Editorial: Do papel à prática

O crime preocupa o brasileiro, em todos os recantos do País, e é partilhado por todas as classes sociais. Da questão, muito se ocupou nos últimos certames eleitorais, tanto naquele que levou à escolha do chefe do Poder Executivo nacional, como no que elegeu governadores. A pauta se impôs como prioritária à administração pública, demanda recursos elevados e estratégias sofisticadas, atualizadas e intersetoriais. 

Os resultados a que se têm chegado no combate ao crime não apresentam regularidade em todo território nacional, variando no tempo e no espaço, sendo importante, para se ter uma visão precisa do problema, atentar para a realidade de cada Estado. O Ceará tem apresentado bons resultados quando, por exemplo, consegue reduzir, por meses seguidos, o número de homicídios, que ainda permanece em nível elevado – como a média brasileira –, constituindo-se quadro considerado epidêmico, pelos padrões estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

A despeito das melhorias que se tenha alcançado, a sociedade parece exaurida dos infortúnios das atividades criminosas. Ressalte-se: a exaustão não é somente de sua face violenta e beligerante, do crime organizado, do tráfico de drogas, das facções e gangues. O cidadão tolera, cada dia menos, o crime que se dá nos corredores do poder, nas relações entre o público e o privado, nos quais, em benefício próprio, se saqueia o bem comum, com consequências tão onerosas quanto nefastas.

É resultado desse contexto, da disposição cidadã de ver a sociedade livre da desordem criminosa, que abundam projetos de lei que visam suprimir as condições que oportunizam infrações de toda ordem. Dentre as tendências, há a de se ampliar as tipificações de condutas criminosas, dada as transformações em diversas áreas; e a de tornar mais rigorosas as punições já existentes.

Nesta semana, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei do Pacote Anticrime (PL 10372/18). Alguns pontos da proposta original foram mantidos, como o aumento de 30 anos para 40 anos no tempo máximo de cumprimento da pena de prisão. Outros, como o dito excludente de ilicitude, foram excluídos do texto aprovado pelo grupo de trabalho que analisou o projeto. O Pacote Anticrime ainda será submetido ao Senado Federal.

É próprio do processo democrático brasileiro que projetos de lei se transformem no Congresso Nacional, tendo partes suprimidas e novas propostas adicionadas ao conjunto original. Diálogo, negociações e embates imprimem posicionamentos das diversas forças políticas e setores representantes no Legislativo. Era esperado que o projeto do Governo Federal, defendido pelo Ministério da Justiça e apelidado de Pacote Anticrime, sofresse alterações, pois, apesar da popularidade da pauta, havia neles pontos que foram objetos de polêmica e difíceis de serem endossados por um acordo amplo.

Mudanças do gênero são oportunas. Contudo, não podem ser tomadas por soluções miraculosas. O Brasil é uma democracia que dispõe de leis capazes de balizar a vida em comum numa sociedade justa. É necessário está vigilante para o bom funcionamento das instituições que exigem seu cumprimento. Sem atos, a letra está morta sobre o papel.