coletivamente, lhe pertence.

Com a proximidade das eleições 2020, ganha força a preocupação com retidão que se espera de todo aquele, se pessoa ou instituição, que tem acesso a dinheiro público, execute de forma exemplar a aplicação à qual foi legalmente autorizado. Episódio recente, vivido no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), justifica esta reincidente inquietação. Concluiu-se, só agora, o balanço da prestação de contas dos partidos políticos brasileiros do pleito de 2014. A demora encontra sua razão na forma cheia de imprecisões e lacunas com que muitas legendas explicaram seus gastos durante as campanhas e eleições daquele ano.

O balanço do TSE inclui 32 partidos políticos. Destes, apenas um conseguiu prestar contas em acordo com as exigências da legislação eleitoral. Outras 11 agremiações tiveram as contas aprovadas com ressalvas (quando ficam registradas deficiências nos relatórios apresentados). No caso de 20 siglas, as contas foram desaprovadas. Destes, exigiu-se que devolvam aos cofres públicos, no total, cerca de R$ 27 milhões. A punição dada é ter o repasse de cotas suspenso, para o próximo pleito.

Na maior parte dos casos, o problema reside na impossibilidade de alguns partidos comprovarem como usam o recurso recebido. Nos processos, um ziguezague de cobrança de documentos comprobatórios e a entrega de papéis torna demorado o que deveria ser simples e rápido. Pode-se tentar encontrar uma justificativa para o caso na também reincidente crítica à burocracia. Contudo, é importante lembrar que dos partidos exige-se profissionalismo e, mais do que qualquer outra, essa instituição política tem a obrigação de conhecer as minúcias da lei e se antecipar às suas exigências. O confronto com a burocracia se dá mudando regras, republicanamente, não as ignorando.

O que tal situação coloca em questão é, primeiro, o uso correto do dinheiro público. Não são apenas intoleráveis os desvios, a corrupção propriamente dita, mas também as gestões ineficientes dos recursos. Por fim, há também o ônus para a confiança nos mecanismos políticos do País. Partidos, sejam qual for seu alinhamento político e ideológico, não podem prescindir da confiança do cidadão. Precisam, também por isso, honrar sua própria razão de existir, representando a população com transparência, como se exige em qualquer democracia moderna.