O provérbio português “muito ajuda quem não atrapalha” pode ser aplicado no contexto de pandemia e no momento que vivemos de planejamento e sistematização pela vacina. É inconcebível que negacionistas de vacina (alguns dos quais antes negaram a Covid-19 e sua gravidade) usem meios institucionais para disseminar a milhares de pessoas, sem provas, que uma ou outra das principais vacinas, em avançado estudo, sejam maléficas àqueles que a receberem.
A atitude de uma liderança social ou religiosa de apontar sem provas que a Coronavac causa câncer e possui o vírus HIV desinforma a população e, mais do que isso, aumenta o risco de mortes. Na medida que a vacina poderá vir para salvar vidas, aportar-se deliberadamente de dados inverídicos e inconsistentes — objetivamente a simples e pura “fake news” — é atentar contra a vida das pessoas.
A democracia pressupõe a liberdade de expressão e de opinião, e deve ser sempre preservada, mas quando ela é usada para criar desinformação, de modo a impactar no acesso das pessoas à vacina que poderá salvar vidas, deixa de ser um direito de expressão e se torna, conforme denuncia o Ministério Público do Estado do Ceará, lesão ao artigo 41 da Lei das Contravenções Penais, além de ferir a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, mais conhecida como a “Lei das Fake News”. O ato também fere a lei estadual que responsabiliza essa disseminação das notícias falsas sobre a pandemia da Covid-19.
O religioso envolvido em declaração recente diz que sua palavra foi tirada de contexto, mas não disse em que outro contexto ela se inseria. A responsabilidade na palavra de um líder pode ser medida na relevância que ele tem para seus liderados, daí a preocupação do Ministério Público do Estado do Ceará no alcance de uma desinformação.
É importante ressaltar que a negação, acompanhada da desinformação, sobre o impacto do novo coronavírus nas vidas da população foi pré-condicionante para a criação de um ambiente de relaxamento e descrédito às recomendações das principais autoridades em saúde. Basta ver que nos países onde as autoridades políticas tomaram medidas mais enérgicas estão se saindo bem melhor no que esperamos seja a reta final antes da vacina.
O importante, agora, é olhar para a frente. O Brasil já criou o seu Plano Nacional de Imunização e o Ministério da Saúde tem se reunido com os governadores, ansiosos para que funcione toda a logística, tão logo a primeira vacina seja aprovada para uso no País. Mais de 182 mil brasileiros já morreram da Covid-19 neste ano, o que nos coloca na escala global dos países mais impactados. Não cabe, porém, que a Nação também entre na lista daquelas com mais pessoas que boicotaram uma vacinação que poderá salvar vidas, não importando a sua origem.
Os nossos órgãos reguladores, encabeçados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), são competentes e suficientemente sérios em suas aprovações, portanto, precisam ser respeitadas. Ninguém é obrigado a concordar com a ciência, e a Constituição garante o direito à discordância e à divergência. A Carta Magna, contudo, é coerente, ao estabelecer balisadores que norteiam o equilíbrio do bom senso.