Editorial: Desafio da retomada

A especulação em torno da retomada do setor de eventos em Fortaleza dá uma dimensão da complexidade da área, no contexto local e do País. O Governo do Ceará segue avaliando números da pandemia e o período ideal para realizar a reabertura de atividades ainda suspensas. Há uma expectativa desses setores e de parcela da população de que esta retomada começaria em algum momento do próximo mês.

A questão é bastante sensível, caso o setor seja visto no que, de fato, engloba. Para além dos eventos ligados aos acertos e debates do poderio econômico, ao mercado financeiro, e às atividades que contam com um consumidor "disposto" a gastar, a exemplo do turismo, a área afeta setores de formação e desenvolvimento humano do povo cearense e brasileiro. Educação, cultura e arte - exemplificando uma tríade potente para o crescimento individual - têm a realidade de seus mercados bem entrelaçada com a programação de eventos.

Focando os mega eventos, por exemplo, a paralisação do setor afetou a realização do Fortal ao Cine Ceará - dois acontecimentos de longa data, e de públicos e propósitos bem distintos, no calendário da capital cearense. Ambos acontecem desde o início da década de 1990. E aí está a "ferida" de toda a questão que tem angustiado os profissionais do setor: cada evento pressupõe reuniões presenciais e, a depender do formato, aglomerações. Não há, praticamente, como se afirmar que a realização de um evento possa transcorrer absolutamente livre do risco de contágio do novo coronavírus. Autoridades responsáveis pela liberação e o mercado precisarão encontrar a medida certa, a fim de propor uma solução, a um só tempo, razoável e segura.

Os desafios já começam desde a realização dos pequenos eventos. A tomar exemplos de outras partes do mundo, espera-se que eventos de menor porte, com pouca concentração de gente, sejam organizados para que cada participante obedeça uma distância física específica. Contudo, a dinâmica dessas reuniões é a troca, a aproximação, a oportunidade - às vezes rara - do encontro. É uma situação comum, seja do velho ou do dito "novo normal", um certo descontrole da multidão. É só observar, por exemplo, as aglomerações vistas nas praias de Fortaleza, recentemente, mesmo com todas as advertências de precaução ao contágio da Covid-19.

Portanto, é necessário que os envolvidos na retomada tenham a consciência de praticamente "refundir" o transcorrer de um evento, já que os protocolos de segurança sinalizam para uma atitude disciplinada por parte do público. E se a liberação do setor parece um jogo de xadrez, noutra direção resta a confiança de que essa possa ajudar a sociedade a revalorizar o convívio presencial.

Desde o início da pandemia, a população ficou imersa na interação digital, com a multiplicação de lives e outros estímulos de convívio. Para além da vida corporal, essas experiências ganharam até status de sinalizadores de uma nova era social. A volta dos eventos, desde que feita sem atropelos e orientada pela preservação da vida, pode ser um dos faróis necessários e de retomada, também, da consciência pelas diversas possibilidades de validarmos a existência humana - seja pela via digital ou física.


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